Capítulo XVIII - Perdas

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Em uma semana minha vida virou de cabeça pra baixo. Eu mesma me joguei no abismo. Perdi minha virgindade, minha dignidade, meus amigos, meus esqueminhas. E agora minha relação com a minha mãe estava em uma corda bamba, prestes a cair. Mas eu precisava me livrar daquela culpa, daquele peso. Por alguns minutos após essa revelação, ela ficou sem resposta alguma. E me perguntou:
-E ai? A partir de agora vai fazer o que?

Fazer o que? Tudo que eu queria ouvir agora era um por que eu fiz isso, se eu gostava dele, se eu estava abalada, ou pelo menos como eu estava me sentindo. Eu estava muito arrependida e só queria a minha vida de volta mas, minha mãe não queria me ouvir. Ela simplesmente queria ficar sozinha. Ela precisava de apoio para lidar com essa notícia, mas ela tinha uma melhor amiga e um marido para dar esse apoio.

Não julgo minha mãe, não foi fácil pra ela. Mas pra mim, não estava sendo fácil ao quadrado, pois eu não tinha nenhum apoio, nenhum porto seguro, nada. Após alguns dias, ela decidiu que ia na escola conversar com o menino e os pais dele, no caso, aqui estamos falando do primeiro menino em que eu (quase) perdi a minha virgindade. Ela queria saber como a filha dela caiu naquela armadilha, queria me proteger. Mas eu temia que ela descobrisse as coisas piores que estavam acontecendo.

E ela descobriu. Ao chegar na escola para saber de tudo, a diretora disse que já queria conversar com ela mesmo. Minhas notas estavam indo de mal a pior, eu só tinha notas vermelhas ou no máximo na média, e tudo para ficar transando com qualquer um. Ela disse que a culpa de tudo que estava acontecendo era única e exclusivamente minha e que o menino não tinha nada a ver, afinal fui eu quem fui atrás dele. E o pior é que ela estava certa.

Após isso a diretora me chamou junto com ele para entender melhor a situação, ele falou e ela não me deixou abrir a boca para falar sequer uma palavra. Disse que minha mãe estava indo na escola cheia de autoridade tratar de problemas que eram de minha autoria e que o menino não merecia estar passando por aquilo. E ele não merecia mesmo, eu concordo com ela. Todos aqueles pensamentos rodeavam a minha mente, e eu estava cada vez mais no fundo desse buraco, como se eu estivesse cavando minha própria cova, cada vez mais funda e não tinha pra onde correr.

Tinha um menino muito especial, que foi o único que apesar de tudo isso, continuou ficando comigo. O nome dele era Andrew. Agora pelo menos eu tinha uma esperança, ele me ouvia, perguntava como eu estava me sentindo. Queria também fazer sexo comigo mas, eu sentia que ele se importava de verdade comigo. Ele valia a pena de verdade.

Ao chegar em casa, meu irmão contou para minha mãe que uma semana antes eu tinha levado um amigo pra fazer um trabalho de escola e rapidamente minha mãe já percebeu que tinha um segundo na jogada, então tinha algo errado ali. Ela me perguntou e eu neguei, ela já sabia de um, pra que se preocupar com o segundo? ela não precisava saber da vergonha que eu passei por ser amante. Já era humilhação demais pra mim e eu sabia o que ela pensava sobre amantes já que meu primeiro pai tinha muitas amantes enquanto era casado com ela.

A névoa começou a ficar cada vez mais escura de novo. A diretora da escola expôs todas as fotos que ela tinha minha para a minha mãe, agora a escola toda comentava sobre isso. Minha mãe viu aquela cena e eu sinto muito por ela.

-Me dá seu celular.
-Não.
-Me dá agora e desbloqueia.
-Vou te dar mas sem desbloquear.
-Eu vou jogar seu celular no vaso. Vou contar até 3.
-Tá bom, vou desbloquear.
-Eu quero a senha. Anota aqui num papel.

Agora ela ia descobrir sobre o Andrew. Nunca aconteceu nada a mais que beijos entre eu e o Andrew mas, eu não queria correr o risco de não ter ele, a única pessoa que eu tinha no mundo. E eu nem tinha como avisar ele, já que eu tinha sido expulsa da escola após toda essa confusão. Ele ia acabar achando outra pessoa e eu não ia aguentar. Eu precisava aliviar a minha dor de alguma forma, decidi então conversar com uma amiga minha que curtia fumar um beck e experimentar para ver se aquilo me acalmaria mesmo. Quem diria, expulsa após transar e ter suas fotos íntimas expostas... Tudo que eu queria agora era morrer para parar de sofrer e fazer todo mundo sofrer.

A partir disso, a Paloma, amiga da mamãe ajudou ela a descobrir os detalhes de cada uma dessas coisas. Com o meu celular e a senha em mãos, elas podiam falar com meus amigos e sondar exatamente tudo o que tinha acontecido.

Eu não tinha nem mesmo celular para estar no meu mundo alternativo. Eu não tinha nada, literalmente. Decidi então pedir perdão na igreja e confessar tudo. E como eu tinha apenas 14 anos, era necessário que os pais estivessem presentes. Contei exatamente tudo, e com detalhes. Eu achava que isso ia me fazer sentir melhor, pelo menos eu teria Deus ao meu lado. Mas isso foi o meu fim, eu não me sentia melhor mas, a cada detalhe eu revivia toda aquela dor novamente. Parecia que tinha levado uma facada no meu peito e arrancado o meu coração fora, parecia que faltava algo no meu peito e doía muito. Era um vazio insuportável, uma dor que não desejo a ninguém. Além de ter que lidar com a minha dor naquele momento, a dor de reviver e a dor de perder tudo, eu ainda tinha que lidar com a dor que eu estava causando em meus pais.

Eu sempre tive uma família estruturada, por que eu fazia aquilo? Eu não conseguia me entender. Só sentia culpa, dor e vazio. Após sair daquela sala, depois de vomitar tudo pra fora, tudo que tinha acontecido e todos os detalhes, eu senti que já tinha cumprido meu propósito de vida. Eu precisava morrer ali, assim pararia de sofrer e de fazer os outros sofrerem.

Após a morte do meu pai eu adquiri um hábito de cortar meus próprios pulsos, no intuito de acabar com a minha vida, e não apenas causar dor em meu próprio corpo. Mas eu nunca tinha ido tão fundo. Dessa vez eu estava decidida do que eu queria, e eu ia até o fim para acabar com a minha vida. Tirei a lâmina do apontador e comecei a cortar meus pulsos cada vez mais forte, cada vez mais fundo, e esperava que o sangue jorrasse e acabasse com tudo aquilo fe novo. Eu chorava sem parar, só Deus sabe quantas noites seguidas eu chorei fazendo isso, toda noite, cada vez mais fundo, cada vez maiores. Só que eu percebia que não tinha força o suficiente para atingir a minha veia, o que me frustrava cada vez mais. Eu não servia nem mesmo para me matar, era uma inútil. Um câncer na sociedade e na minha família.

Então decidi pegar todos os remédios que eu tinha na caixa de remédios e tomar. Todos de uma vez. Acredito que dessa vez eu vou conseguir.

Distorção BorderlineOnde histórias criam vida. Descubra agora