8°|Use sua raiva

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  Fechei os olhos quando uma súbita claridade iluminou todo o cômodo. Uma sombra se projetou na distensão do buraco onde fiquei durante exata uma semana, era Catrina.

  _ Comece a andar na linha, Elle. - dizendo isso ela foi embora, levando sua presença maquiavélica junto.

  Subi as escadas. Minha boca salivava pelo gostinho da liberdade. Meu coração estava eufórico. Ergui minha cabeça, encontrando as estantes recheadas de mantimentos e a porta que dava para o corredor também estava aberta. Caminhei em direção ao andar de cima, minhas pernas formigavam e estavam fracas. Eu estava miseravelmente fraca. Meus olhos alcançaram o espelho pendurado na parede. O meu reflexo me deixou espantada. Meus cabelos estavam completamente brancos - fenômeno esse que provavelmente Nanda e Peter me explicarão mais tarde, mesmo eu não querendo -, meus olhos estavam opacos, cobertos por uma névoa densa e embaixo deles estavam olheiras profundas, resultados de noites mal dormidas; alguns arranhões estavam espalhados pelo meu rosto e braços, causados durante uma luta contra as ratazanas. Eu estava o cúmulo da podridão. As feições de Blair e Claire deixaram claro quando ambas desceram as escadas com suas típicas caretas de quem comeu e não gostou.

  _ Nossa Elle, você precisa de um banho! - Claire comentou torcendo o nariz.

  _ E de colocar uma roupa... O que estava fazendo? - sim, as gêmeas não sabiam das coisas que aconteciam debaixo dos seus pés, literalmente - Pelo visto a sua viagem para a França foi bem louca! 

  França? Foi pra lá que viajei desta vez? 

  Deixei os projetos de Barbie para trás e subi as escadas o mais rápido que meu corpo debilitado permitiu. Peguei uma muda de roupa e fui até o banheiro, mas não consegui fechar a porta sem que meu corpo não estremessesse de fobia. Impensávelmente, meus dedos deslizaram até meu celular e teclaram o número da pessoa que rondou meus pensamentos durante o tempo em que fiquei presa. Eu simplesmente não conseguia entender o que estava acontecendo comigo.

  _ Elle? - sua voz soou rouca do outro lado, fazendo meu coração bater aceleradamente. Até ele quebrar o encanto. - Olha, eu tenho mais o que fazer! Ligue para Nanda.

  A chamada se encerrou, me deixando extremamente irritada com a babaquisse de Peter. Digitei o número de Peter novamente, dessa vez com fúria.

  _ O que te faz pensar que eu não estou em perigo, seu guardião meia-boca!? - gritei exasperada. Peter soltou um suspiro pesado e cansado antes de responder.

  _ Porque eu sinto, Elle! - retrucou.

  _ Então você está quebrado!

  _ Elle, me faz um favor e para de me ligar. A aula vai começar...

  _ Desde quando você se importa com as aulas? Você é um estúpido idiota metido a guardinha!

  E a chamada finalizou.

  Respirei fundo, a raiva ainda pulsava um pouco dentro de mim, mas foi o suficiente para me dar coragem de trancar a porta e tomar um banho libertador. Depois de vestida, desci as escadas em direção à cozinha. Peguei a comida dentro do armário e meu estômago roncou sedento apenas de ver a embalagem.

 Peguei a comida dentro do armário e meu estômago roncou sedento apenas de ver a embalagem

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  Acordei assustada com batidas na porta e com muito pesar me arrastei para fora do sofá. Abri a porta e me deparei com Nanda e Peter.

  _ Você volta de viagem e não nos avisa? - Nada disse nervosa - Na verdade você nem nos disse que iria!

  _ Foi coisa de última hora. - murmurei.

  _ O que foi fazer na França? - Peter perguntou desconfiado. Por favor, cale a boca! Não estou com vontade de participar de um interrogatório no momento.

  _ Catrina precisou ir para lá, então não podia me deixar sozinha. - inventei. Não consegui olhar para os olhos de nenhum deles enquanto contava a mentira, principalmente os de Peter. É como se ele fosse ler meus pensamentos apenas com o encontrar de nossos olhares.

  _ Ela te leva, mas deixa as gêmeas? Isso...

  _ O que vieram fazer aqui? - perguntei tentando soar como uma pessoa normal e equilibrada, e não como uma pessoa que passou uma semana trancada em um buraco feito só pra ela.

  _ Viemos terminar seu treinamento. - Peter respondeu levantando um pouco da blusa, revelando uma adaga por cima da pele um pouco esbranquiçada. - Hoje vamos lutar!

  _ Lutar? - perguntei receosa. 

  _ Sim, e você tem que aprender tudo antes do seu aniversário. - Nanda disse. Seus dedos foram levados até minha bochecha e deslizaram em cima de um arranhão. Senti a ardência e afastei a mão dela.

  _ Hoje eu não posso. - respondi e caminhei apressada para o meu quarto.

  _ Por quê não? - ela veio atrás de mim, seguida de Peter.

  _ Preciso estudar para o vestibular, Nanda. É simples! 

  Andei até minha estante e tirei vários livros de lá, espalhando-os na escrivaninha. Percebi Nanda e Peter cochichando no canto, com olhares cúmplices. 

  _ Elle, você não vai entrar na faculdade... Quer dizer, não aqui, não nesse mundo! - Nanda diz por fim. Um sentimento de raiva me dominou e eu segurei o lápis com tanta força que ele se partiu ao meio. Fechei os dedos ao redor da quina da mesa com tanta força, que as pontas deles ficaram esbramquiçadas. Eu estava novamente com medo do desconhecido e isso estava me causando um sentimento de raiva. Muita raiva.

  _ Elle, use sua raiva. - a voz de Peter sussurrou em meus ouvidos. O olhei surpresa, depois de tanto me falarem para eu não sentir, eles estão me pedindo pra fazer o contrário? 

  _ Isso é frustrante! - gritei. Minha voz soou mais potente do que pensei, fazendo Nanda pular assustada.

  _ Eu sei. - Peter abriu um sorriso, tirando da cintura a adaga.

  Segurei o punho da adaga e com um movimento rápido desferi um golpe horizontal na direção de Peter, que pulou para trás como se esperasse essa reação. A raiva aumentou em mim, a adrenalina começou a pulsar nas minhas veias. Desferi outro golpe, e outro, e outro, até que a mão de Peter agarrou a minha e apertou meu pulso, levando ele para trás de minhas costas, o torcendo e me fazendo soltar a adaga. Ele pegou a adaga no chão e com um movimento rápido me virou de frente para ele, pondo a adaga em minha garganta.

  _ E você morreu. - disse simples. Chutei seu órgão genital e roubei a arma de sua mão enquanto ele se contorcia no chão. Subi em cima dele e coloquei a adaga posicionada em seu peito.

  _ Não, você morreu! - retruquei. O peito descia e subia de acordo com minha respiração pesada. Um sorriso brotou em meus lábios, eu estava gostando.

  _ Parece que encontramos uma guerreira! - Nanda comentou satisfeita. Peter pegou a arma da minha mão e me tirou de cima dele. Ele também sorria satisfeito.

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O Coração Gelado de CinderelaOnde histórias criam vida. Descubra agora