Capítulo 18

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A viagem foi curta, pararam poucas vezes apenas para conferir o perímetro. Ayla atravessou a maior parte da travessia, indo e vindo para lugares distintos. Azriel achava que assim poderiam despistar qualquer coisa que os seguisse. Poucos momentos voaram, desta vez não só ela estava tensa. 

A Corte Diurna ficava para trás não sem uma promessa de visita breve. Não estava longe de acontecer, os espiões tinham viagens diplomáticas para fazer adiadas por todas circunstâncias. Mesmo que Ayla sempre estivesse envolvida com a política da corte, ela agora estava afastada dos treinos das fêmeas illyrianas portanto agora aquele seria seu único trabalho na corte.

Ainda evitava falar sobre os treinos com Azriel, e desde o incidente não encontrou com os outros no comando da Corte, a não ser o Mestre Espião, ela deixou avisado na última vez que haviam falado sobre que era péssima em seguir ordens e que aquela não era uma que estava disposta a seguir. Provavelmente não iria, mas por hora escolheu esperar, Devlon havia colocado na mesa a relação de Ayla e Nestha com incidente. Por fim exigindo o afastamento delas, Rhysand dizia se encontrar em uma situação delicada por conta de todo conflito com os treinos das fêmeas. Ayla escutou tudo sobre a última reunião do acampamento com os olhos revirados, os direcionou palavras de baixo calão mesmo que só o encantador pudesse ouvir.

-Os direitos de treinar não é uma pauta da vida deles - foi o que Ayla disse naquele dia, antes de se levantar para arrumar suas coisas. 

A noite já havia caído quando chegaram, uma pequena cabana em madeira, duas cadeiras estavam encostadas na varanda em frente a um enorme lago de tonalidade azul esverdeado intenso. Se encontrava no noroeste da Corte era tudo que ela sabia sobre. Em meio às montanhas era como se a cabana estivesse dentro delas, um pouco de neve ainda jazia no topo das montanhas mas a sua volta a floresta respirava viva e em um verde intenso da estação que estava começando. Fechando os olhos por dois segundos, Ayla se certificou de todos os seres vivos que andavam por ali fosse em cima ou em baixo da terra, dentro ou fora d'água, poderia estar andando se arrastando ou nadando  ela sentiu. 

-Limpo, nada além de animais selvagens - Ayla abriu os olhos encontrando um mestre espião impressionado - Não haja como se isso fosse difícil.

-Não é? 

-Nem um pouco - deu de ombros.

O lugar era aconchegante mas pequeno para o padrão do círculo íntimo, e discreto, não chamava atenção o que tornava perfeito para ocasião. Subiram três escadas e se direcionaram à porta.  

-Não tem banheiro - Azriel disse casualmente entrando na casa abrindo espaço para que ela entrasse.

Era aconchegante, ela não se importava com o tamanho aquilo era muito comparado ao que teve grande parte da vida, uma sala que que aparentava ser o maior cômodo da casa continha decorações em um tom terroso harmonioso e neutro. O sofá e as poltronas nesse tom contrastavam com o cinza do carpete. Quadros pintados por mãos precisas dependuradas na parede eram as únicas cores mais vívidas do cômodo. Ao lado dividido apenas por uma bancada a cozinha tinha enormes janelas, que provavelmente permitia uma iluminação reluzente ao redor do dia, apesar de haver bancos ao lado da bancada uma pequena mesa terminava de preencher a cozinha.

-Gostei - Ayla comentou ignorante o aviso do mestre espião. 

O mestre espião seguiu seu tour em direção a uma das duas portas no pequeno corredor, era apenas um pequeno cômodo onde as incontáveis armas estavam guardadas, era tão pequeno que mal cabia uma cama. A outra, e última, porta levava ao quarto. Uma única cama enorme, cômoda, escrivaninha e janelas enormes como a da cozinha. A decoração era praticamente inexistente naquele cômodo, o branco da cama contrastava com a madeira do local. A luz amarelada trazia uma sensação de conforto.

-Apenas um quarto e uma cama mestre espião? - Ayla provocou com seu sorriso travesso.

Azriel sorriu sem graça passando a mão na nuca sem olhar direito. Ayla se divertia com a mudança dele, às vezes ele entrava em suas brincadeiras e às vezes ficava tímido. Era sempre um mistério saber qual seria, assim como tudo sobre ele. Meses investigando a corte noturna no período da guerra com Hybern, descobriu muito sobre o círculo íntimo por mais que dificuldades por ele, mas sobre o encantador suas informações sempre foram escassas. 

-Você fica aqui, eu vou dormir na sala - Azriel explicou.

Ayla se aproximou ficando apenas a um palmo de distância do mestre espião, suas sombras se revelaram tomando conta do cômodo, flutuando no ar dançando em meio a luz baixa. Aos olhos era apenas uma só mas a sensação ainda era individual para cada encantado. Ela sentiu as sombras de Azriel serpenteando ao redor de seu corpo, a levando a tomar um pequeno susto, ele havia cedido a suas provocações. O encantador ainda estava em pé a sua frente imóvel com os braços cruzados, mas ela sentia sua cintura ser apertada. Segurando seu sorriso, Ayla se manteve firme sem se mostrar abalada apesar do frio em sua barriga. 

-Suas asas são grandes demais pra conseguir dormir no sofá - Ayla comentou, mas ao falar asa o tom de provocação sumiu e a frase saiu seca.

O Mestre Espião deu um passo para trás e suas sombras se separaram. A nova e habitual raiva por sua própria espécie atingiu Azriel, enquanto ela se amaldiçoou por ter tocado no assunto mesmo que indiretamente. Mas a confusão da ambiguidade de sentimentos a atingiu, um alívio por aquilo ter sido interrompido antes que aquilo prosseguisse e uma parte de si gritando por continuação.

A luz refletiu em um metal acima da cama, chamando a atenção de ambos e quebrando o silêncio que secava suas gargantas.

-Trouxe a corrente que pediu - Azriel disse sem olhar - Suas coisas estão ali - apontou para a maleta do lado da cama - Treinamos um pouco após o sol nascer, estarei na sala se precisar. 

Seu agradecimento flutuou no ar em seu pequeno sussurro ignorado, ele havia virado e sai do antes que ela tivesse tempo, Azriel desde o dia que o contará parte da sua história mudava repentinamente ficando sério como se sentisse culpa. E isso a irritava profundamente, era a dor dela. 

Afundou na cama se debruçando para alcançar sua corrente, tirou de seu pescoço com cuidado o cordão de couro remendado, segurando como quem segura vidro fino ela retirou a pedra azulada com mesclar âmbar e a colocou de volta na corrente cobre. De volta em seu pescoço sentiu seu coração se aquecer e aquele vazio já conhecido dar pontadas em seu coração. 

Deitada segurando seu colar com força, ela adormeceu sentindo lágrimas mornas molhando seu rosto, resultados de memórias desbloqueadas que um dia achou já ter enterrado. Mas ainda estavam ali, e ainda dilacerava sua alma. 

Corte de Sombras e CicatrizesOnde histórias criam vida. Descubra agora