Capítulo 28

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Ayla 

O crepitar da fogueira era aconchego para suas noites, gostava de observar as faíscas que subiam e deixavam de existir rapidamente. Gostava de observar o quão pequenas eram, inofensivas, mas ainda poderiam causar um incêndio que destruísse toda floresta consumindo as folhas secas e se tornando tão grande e imponente que mesmo o verde seria consumido. 

Ali suas treinadoras pareciam inofensivas, entre conversas e sorrisos como aquelas faíscas inofensivas, mas eram chama viva. Ayla não se sentia chama viva, ela se sentia apenas como o fogo o qual não tinha nada de poético, era apenas perigoso e mortal. Tinha medo que sem suas treinadoras, todas elas, pudesse incendiar o mundo. 

A quatro dias foi-lhe avisado que Koe, Kheita e Arcane iriam embora, para um lugar Ayla não se lamentava por não ir, mas lamentava por não ter mais elas ao seu lado.

— Tem seu ego pra te fazer companhia — Arcane provocou — Além de sua mestra, Urfura.

Em qualquer outra ocasião, Ayala teria reagido com gargalhadas e provocações de volta, se gabando por ter vencido a fêmea ao seu lado na batalha de desempate. Mas não era o caso. 

— Dessa vez ouvi que não irão voltar tão cedo — Ayla comentou baixo olhando ainda para o fogo.

Arcane se aproximou desajeitada com a demonstração de afeto tão desconhecida tanto para ela quanto para Ayla. Se sentindo a uma distância que pudesse encostar seu braço no de Ayla, se acomodou acompanhando o olhar da mesma. Usará entregava um papel para Koe, ambas estavam sérias, pareciam discutir.

— O que elas sentem? — gostava de incentivar a encantadora de sombras usufruir de seus poderes empatas.

Rindo baixo e focando sua atenção no galho que rodopiava em sua mão cogitou ignorar a pergunta e não sentir os sentimentos de suas treinadoras e mestra. Mas uma dúvida crescia dentro dela e não conseguiu evitar, assim confirmou parte de sua própria preocupação.

—  Medo, discordância e preocupação — deu de ombros — Estão preocupadas, e sei que sou o motivo.

Arcane a encarou por longos segundos sem saber o que dizer a princípio.

— Ayla, você controla seus poderes! — Arcane chamou sua atenção para que a olhasse — É uma valkyria agora, não só uma mas a Valkyria das Sombras, responsável por cuidar de nós. 

Ayla sorriu sutilmente perdida nas palavras que queria dizer e na sua falta de jeito e costume de expressão gratidão.

— Vou sentir sua falta.

— Chega ser fofo quando não está agindo com um pouquinho de humildade — a provoca cutucando sua costela com o cotovelo.

Ambas odiavam abraços, aquela demonstração de afeto tão comum era estranha para elas. De um lado uma fêmea que havia sido ainda quando criança de seu mundo, está desabando em sangue e dor e caindo após isso em uma armadilha que lhe tiraria toda sanidade e razão para ser transformada em uma assassina. Do outro uma fêmea que cresceu com um fardo, o fardo de em um futuro se tornar a Líder Valkyria, título que viria com a perda de sua mãe e de sua mestra Keitha. Assim crescendo em meio a treinos mentais e de lutas intensivas que lhe afastam do sentido do afeto para forjar uma guerreira mortal. Uma lendária. Mas ainda assim elas se abraçaram naquela noite, não de forma desajeitada mas com força se agarrando a uma esperança de que tudo daria certo e tentando ignorar o sentimento que ambas carregavam de que algo ruim estava por vir 

Ayla odiava se sentir fraca ou vulnerável, mas a sua frente estava suas treinadoras. Naquele cômodo estavam todas aquelas a quem fez uma promessa, a qual se escondeu e fugiu. Aquela noite fez sua promessa como Valkyria das Sombras, mas após anos seu título já era similar a sua antiga vida, Assassina das Sombras. Havia desonrado um título, uma promessa, sua mestra e suas treinadoras. Tudo isso porque não conseguia lidar com o fardo do luto e da dor de sua mestra ter se esvaziado de vida em seus braços. Por sua culpa, tudo porque não consegue controlar seus poderes. 

Corte de Sombras e CicatrizesOnde histórias criam vida. Descubra agora