John Meredith caminhava pensativo pelo Vale do Arco-Íris sob o frio invernal da noite clara. As colinas longínquas cintilavam com o esplendor gelado da neve enluarada. Cada pinheiro jovem ao longo do vale cantava sua própria canção ao ritmo da harpa do vento e da geada. Os filhos dele e os dos Blythe deslizavam pela ladeira ao Leste e sobre o lago congelado. Eles se divertiam imensamente e suas vozes alegres e seus gritos ainda mais alegres ecoavam por todo o vale, definhando em cedências mágicas entre as árvores. À direita, Ingleside resplandecia por entre o bosque de bordos com o fascínio que sempre parecem ter as luzes de uma casa onde sabemos que há amor, felicidade e acolhimento a todos os irmãos, sejam eles de sangue ou de espírito. De vez em quando, o senhor Meredith gostava muito de passar a tarde conversando com o doutor junto à lareira, de onde os famosos cães de porcelana de Ingleside vigiavam incessantemente como deidades. Contudo, ele não olhava para aquela direção. O senhor Meredith estava indo visitar Rosemary West e pretendia lhe dizer algo que brotara em seu coração no dia em que se conheceram e que havia desabrochado por completo na noite em que Faith demonstrou tão afetuosamente sua admiração por ela.
Ele percebera que nutria sentimentos por Rosemary, não como os que tinha por Cecilia, é claro, estes eram inteiramente diferentes. Ele não acreditava que voltaria a sentir aquele amor romântico, onírico e especial, mas Rosemary era linda, doce e adorável, muito adorável. Era a melhor das companhias e ele não esperava que fosse ser tão feliz ao lado de mais ninguém como era junto dela. Rosemary seria a mulher ideal para o seu lar e uma boa mãe para seus filhos.
Durante os anos de viuvez, o senhor Meredith recebeu inúmeras indiretas de seus colegas de presbítero e de muitos paroquianos insuspeitos de terem segundas intenções, bem como de alguns suspeitos, de que deveria se casar de novo. E em seus ocasionais momentos de bom senso, ele reconhecia que isso seria o mais sensato. Só que o bom senso não era o forte de John Meredith, e ter que escolher deliberadamente e à sangue frio uma mulher "adequada", como alguém que escolhe uma empregada ou um sócio, era algo de que ele era incapaz. Como ele odiava a palavra "adequada"! Ela o fazia lembrar-se de James Perry. "Uma mulher adequada, de idade adequada", dissera o untuoso colega de púlpito em uma de suas indiretas mais do que diretas. O que causou em John Meredith um desejo perfeitamente inacreditável de sair correndo e pedir em casamento a mulher mais jovem e inadequada que fosse possível encontrar.
A senhora Marshall Elliott era uma boa amiga, de quem ele gostava muito, mas quando ela disse sem rodeios que ele deveria se casar novamente, foi como se ela tivesse arrancado o véu cobrindo o altar sagrado de sua vida mais íntima, desde então, o senhor Meredith tinha certo receio dela. Ele sabia que havia mulheres em sua congregação "de idade apropriada" que se casariam com ele em um piscar de olhos. Tal fato transpassara suas abstrações logo após sua chegada à casa ministerial em Glen St. Mary. Eram mulheres bondosas, de confiança, pouco interessantes; uma ou outra era bela de verdade, mas a maioria não chegava a tanto e John Meredith pensava em casar-se com alguma delas com a mesma frequência que pensava em tirar a própria vida. Ele possuía possuia certos ideais que vinham antes de qualquer necessidade aparente. Não pediria a nenhuma mulher que substituísse Cecilia a menos pudesse lhe oferecer, no mínimo, um pouco da afeição e da devoção que tinha pela esposa. E onde, em seu limitado círculo de amizades femininas, ele encontraria tal mulher?
Rosemary West entrara na vida dele naquela tarde de outono, trazendo com ela uma atmosfera na qual o espírito dele se sentia em casa. Os dois desconhecidos formaram um laço de amizade por cima do abismo que os separava. Ele a conheceu melhor naqueles dez minutos às margens do riacho do que Emmeline Drew, Elizabeth Kirk ou Amy Annetta Douglas em um ano, ou talvez até em um século. Ele buscara consolo nela quando a senhora Alec Davis afrontara sua mente e seu espírito, e o encontrara. Depois daquele dia, ele fora com frequência à casa na colina, percorrendo as trilhas escuras do Vale do Arco-Íris pela noite de maneira tão sorrateira que os fofoqueiros de Glen nunca tinham certeza absoluta de que ele ia de fato visitar Rosemary West. Uma ou duas vezes ele fora surpreendido na sala dos West por outro visitante, isso era tudo que sabiam as damas da Sociedade Assistencial. Ao inteirar-se disso, Elizabeth Kirk sufocou uma esperança secreta de que havia se permitido acalentar, sem a mínima alteração em seu semblante simplório, e Emmeline Drew decidiu que da próxima vez que se encontrasse com um certo solteirão de Lowbridge, ela não iria esnobá-lo como já havia feito. E é claro, se a Rosemary West quisesse, ela conquistaria o ministro sem nenhuma dificuldade, pois era mais jovem e os homens a consideravam bonita. Além disso, as irmãs West tinham dinheiro!
VOCÊ ESTÁ LENDO
Vale do Arco-Íris
RandomOs seis filhos de Anne e Gilbert já estão crescidos e perseguindo aventuras. Em uma delas descobrem o Vale do Arco-Íris e começam a visitar o local para brincar. Então, novas crianças chegam a Glen St. Mary: os travessos Meredith. Contrariando as ex...