Capítulo XIX – ArrependiTempo (Parte 4)
Sua sorte grande foi ter achado uma tubulação, caso contrário estaria condenada a assistir a queda quádrupla de água pra sempre.
A tinha achado numa pequena saleta onde guardavam produtos de limpeza - que, agora, imitavam uma pequena maquete de desastre químico no chão. Até podia ter um cheiro fortíssimo de creolina misturada com formol ali dentro, mas era melhor do que o aroma pútrido do lado de fora.
Uma vez dentro da tubulação, escondida atrás das estantes, fez o impossível para não acabar contraindo tétano dos parafusos soltos que via, mas, ao chegar numa bifurcação, tétano era o menor de seus problemas. Para qual caminho deveria seguir? Direita ou esquerda? E ainda tinha de achar o pirralho do Oliver, mas como é que o encontraria se nem conseguia se encontrar? Decidiu seguir para a esquerda, com o voto de minerva ecoando em sua mente assim como suas sinapses desfavoráveis a ele. Mikhaela acredita que, acima de tudo, aquele caminho só não podia lhe levar a um ninho de górgonas.
– Essas coisas malditas dominaram o subterrâneo. Um Mickey Mouse super-crescido, uma lagartixa desencapada e cobras elétricas. Não me surpreenderia se achasse górgonas por aqui. Elas adoram uma escuridão. – Disse pra si mesma enquanto engatinhava. Se por algum acaso achasse alguma, teria de ter uma desenvoltura fenomenal para tirar a shotgun das costas e encher o basculante com mais balas. Se caninos-veneno são frios e vorazes, górgonas são implacáveis. O ápice da estratégia quando o assunto é encurralar presas, e qual lugar seria o mais encurralado do que uma tubulação?
Tum! Tum!
Rangidos consumiram distâncias até Mikhaela. Mais alguém engatinhava por aquela mesma tubulação, tendo consciência ou não que ela também estava ali. Resolveu parar sua própria jornada e segurar a respiração. No escuro era mais fácil se esconder do que à luz do dia, certo? Por mais que tivesse uma lâmpada do seu lado, já tinha acabado com o gerador ambulante. Não era como se fosse acender...
Tric! A lâmpada começou a piscar, estalando nos intervalos escuros como se zombando do rosto boquiaberto de Mikhaela. Por um instante, sentiu sua sorte afundar junto da boss nas cataratas.
O som de metal continuava vindo de algum lugar atrás de si. Deveria começar a correr, mas isso adiantaria se fosse uma górgona? Quebrou o cano da shotgun para encaixar as balas, agradecendo a luminescência, não aos seus dedos suados.
Agradeceria por górgonas não caçarem em bando, seria um alívio uma dor de cabeça menor que matilhas de caninos-veneno, mas sabia muito bem que elas não precisavam disso.
Ao recarregar sua arma, virou seu corpo para apontar o cano o breu barulhento. Por algum motivo, as batidas aceleraram, aumentando o pânico de Mikhaela ainda mais. Precisava puxar o gatilho, mas quando? E se a górgona puxasse sua perna? Arrastou sua perna para perto de si, na esperança que isso fosse impossível. A luz do seu lado cegava de tão forte, como se aumentasse a medida que o mob se aproximasse. Com um raio de luz de mais ou menos cinco metros, uma mão pousou já na zona iluminada. Não parecia mão de mob.
– Pera, quê?
– E aí, Mikhaela! – Disse Oliver, antes de seu rosto retorcer ao olhar direto para a lâmpada – Ai! Ai! Que dor! Ahn? – Ignorando o fosfeno de seus olhos, o garoto percebeu Mikhaela apontando aquela arma gigante para si. – Que que é isso, hein? Tá querendo me matar?
– Eu querendo te matar?! Fedelho, porque você não disse que era você!? Eu podia ter te dado um tiro!
– Não é como se eu fosse morrer pra sempre, mas ficaria só com oito vidas pra ir pro espaço. – Notando o olhar arregalado de Mikhaela, ainda à espera de uma explicação, retrocedeu um pouco o ritmo. – Que Mob você conhece capaz de acender uma lâmpada?
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Pássaros Quebrados - Livro III - Estrada de Estrelas
Ciencia Ficción🥇VENCEDOR DO PROJETO BL -CATEGORIA LGBTQIA+ Oliver é apenas um adolescente de 17 anos fortemente vigiado pela mãe e com a sombra amarga de seu pai em sua vida. Quando um apocalipse repetino surge, todas suas expectativas para o futuro são comple...