XXVII. A Carruagem Real

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Kieran esperava sair do Salão das Coroas e talvez andar um ou dois lances de escadas, descer até um compartimento secreto do castelo rodeado de todo tipo de proteção, mágica e mortal, onde a coroa de Seren estaria cuidadosamente preservada. Mas para a sua surpresa, nem no castelo ela estava. E nem em Zahi, pelo visto, porque Idris determinou que aguardariam até o fim da semana, quando Kieran estivesse devidamente recuperado para enfrentar a longa viagem para fora da capital, sem dar mais especificações de para onde iriam.

Ele tinha até requisitado dos criados uma carruagem para levá-los, junto com uma pequena comitiva de guardas reais que o acompanhavam só quando ele ia à guerra ou em viagens além das fronteiras, o que atiçou ainda mais a curiosidade do ladrão. Embora fosse decepcionante descobrir que o motivo da carruagem era para que ele não se esforçasse cavalgando e infeccionasse os ferimentos.

Os guardas, por outro lado, estavam ali porque eles iam mesmo viajar tão longe quanto uma das fronteiras do reino e só quando o fim de semana chegou foi que Kieran descobriu que iriam viajar até a fronteira leste, aparentemente, perto do reino da princesinha que tinha sido despachada alguns dias antes pela ousadia de certos comentários.

― Idris, nós vamos mesmo ver a coroa, ou você vai começar uma guerra por causa da princesinha? ― Kieran perguntou, enquanto passava o olhar sobre a pilha de papeis e mapas que Idris avaliava em cima da mesa da biblioteca.

― Eu não vou começar uma guerra. ― Idris sorriu brevemente, mas seguiu atento aos papeis na mesa. ― A princesa Lisellot veio em busca de um acordo de terras para recuperar o templo dos Manas. Vou aproveitar a nossa viagem e entregar os acordos.

― Ahh... então ela não veio mesmo pra tentar casar com você?

Idris levantou a atenção dos papeis, mas ele não olhou para Kieran, olhou para a porta que se abriu sem cerimônias para anunciar a chegada do conselheiro.

― Não, a sugestão foi do Radulf.

― Eu nunca duvidei. ― Kieran estreitou os olhos para o conselheiro que se aproximou com mais papeis para entregar a Idris. Ele passou direto pelo ladrão com um sorriso que certamente não significava coisa boa. ― Não vá achando que se livrou dessa.

Kieran só encarou Radulf para receber a resposta bem desenhada nos lábios dele com um "tente" que o fez lembrar da cena ousada ao invadir a reunião militar com a comandante de uma fronteira do norte e receber a mesma resposta. Ele não devolveu mais do que um sorriso convencido e um estreitar de olhos para o conselheiro.

― Saímos antes do meio-dia então? ― Kieran perguntou a Idris, que ergueu o olhar dos papéis e concordou com um aceno de cabeça. O ladrão ainda lançou um olhar breve para Radulf, que estava suficientemente concentrado nos documentos para se preocupar em notar. ― Vou deixar vocês resolverem os assuntos técnicos. O general está no castelo? Vou me distrair com ele enquanto isso.

Idris não demonstrou qualquer reação, enquanto Radulf, claro, só devolveu um olhar de reprovação que muito entreteve o ladrão antes dele sair de fato da sala. Claro que depois da declaração muito óbvia de que Radulf tinha sido responsável pela proposta de casamento arranjado, Kieran tinha que devolver à altura. Ele não tinha como se aproveitar muito do general, que conseguia ser até mais astuto do que o marido psicopata, mas tinha outra pessoa da família que era mais ingênua e podia atingir o conselheiro com mais eficácia.

Foi fácil ludibriar Dargan para fora do castelo de novo, especialmente porque o garoto estava muito empenhado em lhe explicar tudo que o pai Rad tinha falado sobre ser errado roubar e sobre como não gostava daquele apelido que Kieran tinha imaginado. O garoto dono da cabeleira ruiva inclusive parecia bem orgulhoso em servir de professor para Kieran no meio do caminho que os dois percorreram até a cidade. Ele só se distraiu de ser o seu professor de moral quando encontrou mais pessoas conhecidas dos pais na cidade e começou a interagir com muito mais gente, enquanto corria para lá e para cá, quase conseguindo se desvencilhar de Kieran, mesmo com todas as suas habilidades ladinas.

O Ladrão dos 13 Corações [Parte II]Onde histórias criam vida. Descubra agora