Chibchas

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_ O que nós vamos fazer agora?
_ Em primeiro lugar, vender nossas mercadorias. Nos Estados Unidos elas são ilegais e por isso o preço é. Muito melhor. Tenho um amigo que está indo para lá semana que vem, e a gente combinou rachar os lucros. Enquanto isso vamos para Veracruz, ver a K'arani.
...
_Como você está?!?
_ Estou bem. Temos nos cuidado muito. Elas de mim e da bebê e eu delas e da aldeia. Já resolvi umas cinco causas aqui, e ainda ajudo no preparo do milho.
_ Isso é bom, disse Etsukuni. Mas te perguntar, o que acha de irmos para Oaxaca?
_ Fazer o que lá?
_ Restaurar...
_ Como assim?
_ As coisas no passado era o melhor para a gente e agora só estão boas para eles. Não pode continuar assim.
_ Eu estou sentindo falta do meu pai, mas ele não vai vir nos ver mesmo. Então eu vou com vocês. Mas para onde, especificamente?
_ Para Achiutla, que havia sido a capital espiritual dos Mixteca, e local onde estava o Coração do Povo, uma esmeralda de cerca de 25 cm que representava a deidade suprema deste povo, e que foi destruída por religiosos católicos no século XVI.
...
Chegando na vila, encontraram uma estalagem ampla, pintada com motivos coloridos.
_ Gostaríamos de alugar um quarto amplo com 3 camas, disse Tusjava ao proprietário de uma estalagem em Achiutla.
_ Certo, são três pesos de prata o dia.
_ Te perguntar, aonde mora a tlamatlquiticitl da vila?
_ Dona Yusaavi? Ela mora naquela casa grande, à esquerda, perto do fim da rua principal. Alguma de vocês está grávida?
_Eu estou, disse K'arani.
_ Mas e o pai?
_ Boa pergunta.
_ Certo, vocês me dê um tempo para mandar minha esposa limpar o quarto. Podem deixar a bagagem de vocês aqui.
_ Certo, muito obrigado.
Elas foram ao encontro da tlamatlquiticitl, que as acolheu. Tomaram algumas infusões e comeram tortilhas. Depois de umas 3 horas voltaram para a estalagem.
_ Olá, boa tarde, disse o estalajadeiro. Então, quando eu fui ver o quarto, percebi que o vazio não era o de três camas, mas o de duas.
_ Basta nos colocar em outro, fácil de resolver.
_ Então, está ocupado, eu não tinha percebido.
_ Então faz assim: um quarto com duas camas para minha amiga e eu e outro, com uma cama só, para a outra de nós.
_ Infelizmente eu não tenho dois quartos disponíveis.
_ Compreendo, vamos procurar outro lugar, então.
Depois de algum tempo elas optaram por alugar uma casa, perto do espaço da tlamatlquiticitl. Muito cansadas, foram dormir cedo. Foram acordadas por uma algazarra nas ruas; parece que a estalagem da vila havia se incendiado e como era madrugada e muitos quartos estavam vazios, o proprietário demorou a perceber. O dia havia começado agitado...
_ Onde for parar orgulho das mulheres Mixteca?
_ Os espanhóis conseguiram roubá-lo, disse a tlamatlquiticitl, enquanto cuidava de umas pequenas queimaduras em Tusjava. O fato_ continuou ela_ é que os espanhóis conseguiram impor a visão deles de mundo entre nós, uma hierarquia centrada na figura dominante do homem.
_ E o que eles fizeram para isso?
_ Transformaram o Coração do Povo, nossa joia sagrada, maior símbolo da nossa identidade, cultura e religião, em pó. Literalmente.
_ Então precisamos de outra esmeralda.
_ Somos uma comunidade camponesa e pobre e nós, Mixteca, não somos muito de andar. Mesmo se tivesse muito dinheiro e fôssemos aventureiras, hoje encontraríamos outro esmeralda que servisse?
_ No mesmo lugar de onde a primeira veio. Vocês não tem nem ideia?
_ O mais provável é que tenha sido encontrada no País dos Chibchas.
_ Caso encontremos uma jóia adequada, você nos ajuda na restauração, perguntou Etsukuni.
_ Com todo prazer eu conversarei com as outras mulheres e com as anciãs.
_ Então amanhã mesmo vamos partir para Coatzacoalcos, que além de um importante porto, é o lugar onde dizem que Quetzalcóatl foi visto pela última vez, e para onde prometeu retornar algum dia.
Chegando na cidade veracruzenha, vizinha dos Estados Maias, embarcaram em um navio com destino a Cartagena de Las Índias, em Nova Granada, e de lá se dirigiram para Gachetá, no centro da região dos esmeraldas. O país era montanhoso, coberto por florestas densas, quente nas áreas mais baixas e chuvoso naquelas mais elevadas.
_Muita da cocaína que compramos vem daqui, você sabia, disse Etsukuni.
_ Na verdade vem de Nova Granada. Aqui eles só mascam folhas de coca, replicou Tusjava.
_ Seja como for, que lugar complicado para se andar é este. Não vi nenhuma rodovia ou ferrovia apenas essas estradas ou trilhas ainda mais estreitas.
_ Os povos Chibcha são muito na deles, o resto do mundo não lhes importa muito.
_ Não deixa de ser um bom modo de vida. Você sabe do que eles vivem aqui?
_ Parece que são artesãos e joalheiros muito habilidosos, por aqui a ouro e esmeraldas no litoral muitas pérolas, e compram prata e cobre dos vizinhos. Também vendem para todo mundo grãos de cacau e café. Como não são muitos, eles acabam vivendo bem.
_ Desde antes da invasão dos espanhóis eles cultivam estas terras com milho, batata-doce, algodão, abóbora, feijão, tabaco, tomates, guanabana, abacaxi e pitahaya. Dá para viver assim, ainda mais houver peixe e alguma carne, disse K'arani.
_No passado, disse Etsukuni, eu sei que havia muita carne de gente: eles canibalizavam criminosos, adúlteros, guerreiros e povos vencidos... Mas hoje eles não comem mais gente, apenas aproveitam a pele para fazer roupas cerimoniais. Na verdade se estamos falando disso é porque estamos com fome. Falta muito? Esses burrinhos não são muito rápidos...
_ Estamos quase chegando, daqui é possível ver as estátuas de Bachue e Furachogua, que representam a Boa Mulher e Grande Mãe Universal, criadora da humanidade, deusa da fertilidade vegetal e da fecundidade humana, disse Tusjava.
_ Menos mal que seja delas, o Deus-Sol desse povo, Bochica, representa muito do que eu desprezo, principalmente no que diz respeito a um moralismo controlado por homens, disse K'arani.
_Será que eles realmente guardam afinidade com os maias, Tusjava?
_ Olha, existem muitos elementos que dizem que sim. A questão é se eles vieram do norte ou do sul. Como existe afinidade genéticas entre Maias é provável que em sua origem mais primitiva eles tenham vindo dos Andes centrais. O que você acha, Etsukuni?
_Não me importo com isso. Meu objetivo é conseguir uma boa esmeralda.
Assim finalmente chegaram na cidade de Gachetá, situada a pouco menos de 1.800 m de altitude. Lá, depois de alguns dias, conseguiram informação de que, próximo aos limites com Guachalá, havia uma mina onde talvez fosse possível encontrar uma esmeralda como a que elas procuravam.
Quando chegaram os Chibcha estavam para construir uma casa. Como de praxe, as bases estavam sendo assentadas sobre os corpos de pessoa sacrificadas.
_ Quem eram eles, perguntou Etsukuni.
_ Ah, ninguém não, trotskistas apenas, nem aproveitamos as peles para vestir, disse uma anciã.
_ Podemos ajudá-las?
_ Sejam bem vindas. Daqui há pouco, assim que as pilastras de madeira forem assentadas, a gente ajuda trançar a paliçada.
Os fortes construtores Chibcha colocaram as seis pilastras laterais. K'arani não deixou de se excitar com aqueles corpos seminus musculosos, mal notando o estalar dos ossos sob as pesadas toras de madeira que estavam sendo assentadas.
_ Mas então, soubemos que vocês encontraram uma esmeralda bastante grande. Nós viemos comprá-la, disse Etsukuni.
_ Ela ainda está na pedra, senhora. Precisa ser extraída, limpa e lapidada, disse o mestre da mina.
_ Não para nós. Queremo-la exatamente assim. Nosso povo precisa dela.
_ E quanto vocês me oferecem?
_ Temos 6000 pesos de ouro.
_ Com as joias que podemos fazer dela, poderemos ganhar muito mais...
_ Também trouxemos sementes de uma variedade de mandioca que cresce na altitude. Sabemos que no passado a mandioca era o principal alimento de vocês, mas como ela tem dificuldade de crescer na altitude, vocês tiveram que viver sem ela. Mas essas duas variedades aqui crescem muito bem nas condições de vocês.
Emocionado, o mestre entregou a pedra e elas puderam voltar para Oaxaca.

Tenochtitlán: os começosOnde histórias criam vida. Descubra agora