Uma vitória dupla

57 6 2
                                    

Norman Douglas foi à igreja no primeiro domingo de novembro e causou toda a sensação que desejava. O senhor Meredith apertou a mão dele distraidamente na entrada da igreja e desejou que a senhora Douglas estivesse bem.

- Ela não estava muito bem dez anos atrás, quando eu a enterrei, mas imagino que esteja melhor agora - disse Norman com seu vozeirão, para o espanto e a diversão de todos os presentes com a exceção do próprio ministro, que já estava absorto em pensamentos, imaginando se havia enunciado o último parágrafo do sermão com a clareza necessária, alheio ao que Norman havia dito e ao que ele dissera para o Norman.

Norman interceptou Faith no portão.

- Eu cumpri a minha promessa, veja só, Rosa Vermelha, cumpri a minha promessa. Estou livre até o primeiro domingo de dezembro. Que belo sermão, garota... Foi um ótimo sermão, o seu pai é mais inteligente do que aparenta. Só que ele se contradisse uma vez... Avise-o que ele se contradisse. Aproveite para dizer que quero ouvir o sermão sobre o inferno em dezembro. É um ótimo jeito de fechar o ano velho, com um gostinho do inferno. E que tal um gostinho do céu para o sermão de Ano Novo? Embora não seja tão interessante quanto o inferno, garota... Não chega nem perto. Ainda assim, gostaria de saber a opinião do seu pai sobre o céu, ele é uma pessoa capaz de raciocinar, o que é a coisa mais rara do mundo. Só que ele se contradisse, sim. Rá, rá! Eis uma pergunta que você pode fazer quando ele despertar novamente: será que Deus é capaz de fazer uma pedra tão pesada que nem mesmo Ele é capaz de erguer? Não se esqueça dela. Quero saber a opinião dele. Já deixei vários ministros confusos com essa dúvida, garota.

Faith ficou feliz ao escapar dele e correr para casa. Dan Reese, parado no portão em meio aos outros garotos, olhou para ela e preparou-se para gritar "porquinha", mas não se atreveu a fazê-lo ali. No dia seguinte, na escola, haveria uma ocasião melhor. Durante o recesso do meio-dia, Faith deparou-se com Dan no bosque de abetos atrás da escola e o menino gritou:

- Porquinha! Porquinha! A garota do galo de estimação!

Walter Blythe de repente levantou-se da grama fofa atrás de um amontoado de pinheiros, onde estava lendo. Estava muito pálido e seus olhos faiscavam.

- Cuidado com o que diz, Dan Reese! - disse.

- Ah, olá, senhorita Walter - retrucou Dan, nem um pouco abalado. Ele subiu na cerca e cantarolou:

"Covarde, covarde, você não é de nada!
Covarde, covarde, você não é de nada!"

- Você é uma coincidência! - exclamou Walter com desprezo, ficando ainda mais lívido. Ele tinha apenas uma vaga noção do que era uma coincidência, mas Dan não fazia a mínima ideia e achou que fosse algo peculiarmente ofensivo.

- Rá! Covarde! - gritou mais uma vez. - Sua mãe escreve mentiras! Mentiras! Mentiras! E a Faith Meredith é uma porquinha! Porquinha! Porquinha! É a garota do galo de estimação! A garota do galo! A garota do galo! Rá! Covarde, covarde, co...

Dan não conseguiu terminar. Walter lançou-se na direção dele, percorreu a distância que os separava e derrubou-o da cerca de costas com um soco certeiro. O tombo repentino e inglório de Dan foi recebido com gargalhadas e uma salva de palmas de Faith. O menino levantou-se, roxo de raiva e começou a subir a cerca. Foi então que o sino da escola tocou e Dan sabia o que acontecia com os garotos que se atrasavam para a aula do senhor Hazard.

- Resolveremos isso depois - gritou. - Covarde!

- A hora que quiser - disse Walter.

- Ah, não, não, Walter - protestou Faith. - Não lute com ele, não me importo com o que ele diz. Jamais me rebaixaria ao mesmo nível das pessoas como ele.

Vale do Arco-Íris Onde histórias criam vida. Descubra agora