58. Em espera

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Severus não conseguia dormir. Ele não sabia se Hermione dormia em seu ombro, mas ela estava quieta.

O gorgolejo na garganta de Albus ecoava em seus ouvidos. As veias de seus olhos se dilatavam e se expandiam à medida que o veneno tomava conta dele.

Severus cruzou os braços com força sobre o estômago.

Ele não iria dormir. Não conseguiria.

— Devemos ir para a cama? — perguntou ela por volta da uma da manhã. Na verdade, ela teve que perguntar duas vezes. Ele não a ouviu na primeira vez.

— Vá. —₩ Ela não precisava sofrer aqui.

Hermione se levantou com dificuldade depois de ficar sentada no chão gelado por tanto tempo.

Ele estava muito aliviado por ela estar no castelo. Ele não conseguiria fazer isso com sua magia dividida. Sua cabeça bateu contra a escrivaninha.

A mancha em seu peito, a rachadura que ele havia feito com a Maldição da Morte - bem abaixo dela - era uma dor no estômago. Ele teria que escondê-la antes de enfrentar a Legilimência do Lord das Trevas novamente.

Hermione voltou, enrolada em seu roupão fofo e chinelos. Um edredom caiu sobre seus braços.

A dor se expandiu até estourar, a lava escura se espalhando por suas entranhas.

— Vá embora. — Ele não queria que ela fosse embora.

Hermione voltou ao seu lugar, mas com o cobertor enfiado embaixo dela e jogado sobre os dois. — Cale a boca.

A única luz que havia era a da lareira do outro cômodo.

— Quem será o diretor agora?

— Eu.

— Huh. — Eles se sentaram lado a lado, ambos olhando para frente. — Você quer mesmo ser diretor?

— Eu nunca quis estar aqui novamente. — Se havia um momento para ser honesto, era agora, ele supôs.

Severus esfregou as mãos no rosto até as bochechas arderem.

Eles retomaram o silêncio. A espera.

Dobby apareceu no centro da sala. Hermione tinha sua varinha apontada.

Severus não se incomodou.

A essa altura, a morte seria mais fácil. Ele supunha que era por isso que Albus escolheu essa opção.

Dobby segurou, sem dizer nada, um envelope lacrado com o selo do Ministério.

Severus o pegou.

Os olhos bulbosos de Dobby se voltaram para Hermione. Ele mordeu o lábio, torceu as mãos e desapareceu.

Severus rasgou a borda da carta.

As palavras não faziam sentido para ele. Ele ficou olhando para ela.

Hermione olhou por cima do ombro dele.

— Você estava certo — ela murmurou.

Ele deixou a carta cair no chão e colocou o rosto entre as mãos. Seus cotovelos se cravaram nos joelhos.

.

Hermione gentilmente tirou Severus de sua posição encurvada quando achou, com precisão, que ele havia caído no sono. Ela guiou a cabeça dele até seu ombro.

Ela duvidava que a ligação entre eles pudesse curar uma alma rachada.

Quando acordou, algumas horas depois, seu traseiro e a parte inferior das costas estavam dormentes. Severus tinha ido embora. Hermione foi ao banheiro e depois se deitou na cama.

Com base nos panfletos que tinha quando voltou, ele estava cuidando dos preparativos para o corpo de Dumbledore.

Eles não se falaram durante o resto do fim de semana.

.

O castelo estava silencioso quando Severus fechou a porta de seu escritório no domingo à noite. O segundo par de passos o seguiu até a torre do diretor. Potter havia deixado para Hermione a Capa da Invisibilidade para que ela pudesse escapar a qualquer momento.

Não havia ninguém nos corredores. Eles nem sequer viram fantasmas.

Severus não fez nenhum grande anúncio. Ele deixaria que o Profeta cuidasse disso.

As aulas foram canceladas pelo resto da semana. O funeral de Albus estava marcado para quarta-feira.

Como o laboratório e a sala de aula de Poções já estavam impecáveis, graças ao aprendiz da escola, Severus não se preocupou mais com eles. O que o preocupava era o fato de não conseguirem encontrar um substituto rapidamente.

Tudo o que pertencia a Hermione havia sido estrategicamente escondido entre as coisas de Severus, o pouco que ela trouxera consigo. Ela esperou embaixo da Capa da Invisibilidade de Potter por quase meia hora até que os elfos domésticos chegassem para levar os objetos de Severus para a torre.

Eles poderiam transformar a metade inferior da torre do diretor em um laboratório de poções - Severus teria que ver o que o Lorde das Trevas esperava dele em termos de entregas, agora.

A gárgula de pedra se afastou sem senha. Severus ficou de pé na escada giratória e sentiu Hermione na escada abaixo dele.

Ele agarrou a maçaneta do escritório assim que a escada parou.

A maçaneta girou.

E o escritório estava exatamente como ele o havia deixado. Os livros e as bugigangas de Albus ao longo das paredes. A penseira em seu próprio canto. Gotas de limão e antivenenos sobre a escrivaninha.

Ele havia banido os restos mortais de Bathilda antes de sair. A escola iria fechar o escritório até que um novo diretor fosse escolhido - então ele teve de apoiar a porta aberta com uma cadeira para garantir que o corpo de Albus seria cuidado.

Minerva não havia falado com ele desde a assembleia.

Nem ninguém além do coveiro e de Hermione.

Severus a conduziu pela outra porta no pequeno patamar.

Todos os móveis e livros já estavam lá, até as revistas Potions Weekly na mesa de centro.

Hermione tirou a capa dos ombros.

Tudo o que pertencia a Albus estava empacotado em uma série de caixas de papelão arrumadas na parede mais distante.

Cinco corujas bicavam em uma das janelas ornamentadas. Outra se juntou à briga.

— Vou sentir falta dessa característica de morar nas masmorras — disse ela. — As corujas não conseguem chegar até você lá embaixo.

Severus concordou quando mais de uma dúzia de corujas disputaram sua atenção ao longo do dia.

Hermione o evitava. Sempre que ele a via, do outro cômodo, ela olhava para um galeão e batia nele com a varinha. Severus a deixava em paz.

Ele tinha menos de um dia antes de ter de enfrentar a escola mais uma vez. Quando as corujas pararam, ele se concentrou em Ocluir-tudo. As roupas de Hermione misturadas às suas. Draco tremendo. A pele descartada de Bathilda Bagshot. Implorando para que Albus experimentasse o antiveneno no último minuto. Implorando para que Albus não fosse embora.

Ele se concentrou na raiva de Minerva. Na varinha de Walter em seu rosto. No clarão verde que atravessava o corpo de Albus. As coisas que o Lorde das Trevas gostaria de ver, mesmo quando as lembranças faziam o estômago de Severus se revirar.

Lives Intertwined | SevmioneOnde histórias criam vida. Descubra agora