Algemas de Diamante.

Capítulo 8

Alfonso

Para um homem cético, eu estava bem longe das minhas convicções no momento.
Eu tinha me casado, quando jurara veementemente nunca fazer isso. E para completar, tinha conseguido uma virgem por noiva. Intocada.
Ao menos, até você amarrá-la e machucá-la com a sua brutalidade O scotch na minha mão pareceu-me, subitamente, fraco demais.
Por isso, deixei o copo de uísque sobre o piano de cauda e me sentei na
banqueta, fitando a chuva que castigava a cidade através das amplas vidraças
da minha cobertura. A sala estava parcialmente escura, diferente do meu humor, que parecia estar em um completo breu.
Eu devia ter ouvido a minha consciência. No momento em que aquela mulher assinou os papéis de casamento. Disposta a qualquer coisa para cuidar de uma irmã, mesmo que isso a colocasse em uma situação absurda com um maldito bastardo como eu.
Anahi não era para mim. Nunca seria.
— Alfonso?
A voz dela me fez fechar os olhos por um momento. Mas minha mente acabou retornando à cena, no exato momento em que me afastei do corpo dela e o sangue maculou o lençol.
Quantas vezes eu não tinha visto sangue daquela mesma forma? Em um quarto de casal e logo depois de uma briga deles. Minha mãe sempre fechava
a porta para que eu não escutasse, mas os vestígios de sangue estavam lá
quando eu entrava no cômodo luxuoso, mais tarde.
— Desculpe-me por não ter contado. Antes.
Abri os olhos e girei o rosto, forçando-me a encará-la.
Fazia uns bons minutos que eu havia deixado o quarto, mas Anahi não estava perfeitamente vestida diante de mim. Ela usava o meu robe preto que a engolia quase por completo, se não fosse a cintura marcada por um laço tentador.
Alfonso, Alfonso...
Olhei para aqueles grandes olhos azuis, ansiosos. Era hora de terminar o que nunca devia ter começado.
— Acredito que esse erro deva terminar por aqui. — Fiz o que devia ter feito há semanas.
Ela pareceu ficar em choque diante das minhas palavras. Por um segundo, aquele choque me pareceu algo próximo ao horror, mas não tive certeza. Ela dominou a emoção muito rapidamente.
— Nenhum de nós parece ter pensado direito para chegar até aqui — continuei, sem afastar o olhar do rosto dela — Por isso, vamos desfazer o que foi feito hoje e você ficará livre.
A nova emoção que surgiu no rosto dela, essa eu reconheci rapidamente.
Raiva.
— Está me mandando embora por causa da minha virgindade? —
Percebi quando ela cerrou os punhos delicados. — Sério Alfonso? Isso o afeta tanto assim?
Foi a minha vez de cerrar o punho sobre as teclas do piano.
— Deus do céu, isso devia ter afetado você, Anahi! — Levantei-me.
— A forma como eu a tratei até aqui não te diz nada? Eu fui um ogro com
você desde o início. Eu quis tanto usar seu corpo, do meu jeito e para o meu prazer, que a machuquei.
Any me olhou nos olhos.
— Você não me machucou, Alfonso. Eu era virgem! —Ela parecia exasperada — É claro que ia sangrar e doer. É impossível que não tenha
experiência nisso!
Ri sem qualquer humor.
— Eu nunca me envolvi com virgens, Angel. Apenas as mulheres experientes me agradam.
Aquilo pareceu um baque para ela. Pude ver perfeitamente em seu olhar
e senti-me um cretino ainda pior por feri-la.
E, no entanto, eu falava a verdade. Todos os meus relacionamentos casuais eram escolhidos a dedo. E eu sempre optava por mulheres
experientes, que não se assustassem facilmente. Mas, ainda assim, continha
boa parte de mim durante o ato sexual. Por medo, exatamente, daquela
brutalidade que habitava em mim e poderia ferir.
Claro que com Anahi aquilo tudo estava saindo do controle. E, naquele momento, eu estava pagando o preço.
— Não sou homem para você, Anahi — prossegui, firme — Eu nunca vou me casar. Não de verdade. Não desejo ter filhos e nem uma casa
com cercas brancas. Nada disso jamais vai me interessar.
E, sem dúvida, era isso que uma mulher de vinte cinco anos, que ainda guardava a virgindade, devia esperar. Ela devia sonhar com flores, chocolates e promessas que eu jamais me senti tentado a cumprir.
Any me olhava, aturdida, mas eu não me importei. Ela precisava compreender tudo o quanto antes. Para colocarmos um fim naquilo.
Dei alguns passos e parei diante dela.
— Portanto, se passou pela sua cabeça que eu fosse um alguém...
— Alguém especial? — Ela me interrompeu quase com um ataque. Em seguida, riu sem vontade. Então, surpreendentemente, passou por mim e caminhou até o piano. Em um único gole, bebeu o restante do uísque que estava no meu copo, batendo-o sobre a madeira depois. — Faça-me o favor,
Alfonso Herrera. Virgindade feminina não é uma espécie de prêmio para bons garotos, e eu queria me livrar da minha há muito tempo. Só não conseguia.
Meu olhar correu pelo corpo maravilhoso dela. Anahi era curvilínea.
Ela era macia nos lugares certos, e minhas mãos ficavam inquietas apenas ao
me imaginar tocando-a.
Não consegui acreditar, nem por um segundo, que não houvesse homens sonhando em tê-la naquele mesmo momento. Mas saber disso me deixou apenas mais irritado. E essa reação, por si só, já era um péssimo sinal.
As coisas entre mim e Anahi estavam acontecendo rápida e perigosamente. Eu precisava pisar no freio.
— De qualquer forma, eu me permiti perder o controle, mas isso acabou —emiti.
— E por acaso passou pela sua cabeça que talvez eu tenha gostado?
Franzi o cenho, sem entender. Ela bufou.
— Preciso dizer com todas as letras? Eu gostei da forma como me tratou na cama. Aqui e no hotel, Alfonso. — Ela me encarou sem medo. — Eu gosto que seja rude, selvagem. Que amarre as minhas mãos e possua meu corpo.
Minha ereção reagiu às palavras dela de imediato.
De repente, tive uma visão gloriosa dela curvada sobre o piano. Ou talvez em cima dele...
— Isso não importa. — Usei toda a minha concentração para afastar as imagens.
Anahi não sabia, mas suas palavras apenas pioravam as coisas. Elas estimulavam o meu lado mais sombrio e recluso.
— E se eu não quiser te dar o divórcio? — Ela me ameaçou de repente, de queixo erguido — Afinal, você me prometeu uma viagem para Londres.
Três meses, especificamente.
Esperei pela irritação que aquele tipo de atitude causava em mim.
Mulheres tentando me chantagear. Mas olhando para Anahi, enrolada no
meu robe preto, aquela postura indomável agiu como um afrodisíaco.
Em que tipo de merda você se meteu, Alfonso?
E ela parecia decidida, quando deu um passo em minha direção.
— Além disso, você me deve a honra de esclarecer a razão de tudo isso — Ela apontou para nós dois — Desse casamento de conveniência. Eu não vou me afastar enquanto não souber a razão de toda essa loucura.
Eu não tinha me esquecido da razão que me levara a tudo aquilo. Nem por um segundo. Mas tinha ignorado a parte de que começar tudo de novo, procurando outra esposa, não seria nada simples.
Além disso, eu não tinha pensado ainda em como um juiz enxergaria meu estado civil oscilatório. De solteiro para casado, em seguida, divorciado.
Tudo acontecendo em uma mesma semana.
Quase conseguia ouvir a voz repreensiva de Christian e o sorriso vitorioso de Tessa Perroni. Merda.
— É seu desejo continuar como minha esposa, Anahi? — inquiri com raiva.
Não dela. De mim mesmo. Tinha acabado naquela situação complicada
por não pensar com a cabeça de cima até ali.
Meu Deus! Anahi tinha me consumido até um ponto sem volta!
Ela pareceu se assustar, mas, mais uma vez, suas palavras me surpreenderam.
— Sim.
Eu podia estar preso em uma armadilha que criei para mim mesmo. Um devido castigo. Mas isso não significava que eu não poderia ditar as regras daquele jogo.
— Ótimo — respondi — Assim será.
— Alfonso, eu não quis te...
Anahi tentou me segurar, mas foi a minha vez de afastar-me dela.
Eu já tinha me deixado envolver demais por ela. E o que ela despertava em mim não seria bom para nenhum dos lados, a longo prazo. Nós
poderíamos ter tempo juntos pela frente, mas seríamos apenas um casal de aparências.
— Nosso voo para Londres sai amanhã bem cedo. Então esteja pronta antes das seis. Saberá tudo o que precisa no tempo certo. Pode ocupar o
mesmo quarto que usou para se arrumar mais cedo. Boa noite, Any.
E sem ousar olhar para trás, alcancei as escadas e me concentrei no que
teria pela frente: um calabouço construído por mim mesmo.
Esplêndido.