Perdido em desespero

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Estou sentindo meu corpo gelado. Não estava conseguindo enxergar. Estava tão escuro que não consegui ver a diferença dos meus olhos abertos ou fechados. Nos poucos minutos que recobrei a consciência estava entrando em desespero.

Me lembro de ter visto aquela criatura, e depois simplesmente não lembro do que aconteceu. Não consigo mover meu corpo. Tudo está doendo demais. A única coisa que estava conseguindo fazer era sentir as gotas da chuva que caia sobre meu rosto. Mas não conseguia enxerga-la.

Tudo desde os meus dedos dos pés até um fio de cabelo da minha cabeça estava doendo. Eu não conseguia ver, mas só sentir era o suficiente para entender onde eram as partes mais afetadas. Demorou um bocado de tempo até entender que eu havia caído da rodovia e estava sozinho. O desespero estava tomando conta de mim, pois eu não conseguia enxergar nada e não conseguia me mover para tentar ver. Me assustava a ideia de que eu estava cego.

"Não é possível! Não pode ser! Não eu, NÃO EU!!"

Estava começando a pensar desregulamente. Coisas aleatórias me vinham em mente enquanto eu e debatia e rangia de dor. Não demorou muito para que eu começasse a gritar e espernear de dor e desespero.

Ninguém iria me ouvir. Eu não era alguém que merecia ser salvo. Não era um bom irmão quem diria um bom filho. Desde que meu tio disse que o que as outras pessoas pensam, sentem e falam não importa, todos tem olhado para mim com olhos feios. Quando eu roubei um brinquedo da brinquedoteca da escola todos me trataram mal, mas, não tem problema né? Eu, eu estou fazendo isso por que eu quero. E quando fazemos isso está tudo bem, né?. Pelo menos era o que ele me dizia.

"Escute aqui pequeno, o que fazemos é por um bem muito maior. O nosso bem" - Eram as palavras que nunca saiam da minha mente antes deu tomar qualquer decisão. Aquele tempo que passei com ele foi o melhor. Eu podia fazer o que eu quisesse que ninguém reclamava. Mal ou bem eu estava me divertindo e isso é o que importa para mim. Que se dane as outras pessoas. Não preciso delas para continuar vivendo.

Devagar, após uma parcela de tempo fui me levantando e sentindo dores absurdas da região da costela. Um de meus braços estava muito dolorido também. Não conseguia falar e nem gritar mais. O frio estava afetando meus músculos e minha garganta de uma forma que mesmo se eu tentasse não conseguisse fazer com que minha voz saísse.

Eu estava encharcado e com muito frio. Ainda estava escuro, porem algumas nuvens saíram da frente dos raios de luz da lua por breves momentos. Minhas pupilas que já se haviam se dilatado o suficiente me permitiam enxergar ao menos minha mão. Isso foi simplesmente o melhor sentimento que tive naquele momento. Saber que não havia me tornado um estorvo para a sociedade era o melhor dos sentimentos.

Espera! Um estorvo pra sociedade? Mas, eu NÃO ME IMPORTO COM ELES!! Então porquê?

Caminhando devagar e mancando. Minha perna esquerda estava muito dolorida. Eu não conseguia caminhar por muito tempo. Mesmo assim eu precisava encontrar alguma coisa que me ajudasse a me aquecer. Estava muito escuro e eu não conseguia ter uma noção exata de onde eu estava andando. Após vários minutos seguindo em frente às cegas eu encontrei uma fresta na floresta.

"Ach- acho que chamam isso de clareira." - Pensei enquanto continuava a caminhar desesperadamente em direção a um único ponto de luz que meus olhos estavam enxergando. Com muita dificuldade consegui chegar no local. Não consegui segurar minhas lagrimas, finalmente achei um lugar onde havia luz. Isso me acalmou um pouco, mesmo assim minha situação ainda não havia melhorado. Eu não sabia o que fazer ainda. Achei luz, é um espaço aberto para o céu então se eles vierem atrás de mim vão me achar mais fácil.

Sim, por incrível que pareça eu pensava que alguém viria me ajudar.

Enquanto estava desesperado caminhando rumo a claridade eu torpecei em alguma coisa. Caindo miseravelmente em uma poça de lama machucando ainda mais meu corpo. Cansado, dolorido e desesperançoso me levanto devagar apoiando em algumas arvores pequenas que estava ao meu redor.

Continuei seguindo até chegar na clareira. Encarei uma grande arvore que havia ali e sem energias me assentei em uma das arvores grandes. Estava com frio, molhado e com fome, mas não havia nada que podia me aquecer naquela floresta densa e úmida. Enquanto encostado no tronco da arvore comecei a ter lembranças agradáveis e desagradáveis. Quando eu me machuquei e minha mãe cuidou de mim. Quando me perdi e meu pai correu por toda cidade para me achar novamente. Quando meu irmão quase se sacrificou para me salvar de um carro em alta velocidade para me livrar do atropelamento.

Memorias de quando eu roubei e me bateram por ter feito isso. Quando chutei animais na rua enquanto brincava com eles fui ignorado por todos os meus colegas de classe. A sociedade está do lado apenas das pessoas que convém a elas. Ou pelo menos era assim que meu tio havia me ensinado.

Mas, realmente está bem pensarmos em nós mesmos? Nós, nós não estamos sozinhos no mundo!

Uma a uma entrando em conflito com a outra. Boas ações geram boas consequências. Má ações geram más consequências. Mas afinal, o que é uma boa ação? O que é uma má ação? Se eu estiver fazendo algo para me agradar e não esteja agradando ninguém ao meu redor é uma má ação? Se eu estou me divertindo com isso é uma má ação? Eu não entendo, meu tio disse várias vezes, mas as palavras dela estão cravadas em minha mente me fazendo questionar todas estas coisas.

Após algumas horas pensando acabei fechando meus olhos. Tremendo e com fome simplesmente adormeci a luz da lua. A luz da lua já havia chegado ao seu ápice, e as gotas agora finas da chuva estavam escorrendo pelo meu rosto. Sobre essa luz eu estava descansando, devagar sendo subjugado cada vez mais por ela. Perdendo cada vez mais minhas forças vitais...

- VOCÊ NÃO VAI DORMIR AGORA GAROTO!! - Gritou uma voz feminina alta de um dos cantos da clareira.

Não mais estava controlando minha consciência, meus olhos já não me obedeciam. Aos poucos eu continuei a perder a consciência sem conseguir fazer nada a respeito.

"Então isso é morrer?" - Pensei enquanto sentia meu corpo escorregava pela casca da arvore aos poucos.

"Queria vê-la de novo, mãe"

"Me, me desculpe por ser um filho tão estupido e ignorante"

"E- eu não sei por que meus pensamentos estão tão bagunçados, não tenho forças nem para derramar nenhuma lagrima mais"

"Me perdoe mãe, eu te amo, mas acredito que não mereço o seu amor"

"Deus, me perdoe por ser uma criança mal-educada e tratar os nossos semelhantes com tanto desgosto"

"Se, se for possível Pai, me dê mais uma chance. Eu prometo que nunca mais serei da mesma forma, eu prometo que vou ajudar quem precisar. Eu prometo que serei uma pessoa boa. Por favor, me deixe ouvir a voz dela mais uma vez. A voz da minha mãe."

Após usar minhas ultimas energias para pensar, eu já não conseguia sentir mais nada, em poucos segundos eu simplesmente fiquei inconsciente à deriva em uma clareira embaixo da luz do luar ouvindo um sussurro em meu ouvido.

- Eu não vou deixa-lo morrer!

Z Vol.1Onde histórias criam vida. Descubra agora