Assim, existimos...

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23 de agosto de 2009


̶Q̶u̶e̶r̶i̶d̶o̶ ̶d̶i̶á̶r̶i̶o̶,̶ 

Diário,

É alguma espécie de regra que nos dirijamos a você como "querido"? Espero que não, nem que se importe se eu não o fizer, porque simplesmente não posso. Não consigo. Ao menos, por enquanto. Não me leve a mal, não é nada pessoal, acho até que você é uma boa "pessoa" por se dispor a me ouvir (ou ler... ou sentir... ou... Ah, você entendeu!). É só que tenho um pequeno problema chamado "Tendência à Franqueza Absoluta" (se você pesquisar no Google e não encontrar, nem nada semelhante, provavelmente isso se deve ao fato de ser extremamente raro neste mundo tão falso no qual vivemos).

O fato é que aprendi desde muito cedo, e da pior maneira possível, que uma única mentira, por menor e aparentemente mais inofensiva que seja, mesmo que bem-intencionada, pode levar a uma cadeia de eventos trágicos e irrevogáveis, capazes de destruir uma vida inteira. E adquirir um conhecimento desses, como deve imaginar, deixa suas marcas, portanto agora (dádiva ou sina, chame como preferir) tenho dificuldades para mentir, mesmo que isso acabe me comprometendo.

Porém, o que importa agora não são meus problemas com a verdade, e sim o que está por vir amanhã, que é basicamente a razão da sua existência. Em outras palavras, bem-vindo ao meu pior pesadelo (com o qual certamente precisarei de ajuda), chamado primeiro dia de aula. Em uma escola nova. E não, não é o clichê que você conhece, meu problema é maior do que isso, porque você não me conhece.

Tudo bem, quer que comece pelo meu "charme" quase gótico, pouco ajudado pelos olhos e cabelos muito negros e pele igualmente branca, ou minha maneira incrivelmente formal de falar (muitos livros e pouco contato social)? Pode escolher, contudo você olha ou fala comigo e logo pensa: "Estranha". Então some a isso um ambiente cheio de pessoas fúteis que nunca julgam a si próprias, mas adoram a análise alheia e praticamente salivam por alguma novidade. Olha que prato cheio, não acha? Serei o alvo de suas línguas e olhares afiados até dizer "chega".

O engraçado, no entanto, é que nem sempre fui assim... Não, houve um tempo em que Sunny* Clark me era um excelente nome. Mais especificamente, quando a luz ainda pincelava a minha vida e eu era, segundo todos, o Sol tangível dos meus pais. Não obstante, o brilho se foi na data mais improvável possível (5 de setembro de 1999, véspera do meu ansiado aniversário de sete anos) e levou consigo não apenas minhas certezas e sonhos, mas também aqueles a quem mais amava.


*Ensolarado(a).


Queira me perdoar, por favor, todavia lhe contarei o que aconteceu uma única e tortuosa vez, pois me rasga a alma tocar no assunto. Sendo assim, espero que seja empático e mantenha a atenção. Tenha em mente, de igual modo, que meus pais eram as pessoas mais maravilhosas que já presentearam este mundo miserável e estavam exatamente nesta posição quando o Universo lhes falhou...

E então escolheu a mim.

Olivia e William Clark sempre arranjavam tempo para ficar comigo, porém no meu aniversário, o dia era completamente meu. Se era em um final de semana, perfeito. Se não, sem problema, eles tiravam o dia de folga. Dá para acreditar? Que tipo de pais fazem isso, hein? Diga-me! Não sabe, estou certa? Eles eram realmente únicos e em sua concepção, meu nascimento era sagrado. Nada (repito: nada) poderia dar errado.

Tudo era minuciosamente planejado. De praxe, havia uma grande festa para a qual todos os meus amigos eram convidados (naquele tempo, eu tinha muitos, que engraçado...), brincadeiras antes mesmo do início da comemoração, preparação de algum alimento coletivamente, que é um hobby meu... e, é claro, muitos abraços, beijos, sorrisos e declarações. Nunca me sentia tão querida quanto nesses dias.

Diário De Um Passado Iluminado | 2ª ed. | ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora