Os primeiros dias são os piores... - parte dois

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25 de agosto de 2009


Péssimo direcionador de boas vibrações,

Seus esforços foram em vão. Hoje foi tão complicado quanto ontem, se não pior.

Utilizando a mesma tática, adentrei o recinto escolar mais cedo do que os demais, agradecendo mentalmente o fato de as salas serem mantidas abertas, o que é um tanto peculiar, mas quem está reclamando? Além disso, nesta ocasião funcionou melhor, o ambiente estava quase deserto. Sem reuniões, pelo que parecia. Contudo, sem um sorriso tranquilizador também.

Apesar de comandar a mim mesma para não fazê-lo, acabei analisando a escola rapidamente em busca de algum sinal do menino misterioso (ainda não o conheço realmente, nem sei seu nome, consequentemente continua enquadrado nessa categoria). Como previa, não estava lá. Não era todo mundo que tinha problemas sociais como eu, afinal. E, aparentemente, ele principalmente.

Logo me veio à mente uma imagem dele cercado de pessoas. Como podia não surtar sob todos aqueles olhares?! Como podia relaxar nessa circunstância? Isso por certo é o mais inacreditável. Eu provavelmente estaria sufocando! Mas, de novo, preciso parar de projetar. Ninguém ali carrega uma bagagem como a minha. Na realidade, muitos parecem gostar desse tipo de atenção (retiro o que disse, isso é o mais inacreditável). Recorde-me disso se essa minha tendência voltar a surgir, diário, estou passando vergonha, não estou?

É só que vivem em um mundo tão diferente do meu, embora respiremos o mesmo ar... Às vezes, é difícil não comparar. Especialmente quando reflito que eu poderia ter sido como eles, tão bem moldada para me encaixar nessa realidade, perfeitamente de acordo com os padrões historicamente bem construídos pela nossa sociedade. Creio até que já fui assim, constatação que me deixa aflita, mas não neutraliza sua veracidade.

Faz muito tempo, no entanto. Não compreendo por que ainda penso nisso (sou observadora, talvez? Gosto de fazer comparações?)... Estou sensível demais, é isso. Essa situação completa deve estar me deixando maluca! Não estou no meu normal, com certeza, meus nervos estão à flor da pele! Tudo isso à parte, entretanto, permita-me prosseguir...

Dirigi-me à sala de aula de cabeça baixa, mesmo consciente de que provavelmente ainda não havia outros jovens. Uma vez lá, tomei meu lugar afastado de sempre e os esperei chegar.

Vários minutos depois, escutei alguns risinhos entrecortados e três louras tanto vestidas quanto maquiadas como que para um desfile entraram.

— Mas, no fim, ele deixou a garota plantada lá, acreditam? — concluiu uma delas.

— Tadinha... — lamentou outra, apesar do rosto não expressar a menor compaixão.

A última desdenhou abertamente, com sua voz tão enjoada que me causou agonia na primeira sílaba:

— Ah, ela não achou mesmo que ele, de todas as pessoas, fosse realmente sair com ela, achou? Que sem noção...

Nessa hora, percebeu a presença de mais alguém ali e veio em minha direção, seu séquito logo atrás, enquanto eu desviava o olhar (nunca é bom fazer contato visual, certo? E meu instinto dizia que com essa era ainda pior... Aliás, não sei como aquele rapaz conseguiu me fazer esquecer tal regra, sou bastante cuidadosa quanto a isso)...

— Alguém já te deixou plantada, senhorita...? — Esperou que completasse com meu sobrenome, o que não fiz, apoiando as mãos em minha mesa.

Após um silêncio monumental, continuou, incomodada:

— Por que você é tão esquisita, afinal? Pra que todo esse preto?

Mais silêncio.

— Não vai nem olhar pra mim?! Que falta de educação! — exclamou.

Diário De Um Passado Iluminado | 2ª ed. | ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora