Capítulo 18

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Anahi

Quando eu pensava na forma como tinha chegado até ali, naquele momento precioso, eu ficava perto de acreditar nos mais impossíveis
milagres.
— Você está magnífica, querida. — A avó de Alfonso sorriu para mim do espelho.
O sorriso dela me deixou levemente emocionada. Principalmente diante
da melodia bonita que subia pelos jardins e entrava pelas janelas do quarto.
Piotr Tchaikovski estava sendo executado com maestria perfeita pela
orquestra que Yolanda contratara para o baile das Magnólias.
Maite foi ainda mais efusiva em sua demonstração. Ela saltou da cama em seu vestidinho rosa e abraçou minhas pernas. Ajoelhei-me, mesmo nos saltos perigosamente altos, e a abracei de volta.
— Vocês duas vão se amassar. — Yolanda reclamou, fazendo Maite e eu rirmos — E as mulheres da nossa família têm de estar impecáveis para a missão desta noite.
Nós duas nos afastamos, obedientes. Mas ainda rindo.
Passei as mãos pelo meu abdômen e olhei outra vez para o espelho,
apenas para verificar se não havia amassado. O longo vestido azul-marinho
estava impecável. Assim como meu cabelo preso em um coque elegante, com alguns fios de cabelo perfeitamente calculados caindo sobre a minha testa.
O penteado reunindo todo o meu cabelo só não era mais pesado que os
brincos de safira. Mas eu não me incomodava com isso. Principalmente ao
me lembrar de momentos mais cedo, quando aquelas joias vieram até mim,
surpreendendo-me.
Alfonso tinha prendido o colar no meu pescoço com solenidade. O reflexo dele no espelho era sério e seus dedos me tocaram com reverência
polida.
— Você vai mesmo confiar joias antigas e valiosas a mim? — Eu tinha
perguntado, chocada ao vê-lo me oferecer diamantes do cofre exclusivo da
família. Joias usadas somente por membros que assinavam Herrera.
Depois do que Giovanna havia feito... Qualquer desconfiança dele, nesse
sentido, seria válida. Eu mesma não podia negar.
— É você quem tornará as joias valiosas esta noite, Anahi Herrera.
Ele me garantiu, sério. Não me escapou que aquela era a segunda vez
em que Alfonso juntava meu nome ao dele. Que o dizia com a dose certa de
orgulho. Pelo menos, a dose certa nos meus sonhos mais bonitos.
Toquei o colar com delicadeza.
Eu sabia que alguma coisa profunda tinha mudado entre mim e Alfonso,
depois daquela noite na biblioteca. Nós dois havíamos exposto muita coisa e nosso relacionamento tinha alcançado um novo nível. Eu sentia isso em cada
fibra do meu ser e a cada toque que compartilhávamos.
Também sabia que a audiência sobre a guarda de Maite seria na
segunda-feira. E que depois do sucesso dela, chegaria a minha hora de partir.
Mas nas vezes em que tentei abordar o assunto com Alfonso, nos últimos dias,ele resistira. Me calara com seus beijos e com seus braços, o que só poderia ser o mais maravilhoso dos sinais.
— Muito bem, vamos descer. — Yolanda segurou meu punho e depois alisou a saia já perfeita do seu elegante vestido preto — Alfonso já deve estar nos esperando. Essa noite ele apresentará você aos nossos círculos mais íntimos e boa parte da elite das Ilhas Britânicas.
Engoli em seco e encarei a avó de Alfonso.
— E isso seria para me deixar mais tranquila, Yolanda?
Ela apenas sorriu.
— Ora, não se preocupe, querida. Você é mexicana. Você é do país com
as pessoas mais adoráveis do mundo. Acredite, todos só vão invejar Alfonso essa noite.
Tentei dar um sorriso, mas o nervosismo já corria desenfreado pelas
minhas veias. Ainda assim, confiante, estendi a mão para Maite e seguimos Yolanda para fora do meu quarto.
Nós descemos as escadas atrás da matriarca da família, e as portas francesas que davam para o jardim foram abertas por distintos homens uniformizados de branco.
Fomos recebidas pela brisa pacífica e cheirosa do verão. Mas não tive tempo para a respirar muito depois disso.
A primeira a vir em nossa direção foi Bethane, a presidente das Roses of
Queen.
— Ah, minha cara, você está um primor — ela disse, bajuladora, em um
vestido de cor marfim.
Tive de me esforçar para manter um sorriso polido. Yolanda já tinha me
alertado de que passado a fase do ressentimento, ela veria vantagens em se tornar amiga da esposa de Alfonso Herrera. Todos querem a simpatia da esposa de um homem poderoso.
Na verdade, Yolanda me disse que isso se repetiria muito. E ela estava invariavelmente certa. Ficou mais do que provado na primeira hora daquela noite.
Nem o fato de eu ser latina pareceu importante diante daquela elite.
Banqueiros, membros do parlamento inglês e da nobreza britânica e até
políticos de outras partes da Europa, todos pareceram esforçarem-se para atrair a minha simpatia. Fui convidada para inúmeros jantares e recepções.
Com uma simples piadinha em espanhol, tinha feito um senador francês
doar milhares de euros para o fundo dos refugiados de guerra. A missão final
do baile das Magnólias.
— Você está se saindo muito bem, Anahi
— Yolanda me
parabenizou depois que deixamos Maite com a babá e voltamos a caminhar no jardim.
— Estou mesmo? — inquiri, mas não estava conseguindo prestar muita atenção.
Eu estava ansiosa. Em uma hora, eu só tinha avistado Alfonso uma vez.
Conversando com um tal Liam Kensington. Um CEO como Alfonso. Mas
Yolanda não nos levara na direção deles. Segundo ela, Liam era um homem
bonito, mas intragável.
Entretanto, não parecia tão intragável assim para Alfonso. Ele apenas me
lançara um olhar com discreta aprovação de longe, mas não fizera menção de sair da conversa e se aproximar de nós.
— Maravilhosamente bem — Yolanda prosseguiu. Notei uma mulher de
vestido prateado, próxima aos arbustos bem aparados, nos encarando. Por um
minuto, ela me pareceu familiar. Mas ela se virou e saiu antes que eu pudesse processar qualquer coisa. — Eu disse a Alfonso que os Herrera só tinham
a ganhar com uma mexicana na nossa árvore genealógica. Vamos ser
indestrutíveis depois disso e...
— Com licença, Yolanda.
A voz profunda surgiu às nossas costas e ambas nos viramos juntas.
E lá estava ele. Meu marido de conveniência. Trajando um smoking,
como no dia em que nos conhecemos, Alfonso Herrera fez meu coração escorregar dentro do peito.
— Será que posso ter minha esposa comigo?
Senti-me aquecer por dentro diante do olhar que ele me lançou.
Yolanda abriu um sorriso discreto, mas aprovador.
— É claro, querido — Ela se aproximou de Alfonso e o cumprimentou
com um beijo — Apenas se lembrem de que hoje teremos mais expectadores
na quadra de badminton.
Um pequeno sorriso curvou os cantos da boca de Alfonso enquanto eu
enrubescia. E a ligeira curva sumiu apenas quando a avó dele se afastou.
Então seu rosto foi sendo dominado por alguma tensão torturante enquanto me fitava.
Fechei a distância entre nós, preocupada.
— Algum problema? — Eu não sabia se seria de bom tom tocar o rosto
dele no meio de toda aquela elite inglesa elegante, mas o fiz assim mesmo.
Alfonso segurou minha mão. Depois a afastou devagar e suspirou.
— Precisamos conversar, Anahi.
Sim. Havia um problema.
A agonia no rosto dele parecia ganhar cada vez mais proporções.
— Alfonso, você está me assustando — falei quando um arrepio de mal
pressentimento cruzou minha espinha. — O que está acontecendo?
Ele respirou fundo de novo. Seus olhos ficaram crus.
Mas se Alfonso tinha alguma pretensão de responder à minha pergunta,essa sumiu quando uma mão pesada pressionou o ombro direito dele.
—Herrera — Liam Kensington pareceu-me ainda mais sisudo de
perto. — Desculpe-me atrapalhar, mas terei de partir mais cedo. Estou indo para Nova Iorque em alguns dias e precisamos finalizar o acordo.
Surpreendentemente, ele me lançou um olhar de arrependimento.
— Esta é minha esposa, Anahi Herrera — Alfonso pousou a mão na minha cintura — Anahi, este é Liam Kensington, CEO da Meridian, a terceira maior empresa de tecnologia do mundo e meu melhor amigo.
— É um prazer, senhor Kensington — falei, polida, e estendi a mão.
— O prazer é meu, senhora Herrera. Embora eu ainda fique um tanto
ressentido por não ter sido o padrinho.
O sorriso era formal. E apesar da bela tentativa de humor, o homem ainda me causava medo.
— Bem, o senhor pode culpar meu marido apressado — fiz o melhor que pude.
O sorriso formal apenas se alargou.
— Aguardo você perto da fonte,Herrera — Liam disse em seguida e afastou-se.
— Ele me dá medo — acabei confessando, baixinho.
— Liam é um homem ferido. Talvez com demônios piores que os meus.
— Alfonso o defendeu de imediato.
— Desculpe, eu não quis...
— É melhor que me espere na biblioteca. Para conversarmos — Ele me
interrompeu. E por um segundo pareceu hesitar entre usar a mão que estava na minha cintura para afastar-me ou se aproximar. Quando ele escolheu a primeira opção, tive ciência de que algo ruim estava por vir — Estarei lá em quinze minutos.
E sem qualquer outro toque, ele se foi.
Senti que meu coração tinha saltado do peito e partido com ele.
Eu tinha certeza de que a biblioteca estava acolhedora. As labaredas
cintilando atrás da tela de segurança indicavam isso. Mas ainda assim, eu me abracei diante da lareira, tentando conter o frio que se alojara no centro da minha caixa torácica.
Nos últimos dias, eu havia tido uma certeza plácida do que estava
acontecendo entre mim e Alfonso. Entretanto, o olhar que ele me lançara nos jardins indicava outra coisa.
Não, Anahi. Ele sentia também.
Lutei contra aquilo. Alfonso podia não ter falado muitas coisas, mas o sentimento em seu toque era inegável. Seria impossível fingir todo aquele carinho e devoção.
Ainda tentando lutar contra os maus pressentimentos, caminhei em
direção à mesa de nogueira dele. Um sorriso escapou dos meus lábios quando me lembrei da noite anterior, quando desorganizamos todos os papéis que estavam ali em cima, numa tentativa falha de leitura conjunta. Era difícil ler qualquer coisa sobre o Canal da Mancha com as mãos e os lábios de Alfonso correndo sobre a minha pele.
A recordação me deixou subitamente segura.
Devia ser a audiência sobre Maite, que aconteceria na segunda-feira.
Talvez fosse sobre isso que ele quisesse falar.
A esperança se solidificou ainda mais no meu coração diante daquela
justificativa. E eu teria acreditado nela de vez, se meus olhos não tivessem
encontrado o envelope pardo. No alto de uma pilha de papéis, ao lado de uma luminária. Poderia ter passado despercebido, se não fosse meu nome escrito
nele. Registrado na caligrafia perfeita de Alfonso.
Aquilo era... para mim?
Meu coração me respondeu de imediato e me impulsionou a agarrar o envelope. No entanto, hesitei um pouco com ele nas mãos.
Mesmo que fosse para mim, Alfonso não o tinha me entregado. Não parecia correto abrir... Entretanto, se meu nome estava nele, que mal haveria em ver? Não seria uma violação de fato, seria?
Meus dedos torceram a ponta do envelope.
Eu devia esperar que ele chegasse. Essa seria a atitude mais correta. Mas quando tentei colocar o envelope de volta no lugar, não consegui. Eu já tinha perguntas sem respostas demais naquela noite. Então desfiz as dobras do papel e puxei as folhas brancas de lá.
Gastei poucos segundos para registrar do que se tratava, e os meus pressentimentos ruins caíram sobre a minha cabeça. Todos de uma vez.
Eram papéis de divórcio.
Do meu divórcio com Alfonso.
E estavam prontos para serem levados a êxito. A rubrica perfeita de
Alfonso já marcando o papel com sua decisão firme, provavelmente de dias atrás, apenas à espera da minha assinatura para concluir o nosso fim.
A dor me consumiu de repente. Quase me cegando.
— Os homens dessa família agem sempre assim. — Uma voz feminina fez-me saltar de susto. Virei-me de imediato. — Eles consomem e descartam.
Mas você sempre quer mais.
A mulher de longos cabelos castanhos, presos em uma trança sofisticada, era uns bons anos mais velha do que eu. Mas sua beleza era
extraordinária e familiar. Quando meus olhos caíram sobre o vestido prata,recordei-me de imediato de vê-la me encarando de um jeito intenso no jardim.
— Quem é você? — tentei mostrar firmeza, apesar de tudo.
Ela não respondeu. Aproximou-se. Mas os anos de defesa pessoal não me deixaram ser enganada pela maquiagem bem-feita. O rosto da mulher estava transtornado. Seus olhos cinzas estavam dilatados e inquietos. Ainda
assim, o que me causou medo real foi o braço trêmulo que ela trazia escondido atrás das costas.
— Eu sou Tessa Hart. E essa família é minha — ela pontuou, agressiva.
Tessa. A mãe de Maite. Ex-madrasta de Alfonso. Por isso ela parecia
familiar. Maite era a cópia da mulher.
Enquanto meu cérebro fazia esse registro rápido, Tessa soltou uma gargalhada terrivelmente alterada.
— Ah, Alfonso é quase completamente parecido com o pai. — Ela me
analisou. — Exceto pelo mau gosto para esposas. Mas eu vou colocar as
coisas no lugar.
Ela revelou a mão escondida, confirmando minhas suspeitas mais
terríveis ao apontar a arma na minha direção.
— Espere... — comecei a pedir.
— Eu não vou esperar nada, sua puta maldita! — Ela se alterou de imediato. — Ele é meu! Você me ouviu? Nós estávamos prestes a ficar juntos! Eu entrei na porra da justiça para atraí-lo, e nenhuma vadiazinha
mexicana vai me tirá-lo.
— Tudo bem, tudo bem — concordei de imediato, com o coração na garganta.
— Você nem sabe o que ele quer! — ela berrou de volta, e eu dei um
passo para trás, esbarrando na mesa — Não pode dar o que ele quer! Eu posso! Eu já dei! Nós temos uma filha juntos!
De repente, a passagem oculta atrás da mesa se abriu e Alfonso avançou
de imediato, colocando-se entre nós.
— Não, Alfonso! — Tentei alcançá-lo, mas ele me ignorou e se colocou
diante da arma.
— Tessa, está tudo bem. Eu estou aqui. — Ele estendeu a mão na direção dela. — Agora acalme-se e me dê a arma.
— Não! — Tessa voltou a gritar. — Eu não posso, Carl. Você não vê?
Ela quer nos separar! Nós temos que ficar juntos e criar nossa filha, meu
amor.
Estava claro que Tessa estava em uma espécie de delírio, misturando
presente e passado.
Alfonso deu um passo firme na direção dela.
— Alfonso, não! — solucei, em pânico.
— E nós vamos ficar, Tessa — Alfonso não se abalou. Sua voz era tranquila — Nós vamos fazer tudo o que você quiser.
—Nós vamos mesmo, Carl? — ela repetiu, o revólver tremendo, mas cedendo altura aos poucos.
— Sim. Nós vamos, querida. Agora me dê a arma.
Ela hesitou, mas, por fim, estendeu a ele o revólver.
Alfonso foi rápido. Enfiou a arma no bolso do smoking e em seguida a abraçou.
— Me desculpe, meu amor — ela soluçou.
—Está tudo bem. Vai ficar tudo bem. — Ele acariciou os cabelos dela.
Tessa chorou e se desfez nos ombros dele.
— Eu amo você. Não importa o quanto me machuque, eu sempre vou te amar, Carl. Meu Carl.
E ela ficou repetindo o nome do pai de Alfonso, enquanto o abraçava com
força. Como se estivesse se perdendo nele. Como se ele ainda a consumisse.
O que realmente tinha acontecido. Aquela mulher tinha sido levada ao limite.
Fiquei paralisada. Assistindo a cena em estupor, em choque, até a mão fria de Alfonso tocar a minha.
— Por favor, traga Christian até aqui, Anahi. Com discrição.
Nada na minha mente parecia próximo de funcionar com normalidade,
mas me vi assentindo. E mesmo mal sentindo os movimentos, me vi
caminhando em direção à saída.
Eu nunca tinha visto a destruição tão de perto, refletida nos olhos de
alguém, enquanto ficava também a um passo da minha própria ruína. Mas
aquele encontro quase fatal com Tessa Hart tinha mudado minha perspectiva
em momentos.
— Ainda bem que Maite viu vocês pela passagem oculta. Tessa foi levada para o hospital com segurança e discrição. Ela estava perto de ter uma overdose pela alta dosagem de cocaína...
Alfonso ainda estava falando ao adentrar a sala de chá, mas eu não o
deixei terminar. Corri até ele e o abracei apertado.
Não me importava mais com nada. Com orgulho. Com a raiva. Nem mesmo com o baile das Magnólias, ainda acontecendo intocável, do outro lado da mansão.
— Ah,Alfonso. Eu fiquei com tanto medo — Dei vasão às minhas lágrimas e a todo pavor que tinha sentido mais cedo. Enrolei meus dedos no seu colarinho perfeito — De vê-lo ferido. Meu Deus, eu tive tanto medo de te perder. Eu amo você, Alfonso.
O corpo dele retesou-se tão logo as últimas palavras escaparam da
minha boca.
Eu não tinha planejado revelar aquilo. Era o momento. A pressão. O fato de encarar a morte nos olhos. Entretanto, quando me declarei e ele me afastou do seu peito, foi devastador.
— Não pode me amar, Anahi— ele disse, ríspido — Deus do céu,você não percebeu o que acabou de acontecer?
— Alfonso...
Tentei me aproximar, mas ele se afastou e levou as mãos aos cabelos
bem penteados.
— Não, Anahi. — Ele suspirou e parou diante das portas francesas,
fitando a piscina ao longe. — Eu sempre tive dúvidas sobre o mal que meu
pai poderia ter feito a Tessa, mas esta noite tudo se confirmou. Tessa está sendo consumida pelas drogas. Tudo por causa dele. Por causa dos abusos que ele cometeu, anos atrás. Ele a arruinou também. Talvez não de forma física, mas psicologicamente. É um fato.
— Mas você não é ele! — berrei, inconformada.
Alfonso não se alterou. Sua figura continuou estática por alguns segundos, até ele desistir e colocar as mãos nos bolsos.
— Você não entende, não é? Homens como nós sempre vão encontrar
alguma forma de manipular e machucar as mulheres.
— Não, Alfonso — protestei e fui até ele, abraçando suas costas numa tentativa de reafirmar meus sentimentos. De mostrar também o quanto eu estava disposta a lutar por eles. Lutar por ele — Você jamais faria algo
assim. Eu sei disso.
A voz dele soou estranha:
— Mas eu já fiz, Angel. Com você.
Minha respiração ficou suspensa.
— O q-quê?
Ele se virou nos meus braços. Vi lágrimas chegarem aos seus olhos
verdes pela primeira vez na vida.
— Eu menti para você, Anahi.
— Mentiu? — repeti, patética.
Alfonso amparou meu rosto.
— Não há roubo. Giovanna devolveu o colar da minha avó. No primeiro dia
em que amanhecemos em Londres.
Meus braços amoleceram em torno dele.
—O quê... O que você está dizendo?
O que ele estava falando? Nada parecia fazer sentido. Não há roubo?
Devolução?
— Eu proibi sua irmã de se comunicar com você nesse mês que passamos juntos — ele prosseguiu, e uma lágrima escapuliu por sua
bochecha — Nem mesmo aquela mensagem deveria acontecer. Você deveria
continuar preocupada, acreditando no desaparecimento dela e no roubo.
Porque eu precisava de você aqui, pagando por uma dívida que não existia mais,para que eu conseguisse o favor de um juiz.
Foi como um soco no estômago. Talvez um pouco mais em cima, perto do meu coração.
Então, ele tinha mentido... Sobre tudo? Mesmo vendo minhas noites sem
dormir por causa da minha preocupação com Giovanna? Mesmo quando chorei,corroída pela culpa do que ela tinha feito...
— Eu... Meu Deus... — Foi tudo o que saiu dos meus lábios, enquanto
eu cambaleava para longe dele.
— Quando meu pai se divorciou da minha mãe, já era tarde demais,
Anahi. Ele tinha causado danos irreversíveis. Também fez o mesmo com Tessa, você viu. — A voz de Alfonso continuou a entrar nos meus ouvidos.
Mas minhas emoções traídas me cegavam — Pensei que poderia evitar esses mesmos danos, divorciando-me de você antes da audiência, na segunda-feira.
Fazendo diferente. Fazendo o que era certo.
Mas ele tinha falhado. O buraco que se abria no meu peito não deixava
qualquer dúvida.
No final, tudo não havia passado de um jogo para Alfonso Herrera.
Ele nunca se importara verdadeiramente com os meus sentimentos.
“É assim que eu sou. Eu tiro vantagem. Sou um canalha desprezível. Eu
avisei que não era homem para você, my Angel.”
E a pior parte era que ele tinha me alertado. Desde o início. Mas eu não
me importei. Ainda assim, eu tinha entregado o meu coração para que ele o
triturasse ao final daquelas quatro semanas.
— Por favor, Angel. Diga alguma coisa. — Percebi a sombra dele pairando diante de mim — Eu sei que fui um bastardo egoísta e a usei, mas...
— Não me toque. — Afastei-me quando ele tentou segurar meu rosto.
Meu coração se despedaçou bem ali. Diante dos pés dele.— Você não vai me
tocar nunca mais, está me ouvindo? Nunca mais. Eu odeio você, Alfonso.
E o choro irrompeu da minha garganta.
Mas eu não permiti que Alfonso Herrera tivesse o prazer de saborear a
minha destruição. Eu me virei e corri. Na esperança de me afastar o suficiente. De me afastar para sempre. Mas cada parte do caminho era pontuada por uma tristeza indescritível, entranhada na minha medula. Como
um caco de vidro preso de forma profunda.
Talvez com a possibilidade de me fazer sangrar para sempre.

Algemas de Diamante.Onde histórias criam vida. Descubra agora