61| O Filho do Mau

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NERO

A noite foi agitada para ela. Movendo-se de todos os jeitos e para todos os lados. Murmurando palavras sem nexo, ela gemia e outras vezes chorava. Eu estava ao seu lado o tempo todo. Mesmo depois de tudo que passamos e da promessa que fiz para mim mesmo de que nunca mais iria vê-la, ela sempre seria minha prioridade número um. Contorcendo-se sobre o colchão, ela caia no abismo profundo que eram seus sonhos. Ela estava perdida dentro de si mesma, e carregava consigo a sombra do dia. Algumas vezes tentei mantê-la em meus baços, mas sua inquietação acabava afastando-a de mim. Aquilo estava me deixando nervoso, Lili sempre dormia tranquilamente até o amanhecer. Lembrei que só faziam dois dias desde o nosso primeiro encontro após dois anos, muitas coisas podem acontecer durante um tempo desses. Joguei o edredom sobre ela e fui até a janela. O cheiro de sangue estava próximo.

Durante o tempo que passei com Kaya, nunca havia necessitado de outras pessoas para me alimentar, mas a volta de Lili me trazia desejos adormecidos. Ela era o que me acalmava, mas também o que mais me destruía. Era como uma droga, você usa e sente-se bem, mas ela te destrói aos poucos. Olhei mais uma vez para as duas garotas que dormiam naquele quarto. Os sonhos de Lili pareciam estar mais calmos, ela já respirava tranquilamente. Pulei janela a fora e caminhei a passos rápidos até onde o rastro de sangue estava mais forte. Meus batimentos estavam acelerados. Minha boca já salivava ao imaginar. Comecei a correr mais depressa, o cheiro havia me levado para uma pequena casa mais isolada do povoado. Olhei atentamente para o local, nunca havia visto aquela casa antes. Parecia abandonada, a não ser por uma pequena luz que bruxuleava sobre uma cortina de couro de lobo.

A presença de alguém muito próximo me sobressaltou. Olhei atentamente ao redor, tentando detectar de onde emanava aquele calor próximo. Imaginei ser da pessoa que estava na casa, mas o cheiro estava muito próximo. Familiar, sangue azedo e levemente adocicado. Meu coração palpitou. A saudade de repente me varreu para longe dali. Eu sabia quem era, mesmo que ainda achasse impossível. Corri em direção oposta da casa, dando a minha vítima mais um tempo de vida. O vento levemente frio já anunciava o fim do inverno, mas em Tauros nunca ficaria totalmente quente, pois os ventos congelantes de Blizzard chegavam sem piedade a todo instante. Comecei a ficar mais quente à medida da aproximação, e vislumbrei sua silhueta. Pulei nas costas de Billy, fazendo-o se assustar e dar um soco enquanto eu ficava em cima dele, tentando segurar seus braços agitados.

- Billy. Seu puto! – gargalhei quando ele parou abruptamente ao me reconhecer. – Senti o cheiro de seu sangue azedo de longe!

- Nero! Você... quanto tempo! Eu estava indo te encontrar, mas vejo que você me achou primeiro – ele carregava uma expressão mais velha, barba acastanhada rala, mas manteve a mesma intensidade de azul em seus olhos. – Você é difícil de encontrar.

- O que houve? Por que sumiu daquela maneira? Me deixou sozinho...

- Fiquei louco...

- Mas você já é louco.

- NÃO! – ele cuspiu quando falou, ganhando rubor. – VOCÊ QUE É!

- Muito bem. Tá afim de fazer algo divertido?

- Não quero marcar um encontro com você como duas garotinhas...

- Não falo disso – grunhi. – O que aconteceu com você? Passou quanto tempo sem matar?

- Cinco meses, e você?

- Dois anos e meio. Mas agora, minha Fera está acordando, eu sinto isso – senti a garganta ficar seca. Billy me olhava com descrença.

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