Axel não sabia o que fazer, corria de um lado para o outro com panos e bacias de água. Elize tão pouco fazia ideia do que estava fazendo, enxugando o sangue negro que escorria pela costela de Dali, agora exposta. O garoto estava desmaiado de dor, branco como papel, suando e tremendo de febre. Axel não podia chamar nenhuma curandeira, e ao mesmo tempo, não sabia como usar a própria magia para ajudar o garoto. Estavam em um beco sem saída, porque assim que Brank chegasse, seria o fim deles. Axel tremeu ao pensar nisso, estendendo mais um pano para a irmã, que de dentro da jaula limpava o garoto.
Ele devia a vida àquele menino, que além de proteger sua irmã mais nova durante toda a sua vida, estava começando a fazer bem a sua outra irmã também. Axel sabia que Elize estava apaixonada, e no fundo de si mesmo que relutante, também sabia que não era por ela que aquele garoto estava apaixonado. Axel sentiu o poder debaixo daquele garoto assim que a caixa de ferro foi aberta pela primeira vez, ele soube que Dalibur havia sido pego de propósito. Para proteger Kafen, para que ela tivesse tempo de fugir. O príncipe seria eternamente grato à aquele menino, mas sua gratidão não duraria muito se Brank os pegasse ali. O que fariam então?
Era nítida a assinatura de magia de Brank ali, as marcas escuras gravadas na pele branca. Axel via aquilo, enxergava o túnel sem saída em que estavam enquanto sua irmã seguia esfregando o pano no garoto, soluçando, tentando ignorar. Eles precisavam fugir. Haviam passado anos negligenciando a ajuda que Kafen precisava, mas ainda não era tarde demais. Para se arrepender, e oferecer ao menos uma ajuda naquela batalha tão importante que agora sua irmã liderava. Axel entrou na caixa, que cabia pouco mais que uma agulha com os três ali, e segurou as mãos da irmã. Elize o encarou atônita, e tentou se soltar para continuar, mas Axel não deixou.
— Isso não vai resolver. Quando ele voltar vai fazer isso de novo, e de novo até que ele não resista mais.
As lágrimas secas no rosto de Elize foram substituídas por novas lágrimas, quentes e abundantes fazendo os olhos azuis brilharem.
— Precisamos fugir.
Axel não deu tempo para a irmã digerir a ideia quando se virou de costas, e tentou sem sucesso arrancar os grilhões do garoto. Sua magia não funcionava ali dentro, e a chave das manoplas e das correntes que prendiam os tornozelos estavam penduradas no pescoço de Brank. Não era uma opção.
Foi aí que Elize pulou para fora da caixa de uma vez, e sumiu pela porta. Segundos depois, voltou com um objeto longo de ferro, com uma ponta encurvada. Não foi surpresa para Axel, ela provavelmente já estava planejando aquela fuga. O príncipe pegou o objeto e começou pelos pés, os libertando dos anéis de ferro cheios de espinhos por dentro, que revelaram feridas assim que foram abertos. O estômago de Elize se revirou, mas ela não desviou os olhos quando Axel passou pela mão esquerda, e então para a direita. O garoto estava livre finalmente, mas e agora? Os dois sabiam que a última fuga só havia dado certo porque Brank permitiu.
Axel não se permitiu pensar nisso, apenas tirou o garoto da caixa e usou o próprio casaco para cobrir o garoto praticamente nu. As roupas em frangalhos seriam resolvidas, assim como a sujeira e o sangue assim que estivessem longe dali. E como fariam para encontrar Kafen? Ainda era um mistério, mas ele daria um jeito. Eles todos dariam um jeito.
— Vamos pelos túneis dos funcionários.
Axel declarou, tomando coragem para sair pelo corredor. Carregando o garoto nas costas, o príncipe abriu a porta e soltou uma respiração aliviada, quando viu o corredor vazio. Discretamente os irmãos se arrastaram pelo corredor escurecido, iluminado apenas por poucas tochas com um fogo fraco, a atmosfera preenchida pelas vozes dos guardas revoltados com seus postos. Foi fácil desviar dos primeiros, mas a única entrada que Axel conhecia para os corredores dos servos, era pela cozinha. De onde Brank sairia depois de uma caçada, após passar pelo corredor principal, o mais cheio...
— Espera.
Elize sussurrou não escuridão, usando a mão direita cheia de anéis finos de ouro para parar o irmão. Anéis estes que estavam manchados de sangue escuro.
— Conheço outra entrada. Pelo quarto da mamãe.
Axel não sabia o que era pior. Conforme andavam deixavam um pequeno rastro de sangue para quem quisesse ver, mas de alguma forma a noite escondia isso também. Os dois viraram a esquina oposta, e atravessaram o corredor vazio e sem portas que os levava até o quarto da matriarca. Mas assim que Elize estendeu o braço para abrir a porta, Axel que havia ficado para trás, deu um pulo quando a porta se abriu sozinha. Sozinha não, pela mãe deles.
O príncipe teve tempo de se esconder com o garoto, segurando um gemido de dor quando teve que pular com o peso nas costas, aquele garoto era mais alto do que parecia. A rainha sorriu para a filha, e inclinou a cabeça em uma pergunta silenciosa. Não era costume de nenhum deles bater à porta da mãe.
— Olá mamãe. Eu só queria... — Elize levou três segundos inteiros para pensar em uma boa desculpa. — Eu precisava entrar para os corredores dos funcionários.
Ela resolveu dizer a verdade no final. Era péssima mentirosa, então seria pior se fossem pegos ali. Axel tremeu atrás da estátua muito bem posicionada, sentindo seus joelhos cederem.
— Tudo bem filha. Só não toque em nada.
Foi a única coisa que a rainha disse antes de sair, deixando a porta aberta para a filha. Axel correu com o corpo nos ombros até o quarto da mãe, e apoiou o garoto finalmente em uma cadeira para respirar um pouco. Os dois se olharam, e esperaram alguns segundos antes de abrir a porta lateral do quarto imenso, e resolverem prosseguir. Eles tremiam, rezavam para deuses desconhecidos e torciam para que aquilo se acabasse logo. Elize apoiou as pernas de Dalibur em seus ombros enquanto Axel agarrou seu tronco, e assim os dois correram pelos corredores nada iluminados, úmidos mas vazios pelo horário.
Conforme se distanciavam do castelo pelo subterrâneo, Elize só conseguia se sentir... aliviada.
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O príncipe das sombras
FantasyDepois de tanto medo ter sofrido, Kafenia se cansa de depender dos outros para sua proteção. Ela segue seu destino até a ilha onde sua tia governa, mas agora com um novo objetivo: salvar Dali. Contra tudo e todos ela se fortalece, ignorando até os s...