O Coração Gelado de Cinderela

26°|Em Terras Inimigas

   _ Eu não sou assassina - murmurei pra mulher na minha frente. Minha voz oscilou e o medo percorreu minha espinha.

   Brand inclinou levemente a cabeça para o lado, pensativa. Senti cócegas no coração, uma sensação estranha como se alguém estivesse passando os dedos sobre a superfície do meu músculo cardíaco, mas então os dedos se tornaram garras e começaram a o apertar. Guinchei de dor e meus joelhos cederam, Krisa correu até mim e me segurou pelos ombros, impedindo que eu caísse. A dor dilacerante percorreu cada nervo do meu corpo, meus pensamentos se enevoaram e todo o oxigênio parecia ter sido sugado de mim e eu tentava desesperadamente pegá-lo de volta.

   _ Ah, querida - diz ela ardilosa - Vai mesmo me dizer que não passa cada segundo do seu dia pensando na morte deles?

   _ Está doendo... Do-or... - as palavras titubeavam pra fora da minha boca.

   _Que você não escuta o grito de Glime? Que não tem pesadelos com os meus guardas? Que não tem lembranças constantes do coração de Kyle virando gelo? - as garras se apertaram ainda mais em volta do meu coração e pontos pretos pintou em minha visão, minhas forças se esvaindo. Quando eu estava por um triz de perder a consciência, as garras sumiram e eu pude recuperar o ar com um soluço de alívio, desabando de joelhos no chão - Criança fraca.

   Krisa se abaixou ao meu lado e envolveu os braços ao redor da minha cabeça. Lágrimas molhavam o meu rosto e criavam caminhos congelados pelas minhas bochechas. Eu não sabia dizer se chorava pelo vazio que rodava meu coração, pedindo espaço, ou se era porque Brand estava terrivelmente certa.

   _ Vá embora, Brand! - vociferou Krisa - Você está nas terras da Rainha Gelada, sabe as regras.

   _ Essas regras não se aplicam à mim, vaca intrometida! - Krisa trincou os dentes diante ao insulto. Os olhos de Brand caíram sobre mim de novo e a cobiça os fez brilhar - Pelo menos não quando eu e sua querida rainha temos assuntos pendentes.

   _ Vá. Embora. - Krisa repetiu lentamente, Brand riu com escárnio e isso fez a loira ao meu lado tremer de ódio. Krisa ficou em pé e por um momento pensei que atacaria Brand - Os guardas estão vindo, acha mesmo que tem chance contra eles? Que a Rainha Miranda vai deixar você sair impune?

   _ Bom, vamos descobrir - respondeu simplesmente. Com um gesto da mão, fumaça negra me rodeou e eu parei de sentir o chão, o fumo queimou minhas narinas e meus olhos lacrimejaram envoltos por uma escuridão avermelhada.

   Senti meu corpo chacoalhar e então fui arremessada para baixo, batendo com o queixo no chão duro. Um resmungo escapuliu de meus lábios enquanto erguia minha cabeça o suficiente para olhar em volta. Toda a neve havia ido embora e o calor invadiu meus sentidos, o chão de Cold Wheather havia sido transformado em um piso vermelho escarlate e as casas em móveis sofisticados. Nenhuma janela. Os saltos de Brand entraram em meu campo de visão e ela ergueu meu queixo para a encarar.

   _ Bem-vinda à sua nova casa.

   Duas garotas surgiram ao lado dela, saindo da mesma nuvem de fumaça que me trouxe aqui. Ambas usavam usavam um vestido laranja opaco, os rostos estavam cobertos por uma máscara de cobre que lhe escondiam metade do rosto pra cima. Não pareciam serem muito mais velhas que eu. Brand soltou meu queixo e começou a andar em direção à porta de mogno, sua cabeça virando levemente para o lado para dizer às garotas:

   _ Preparem-na para o jantar.

   Assim que Brand saiu, as duas meninas me ergueram pelo braço e começaram a me guiar para a porta atrás de mim. Elas não falaram nada durante todo o caminho, mesmo com as minhas centenas de perguntas. Passamos por um longo corredor que possuía imensas janelas que proporcionavam a vista perfeita da cidade que se estendia para além do pé do montanha, todas pareciam terem sido feitas de cinzas e as ruas de rocha vulcânica, a lava corria por baixo e era exposta pelas frissuras. Curiosamente, não havia céu, apenas um teto rochoso, como se estivéssemos dentro de uma enorme caverna.