Capítulo 34

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Quando disse isso pra minha mãe eu parecia me esvaziar como uma bexiga, eu senti um alívio, porque soube que seria menos um problema com o João, quando olhei pro rosto dele e vi aquele sorriso coladinho com aqueles olhos azuis, aquela covinha de um só lado, por um momento eu esqueci o que tava acontecendo e sorri olhando pra ele, sabia que tudo que eu queria tava de mãos dadas comigo.

- Oi, eu ainda estou aqui e não achei uma boa ideia você me dar essa notícia assim e agora, mas isso é o de menos, agora vamos! Resolver uma coisa. - Acordei com minha mãe tagalerando.

- An? Vamos aonde? Que coisa?

- Vamos na delegacia, denunciar o delinquente do Bruno. Nunca gostei daquele pivete mesmo.

- Mas mãe. Eu não posso fazer isso. - Não queria denunciar o Bruno, ele foi um babaca, mas eu ainda sentia pena dele.

- Por que não?

- É Cléozinha, por quê? - Até o João?

Minha mãe olhou pra cara do João e sorriu.

Que isso? É um complô?

- Vamos embora Cléo.

Olhei pro João. Respirei bem fundo.

- Tchau. - Sorriu afetuosamente.

- Tchau. - Sorri de lado.

No carro minha mãe não deu nem um piu, ficou mexendo no celular antes de dar a partida, e depois vi algumas lágrimas caírem, não tive coragem de perguntar pra ela, porque eu acho que no fundo eu já sabia. Sabia que ela estava decepcionada, que ela estava se perguntando aonde foi que ela errou e eu não tiro sua razão, por mais que pra mim os motivos de fazer a festa fizessem sentido, por mais que houvesse passado dos limites, também sabia que pra ela não fazia sentido algum, criar uma filha nas melhores escolas, com as melhores roupas e melhores condições no sentido material, queria que pra ela fizesse sentido de que faltou carinho, faltou presença ao invés de presentes, faltou mãe, faltou pai, faltou tudo. Esse meu jeito de extravasar em bebidas, em festas, fazendo besteiras atrás de besteiras é só uma forma de me preencher, sei que é errado, mas é a única forma de dizer "Ei, eu estou bem aqui". Tava com os pensamentos longe mesmo. Sempre estou.

- Chegamos. Vou ligar para o Doutor Macedo, já alertei ele, ele deve está chegando.

Olhei pra minha mãe e assenti. Era a mesma delegacia que fui detida. Chegamos lá e fomos falar com o delegado.

- Boa tarde, eu gostaria de fazer um boletim de ocorrência contra Bruno Lacerda. - Nem sabia que minha mãe guardara o nome do Bruno.

- Qual é a queixa senhora?

- Não é óbvio, a minha filha foi agredida, olha aqui, está toda roxa. Quero acionar a lei Maria da Penha.

- A senhora já procurou a delegacia da mulher? - Perguntou o delegado com um descaso.

- Não, o senhor vai resolver o meu problema? Espero que sim, porque enquanto isso o bandidinho que bateu na minha filha está solto e o senhor está me indagando, quando na verdade poderia está resolvendo o meu problema.

- A senhora está se exaltando.

- Não senhor, eu não estou me exaltando.

- Calma, calma Patricia, o que houve? - O Macedo chegou já acalmando minha mãe, eu apenas fiquei ao lado dela com a cabeça baixa, era como se eu não estivesse lá, não estava dando a mínima se iam prender o Bruno ou não, mas as imagens dele me agarrando a força e depois da coronhada no meu rosto, não conseguia esquecer nem um segundo sequer, relutei pra não chorar, não queria demonstrar fraqueza e não mostrei. Só queria que esse inferno acabasse, voltar pra casa, receber meu castigo e dormir.

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