Epílogo

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Iris acordou no dia seguinte, com a maioria de seus machucados já curados. Ela estava com algumas cicatrizes, mas nada muito grave.
Cedo; ela soube cedo da manhã que Bruno havia morrido. Ele era tão jovem e Iris chorou muito, muito mesmo.
O funeral?! Iris não tinha reparado. Ela ficou apenas olhando para o caixão aberto de Bruno. Seu rosto parecia estar em paz, mas ela sabia que não fora esse o último sentimento de Bruno. “Meu tio tirou todo o ar de dentro dele. Como que ele poderia ter morrido com essa cara? É culpa minha. Definitivamente é culpa minha. Se ao menos eu pudesse...”. E depois desse pensamento Iris foi embora dali, com a desculpa de que estava com dor de cabeça e voltaria para casa. Ninguém precisava se preocupar.
Iris quis voltar para casa a pé. Ela tinha muito que pensar.
Seus pensamentos foram tantos que eu não poderia cita-los todos aqui, mas eu me lembro de Iris desviar o seu caminho para a Ponte; a ponte em que sua vida tinha escolhido como ponto de ignição. Lá seus pensamentos se reuniram a um; a sua grande parcela de culpa que ela tinha na morte de seu melhor amigo. Então ela se sentou na beira da ponte e viu ali na água todas as cenas de novo e de novo. Cada vez tendo mais certeza de sua culpa.
A água era o seu elemento. Ela nasceu com o dom de doma-lo, mas até onde? Por que parecia que a água que a estava domando naquele momento; cada vez mais vidrada no fundo daquele córrego. Ela estava quase experimentando o sabor que era mergulhar para sempre naquelas lembranças dolorosas quando alguém a chama.
- Iris! Tia! O que faz aqui? – era Miguel. “Oh, o pequeno Miguel... Tadinho, perdeu o pai por culpa minha!”.
-Ah, Miguel... Eu só estava pensando.
-Pensando tão perto da água, tia?! Você domina o elemento água, mas você morreria se caís... – Miguel parou de falar e percebeu o que estava acontecendo. – Tia você não estava pensando em...? Você sabe.
- Minha vida começou aqui, eu diria. Se não fosse essa ponte, eu nunca teria descoberto quem eu realmente sou.
“Se minha vida começou aqui, por que não acabar também?!”
- Tia, olha para mim. – Miguel teve que virar o rosto da tia, pois ela se recusava a olha-lo nos olhos. – O que aconteceu... Não foi sua culpa. Meu pai sabia o que aconteceria. Ele até chamou os policiais e as ambulâncias, antes de sair!
“Ele sabia o que aconteceria, de algum modo. Agora, se ele estivesse aqui, não gostaria de nos ver tristes, entende?! Vamos voltar para casa.”
- Miguel, tudo o que você falou eu já ouvi quando eu tinha 15 anos. – Iris parou, secando lágrimas que insistiam em escorrer pelo seu rosto.
“Meus pais morreram, e eu não pude fazer nada. Quando Jorge me disse que eles estavam em uma missão, eu pensei que ali estava a minha chance de descobrir algo. E eu descobri que meus pais eram tão humanos que fizeram coisas horríveis, e que o meu tio, o único que me acolheu depois de tudo, ele que matou os meus pais. Então eu continuei com a matança. Deve ser de família. Porque tudo isso, Miguel, tudo, é culpa minha.”
-Não, tia. Você não vê? Tudo isso não é culpa de ninguém. Cada um escolheu vir ou não vir aqui te ajudar. E Jorge escolheu fazer o que fez.
“Não é questão de família, é questão de escolhas.”
A última frase de Daniel foi como um banho de água fria para Iris. Depois daquelas palavras, parecia que Iris finalmente havia acordado; finalmente havia percebido.
Acabara o funeral e Daniel e Lucas voltaram para casa. Imaginem a surpresa dos dois ao verem que nem Iris nem Miguel estavam lá?! Eles entraram em pânico, mas aí Lucas arriscou chutar um lugar...
E Lucas acertou. Ele chegou à ponte e viu Iris e Miguel abraçados. Dava para notar que lágrimas haviam escorrido pela face de Iris, mas já estava tudo bem.
Lucas, ao ver que estava certo sobre o paradeiro de Iris, ficou com medo de seu pesadelo se revelar verdadeiro e ver o corpo de Iris inerte na água abaixo, mas Miguel... De alguma forma... “Como ele soube? Bem, não importa. Estamos todos aqui.”
- Iris! Miguel! – Lucas correu na direção deles, com Daniel vindo logo atrás.
Todos se abraçaram como nunca antes. Havia algo diferente ali. Talvez faltasse algo? Não, não. Bruno estava lá, atrás deles. Ele sempre estivera e sempre estará.
Talvez seja isso! Para darmos valor à felicidade, precisamos passar pela tristeza. Agora todos tinham noção de quão bela (e curta) é a vida.

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Jorge esperou, esperou e esperou. Nenhum de seus “irmãos” veio lhe matar. “Que estranho...”, pensara ele. Porém, com o tempo, Jorge percebeu o que seus irmãos haviam planejado.
Na magia obscura, tem que sempre estar praticando-a. Caso você deixe de praticar, ela vai tirar de você tudo o que você pegou dela; toda a vida, toda a magia. E, para uma pessoa como Jorge, tirar toda a magia obscura que ele usou era como tirar a sua vida por inteiro. E foi isso o que aconteceu.
Dia após dia, Jorge foi ficando casa vez mais fraco. Não comia mais nada, não bebia nada. Fraco demais para falar, para andar...
Sua morte só foi percebida semanas depois. Quando ele imaginaria que se tornaria tão insignificante ao ponto de ninguém perceber a sua morte? No seu funeral, nem mesmo Iris foi, pois ninguém viu notícia de sua morte. Era apenas mais um prisioneiro morto de causas desconhecidas.
Esse foi o final que Jorge moldou para a sua vida. Qual será o final que você moldou para a sua?

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Os três lados [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora