Chegaram ao refeitório após caminharem por alguns corredores, perdidos. As mesas eram maiores, as equipes se sentavam completas. Na verdade, tudo naquela base era maior, mais bonito e muito mais confortável; não conseguiam entender como aquela não era a base central desde o início. A Beta Vermelha parecia minúscula sentada naquelas mesas. Estavam servidos de seus almoços, mas não aparentavam ter muita fome. Oito brincava com a comida na bandeja, tentando fingir que estava bem.
Quem conhecia as reações do Sete sabia tudo o que ela estava fazendo. A Beta Vermelha não pode não deixar de notar a semelhança comportamental dos dois nesse tipo de situação. A diferença era que agora Sete se via na posição de responsável, enquanto Oito deixara sua existência de lado em prol dos outros.
Nove não se sentia confortável em dar instruções num momento como aquele, porém ele não havia escolha. O que Nove realmente queria era que todos da Beta Vermelha saíssem das linhas de frente, assim ele não perderia mais ninguém. Ele sabia que ninguém deixaria seu posto, e por isso precisava engolir toda a sua preocupação dar as diretrizes da missão.
- Eu gostaria que tivéssemos um tempo de luto, mas não será possível devido às circunstâncias somadas ao tempo em que estivemos afastados das linhas de frente. Teremos algumas mudanças nas equipes de apoio, mas vamos prosseguir com a missão ao Brasil.
- Se a Oito não se sentir bem, ela pode ficar na nave e eu vou – disse Quatro, tentando proteger sua amiga.
- Oito, Três e Sete precisam ver a Silver. Há uma missão secundária de teste de armas, os três precisam ir a campo – devolve Nove.
- Estaremos lá logo após o almoço. Mas, falando sobre a ida ao Brasil, alguém mapeou o lugar? Precisamos nos reunir para discutir o plano de ação principal – diz Três.
- A saída está marcada para amanhã, podemos ver isso tudo essa noite? – Pergunta Dois.
- Por mim não há problemas – responde Nove.
- Por mim também não – concorda Quatro.
- Outra coisa... As instalações dessa base, por mais que sejam luxuosas e aconchegantes... bem... a base não foi preparada para receber refugiados da base central. Por essa razão a nossa divisão de quartos ficará menor, pelo menos até a construção dos nossos quartos. Sete e Oito dividirão quarto comigo e Dois; Um e Cinco dividirão quarto com Três e Quatro.
- Mas para durarmos até o fim do dia, precisamos comer. Eu sei que é uma situação difícil, mas o Zero não deu a vida dele para ficarmos dessa maneira. Por favor, em memória ao nosso Zero, vamos cuidar uns dos outros – dizia Quatro, um tanto incomodado.
Todos concordam. Quatro estava certo, eles precisavam agir em memória do amigo, ou o esforço dele seria em vão. Oito não concordava com essa filosofia porque se sentia completamente morta por dentro, mas fingia concordar. Essa reação dela destruía o coração de Sete, porque ele a cada segundo percebia o quão inúteis os esforços dele se tornavam. Sua amada alimentava-se por obrigação, e era como se estivesse vivendo sob essa mesma filosofia.
Após o almoço, Três, Sete e Oito deslocaram-se para o encontro com Silver. A diretora deu-lhes as instruções da missão secundária, e um aparelho novo para Três. O único aviso que lhes foi dado pela Silver era de que essa missão era de extremo sigilo, pois se tratava de um assunto severamente delicado.
Assim que deixaram a sala de Silver, Três foi ao encontro de Quatro, Dois e Nove para discutirem o plano da missão. Sete e Oito dirigiram-se para o quarto, estavam exaustos.
No quarto depararam-se com um problema: havia duas camas de casal. Claro que quando a S.J.Y dividiu os quartos da nova central não pensaram em quem iria dormir neles, mas apenas em quais seriam os quartos mais confortáveis para as equipes Beta.
Sete sentou-se à cama, pensativo. Em alguns minutos começou a juntar lençóis e um saco de dormir.
- Sete, o que você está fazendo?
- A minha cama, oras.
- Vai dormir no chão? Você ta maluco?
- E quem vai dormir, você?
- Sete amanhã saímos em missão, você vai ficar cheio de dores de dormir aí. Quer fazer o favor de se deitar na cama?
- Isso seria um desrespeito.
- É, a cama vai se sentir violada se a sua bunda encostar nela.
- Oito, não é correto eu dormir com você.
- Sete, estamos no meio de uma guerra contra um bicho que não sabemos o que é, mas que está ameaçando extinguir os humanos, acabamos de perder a nossa central, perdemos um Beta Vermelho, temos uma missão amanhã num lugar que vai ser complicado, vamos dormir por quase dois meses naquela maldita nave, e você quer decidir o que é correto?
Sete não respondeu, apenas se sentou novamente na cama. Oito procurou seu lado da cama e deitou-se. Ele ficou de costas para ela em sinal de respeito, e também para esconder o nervosismo que estava sentindo de dividir a cama com a sua amada. Eles adormeceram rápido, mas Oito estava presa em pesadelos.
Dois e nove adentraram o quarto em silêncio, quando perceberam que seus colegas já estavam dormindo. Assim que se trocaram deitaram-se. Demoraram um pouco para dormir, mas quando conseguiram foram atrapalhados por um grito da Oito. Ela acordara de um pesadelo que não conseguia explicar.
Oito estava assustada, sentia-se sozinha, como no dia em que a S.J.Y a resgatou. Quando costumava ter pesadelos, Zero a abraçava e lhe fazia companhia até que ela adormecesse novamente. E agora, não tinha Zero para acalmá-la. Ela começou a chorar baixinho. Dois e Nove a observavam, fingindo estarem dormindo – mesmo após o susto –, até que finalmente Sete acordou.
Era visível o quão cansado Sete estava, ele mal abrira os olhos para conversar com Oito.
- Você precisa descansar, Oito...
Ele tocava o ombro dela, tentando fazê-la voltar a deitar-se. Sete estava mais próximo de sonhar do que de estar desperto, mas se esforçava como conseguia. Após insistir com alguns tapinhas para que Oito deitasse, Sete se senta na cama, com um pouco de dificuldade.
- O que você tem, Oito...?
- Pesadelo...- respondia Oito, fungando.
- Foi só um pesadelo... já passou... não vai voltar a acontecer... – continuou Sete, acariciando o braço dela.
- Eu vou perder todo mundo...
- Foi um pesadelo, Oito... Vá dormir... – Disse Sete, se deitando novamente.
- Eu não consigo!
- Vem aqui, me dá um abraço.
Oito rapidamente abraçou Sete, que a envolveu carinhosamente em seus braços. Ele beijou a testa dela.
- Você não ta sozinha, Oito. Eu não vou te deixar sozinha.
Oito apertou o abraço e aconchegou-se no peito de Sete. Era confortável estar ali, ele passava a mesma energia que Zero tinha. Mesmo com sono, Sete a tratou com muito carinho e cuidado. Mas ainda se sentia culpada de estar ali com outro homem com menos de um dia da morte do seu Zero.
Para a sorte dele, estava com sono suficiente para não perceber o que estava fazendo. Se Sete não estivesse quase morto de cansaço, certamente não diria metade do que disse, e teria alguma espécie de infarto se tivesse ciência de que estava deitado numa cama abraçado à Oito.
Nove e Dois que observavam tudo estavam felizes de ver Sete finalmente sendo franco consigo mesmo e demonstrando a Oito tudo que ele sentia. Ao mesmo tempo que não sabiam como reagir à sua colega. Para eles claramente os pesadelos que ela teve eram relacionados à perda de Zero, ou ela não iria falar que estava sozinha – porém estavam errados, ela se sentia sozinha por não ter alguém que a fizesse companhia enquanto acordada, com medo.
Os dois também não podiam deixar de achar fofo que Sete e Oito acabaram por adormecer abraçados, e em silêncio encenavam como seria o pânico de Sete ao acordar lúcido e perceber como passa a noite. Eles invertiam os papéis e imitavam a pose de Sete e Oito. A brincadeira acabou com Dois rendendo-se ao sono, e dormindo com a cabeça encostada no ombro de Nove.
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APOCALYPSE
Ficção CientíficaPor onde passo, vejo pânico. O mundo que você conhece, para mim não existe mais. As cidades foram tomadas por seres que perderam sua humanidade, que infectam as pessoas quando são mordidas por eles. Nós ainda não sabemos como isso tudo começou, e ta...