Cinco dias depois...

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Iris não sabe onde esteve esses cinco dias em que esteve desacordada. Ela só se lembra de ver toda a sua vida passada diante dela; toda para ela, até aquele momento. Iris viu cada ato que ela cometeu desde o útero, até o combate com o tio. Ela sabia o que tinha que fazer para vencer Jorge, mas não tinha certeza se Lucas iria concordar.
Depois de recobrado a consciência, Iris mexeu os dedos involuntariamente fazendo com que Lucas a chamasse e gritasse para as enfermeiras correrem para lá. As vozes chegavam abafadas, como se ela estivesse em baixo d'água, aos poucos tudo ia voltando ao "normal".
Lucas segurava a sua mão olhando-a maravilhado. Ele havia sofrido tanto por ela... Ainda dava para ver o caminho que lagrimas fizeram pouco tempo antes de Iris dar algum sinal de vida. "O mundo não o merece."
Depois de fazer todos os exames necessários para ver se Iris estava bem, o médico apenas disse que ela teria de ficar mais um dia em observação e depois poderia ter alta, se tudo ocorresse bem.
Aquele dia foi como uma festa. Lucas, Bruno e Daniel festejaram no quarto com sucos e água, e a comida sem graça do hospital (que naquele dia parecia ser o paraíso). Iris sorria por fora, mas por dentro ela se sentia suja; obscura. O que ela tem que fazer para derrotar o tio é considerado desumano por várias pessoas, mas as pessoas não param para pensar em tudo o que ela passou para chagar até esse ponto.
Todos dizem que todos temos duas opções, e eles não mentem neste ponto. Mas a "segunda opção" de Iris machucaria mais pessoas do que a "primeira opção". Na verdade, a primeira opção, quem seria mais afetado, seria ela própria. Claro que outros, os mais próximos, também seriam afetados, mas com o tempo a dor "sumiria" e suas vidas seguiriam.
Todos dizem também que quando a escuridão entra, ela se instala e não saí mais. Bem, "não saí mais" é meio forte... Ela até pode sair, mas com muita força de vontade e ajuda das pessoas mais próximas.

O dia passou e a noite chegou.
Foi aterrorizante.
Seus pensamentos obscuros a aterrorizaram o dia inteiro, mas Iris pensava que tinha "atuado" bem, porém Lucas provou o contrário:
-Eu sei que eu já falei muito isso para você, mas eu sempre tenho motivos; Você está bem?
"Como ele consegue sempre ver a minha alma?", pensou Iris.
-É que... Eu me sinto diferente. -disse Iris. Ela não estava mentindo.
-Eu sinto você diferente... Mas sinto a essência da Iris "original" dentro de você.
"As pessoas mudam frequentemente, Iris. Mas é necessária muita mudança para fazer sentimentos profundos mudarem." E dizendo isso, Lucas apontou para o leito em que Iris estava deitada como se perguntasse "eu posso me deitar também?". Iris apenas assentiu com a cabeça positivamente, dando espaço para Lucas.
Naquela noite, ela não conseguiu dormir direito. Como ela poderia fazer o que precisava fazer para derrotar Jorge, sendo que isso destruiria Lucas também? A noite inteira ela ouviu a respiração de Lucas, suave e em paz; fazia vários dias em que ele não dormia tão bem quanto aquela.
Quando Iris finalmente conseguiu adormecer, ela já conseguia ver alguns fiapos da luz do sol começando a nascer. Iris sabia que não valia a pena dormir, pois daqui a pouco ela acordaria para ter a alta e sair do hospital, mas parece que cinco dias dormindo não foram o suficiente para colocar o sono dela em dia.
Dito e feito! Iris dormiu apenas por umas três horas. Era de se esperar que Lucas acordaria cedo, e Daniel e Bruno chegassem cedo também.
Antes de receber a alta, Iris perguntou por curiosidade o que havia acontecido com ela. Os médicos explicaram que era comum aquele tipo de coisa acontecer com "inexperientes" e que, com um pouco de treinamento, a bolha ia se recolhendo sem causar estragos para a pessoa física.
Enfim, livre daquele hospital, Iris não sabia para onde ir. Era para ela ir "para casa" mas a casa dela não ficava naquele mundo. Como se estivesse lendo os seus pensamentos, Lucas disse:
-Vamos para a minha casa. Meus pais não estão mais lá, portanto é mais seguro.
Iris nunca tinha estado na casa de Lucas. Parando para pensar, ela nunca esteve na casa de nenhum de seus amigos.

A casa era padrão. Por fora, tinha uma aspecto "feio arrumadinho", mas por dentro era maravilhosa. A casa tinha uns três quartos, um banheiro uma sala e cozinha enormes. Quando eles entraram, se toparam direto com a sala. Logo atrás estava a cozinha com um balcão que servia de mesa. Depois vinha uma parede que dava para um dos três quartos. Ao lado da porta do primeiro quarto, havia mais duas portas para outros dois quartos e depois a porta para o banheiro.
Bruno e Daniel pareciam ter mais intimidade com o ambiente e já foram entrando e colocando as suas coisas em cada quarto, fazendo com que sobrasse apenas um quarto e o sofá da sala.
Iris foi colocar as suas coisas no quarto restante.

O quarto não era tão grande, mas era bem arrumado. Tinha um roupeiro de solteiro, uma cama que poderia ser chamada como uma cama de casal e uma escrivaninha ao lado da cama. Ela arrumou as suas poucas roupas no roupeiro, mas quando acabou ela parou e ficou apenas olhando para o roupeiro. Não que ela estivesse olhando para um ponto exato dele, ela apenas o olhava fixamente, até que alguém entrou no quarto; era Lucas.
-Desculpe... Eu só vim pegar uns lençóis para colocar no sofá. -disse Lucas apontando para o roupeiro. Iris havia reparado que, quando aberto o roupeiro, na parte superior havia lençóis, fronhas, etc.
Iris se levantou e deu espaço para Lucas pegar os lençóis.
Ele estava quase saindo do quarto quando Iris pergunta:
-Podemos dormir juntos... -Iris se arrependeu de não ter explicado melhor a sua fala quando Lucas se virou e a encarou com os olhos arregalados. Portanto ela continuou, constrangida- Quero dizer... Dormir na mesma cama... Apenas isso, nada mais!
-Ah... Tem certeza?
-Tenho. Eu meio que vi a morte passar por mim mais de uma vez e eu não sei se eu quero ficar sozinha, à noite. Mas eu não estou pronta para isso ser mais do que... Isso.
-Nem eu estou... Tudo bem, então. Vou guardar os lençóis no lugar.
Lucas colocou os lençóis no lugar e depois de guarda-los seu olhar se encontrou com o olhar de Iris e eles ficaram se encarando. Para Lucas, era quase como olhar para uma estranha, mas ele ainda enxergava a tal "essência da Iris" lá. Lucas só queria dar espaço para ela se recuperar de tudo, mas será que essa é a escolha certa?
Iris o encarou de volta com um olhar de compaixão. Ela ainda não sabia o que iria fazer em relação ao tio, mas ela o amava demais e não queria vê-lo sofrer de maneira alguma. Mas será que ela o amava como imaginava, ou será que ela apenas o amava como amigo?
Não importava, pois o café da manhã já estava pronto, segundo Daniel.

Os três lados [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora