XXI. O Salão das Coroas

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Kieran abriu os olhos para uma torrente de sensações que fizeram parecer que ele tinha caído rolando de um declive direto para o fundo de um penhasco. O corpo todo estava dolorido, como se tivesse levado uma enorme surra, a pele estava quente e a visão turva demorou a associar a iluminação bruxuleante no teto claro que estava encarando. Havia um cheiro de flores no ambiente e ele sentia como se o corpo todo estivesse esmagado debaixo de uma montanha.

– Pelos deuses... ou a noite ontem foi muito boa ou foi muito ruim, tch. – ele tentou se mover, mas parecia que o corpo todo estava grudado na cama. Por sinal, uma cama muitíssimo confortável.

– Você está acordado.

– Eu estou... estou? – Kieran piscou um par de vezes e virou o rosto de leve até Idris entrar em seu campo de visão. O regente estava sentado numa poltrona, em suas roupas leves de dormir, uma xícara fumegante em mãos que ele deixou de lado para se voltar para Kieran. – Idris? Eu voltei pro castelo?

– Sim, essa manhã, não se lembra?

– Bom... eu lembro de um sequestro, uma maluca com cinco mortos na agenda, e você tomando chá com uma adolescente, então... talvez eu ainda esteja delirando do veneno. – respondeu Kieran, respirando fundo e fechando os olhos de novo, sem se mover muito onde estava.

– Não sei quanto ao sequestro e a pessoa com mortos na agenda, mas a parte do chá está correta.

– Droga. Eu estava torcendo pra essa ter sido a pior alucinação. – Kieran suspirou. – Estava brincando com crianças enquanto eu estive fora, Idris? Sabe que isso não é muito legal.

– Está tentando me ofender?

– Você até estava sorrindo pra ela!

– Talvez você estivesse delirando um pouco.

Kieran olhou para o regente só pelo canto do olho, notando outro sorriso discreto nos lábios alheios e deu uma risada, gesto do qual ele se arrependeu logo, ao sentir a dor se espalhando pelo corpo inteiro.

– Volte a dormir, seu corpo ainda está se recuperando dos efeitos do veneno. – ele pegou a xícara de novo, mas sem tomar outro gole. – Seus ferimentos também foram limpos e tratados, vai estar melhor amanhã.

– Espere aí... – Kieran não fez muito esforço para se mover ou para olhar Idris de novo, rendido ao corpo pesado e quente. – Você ainda está me devendo... outra resposta.

– Você está planejando morrer essa noite?

Não está nos planos, mas vai que... – respondeu o ladrão, ainda sem abrir os olhos.

– Então estará vivo e plenamente consciente amanhã para ouvi-la.

A voz de Idris soou com alguma firmeza no começo, mas logo pareceu se distanciar cada vez mais até sumir. Kieran ainda pensou em dar uma resposta, mas os pensamentos sumiram junto com a voz do regente e ele se rendeu ao sono mais uma vez, agora, um pouco mais confortável já que não estava fazendo qualquer esforço com os músculos.

Ao acordar no dia seguinte – ou era o que Kieran estava calculando mentalmente, porque com a fome que estava, podia muito bem ter dormido uma semana inteira –, Kieran já estava virado de bruços na cama, o que significava que o corpo todo estava mais recomposto depois do dia e da noite bem doloridos. Ainda sentia os músculos tensos e dores desconfortáveis, principalmente dos ferimentos mais recentes, mas nada com o que já não estivesse acostumado. Era como se tivesse caído de uma torre muito alta numa tentativa frustrada de fuga, e aquela sensação ele conhecia bem.

Só quando ele se sentou foi que notou que estava no quarto de Idris, as roupas estavam trocadas por umas estranhamente claras e ele nem estava fedendo tanto quanto esperava. Na verdade, estava excepcionalmente limpo.

O Ladrão dos 13 Corações [Parte II]Onde histórias criam vida. Descubra agora