Sentimento reprimido

6 1 0
                                    

Daphne

Vazia.
Era assim que eu me sentia desde que descobri que Jordan ia ser pai e que eu escolhi ir embora. Acho que por isso me mudei tanto. Morro Bay, Japão, Itália, Nova York e agora Los Angeles. Em todos os lugares que eu ia, parecia que não pertencia. Era um sentimento opressor e por isso eu estava em constante mudança.
Acho que por isso tive tantos namorados também, para tentar cobrir o buraco que Jordan deixou em meu peito. Ocupar o vazio, preencher. Nos onze anos, tive sete namorados. Leon, Hector, Louis, Nate, Nicholas, John, e Ferdinand. O último e com quem ainda estou é Carter. Ele é executivo em uma empresa de comunicações. Contrariando todas as expectativas, Carter é o que mais preencheu o buraco em meu peito. Acho que por isso aceitei me casar com ele.
Falando em casamentos, nem acredito que enfim Emma e Ben irão casar. Doze anos de namoro já. Claro que minha amiga queria acabar a escola e a faculdade antes de se casar. Ela se formou em Biologia Marinha e mora com Ben no centro de Ellsworth, em um apartamento bem amplo que irão morar depois de casados. Acho que é mais para oficializar.
Eu morava no centro de Los Angeles, em um apartamentos bem moderno e equipado. Sozinha. É bem perto da universidade e do laboratório onde trabalho. Carter é irmão de uma de minhas ex alunas do curso de Bioquímica, Lois Lane. Foi assim que nos conhecemos. Em um dia que ele foi buscar a irmã depois da aula. Coincidentemente era minha aula. Depois nos tornamos amigos, namorados e enfim, noivos.
Devido ser férias na faculdade, foi bem fácil eu aceitar o pedido de ser madrinha. Só tive que pedir um afastamento do laboratório, mas, como em sete anos eu nunca havia pedido férias, me cederam dois meses.
Estava em Ellsworth fazia quase uma semana quando soube que Jordan estava chegando aquela tarde. Claro que eu sabia que ele seria o padrinho de casamento do Ben, mas, estar na mesma cidade que ele depois de tantos anos, me causava sensações que eu queria e que não sentia a mais de uma década.
Eu sempre soube tudo o que tinha a ver com Jordan. Ele foi obrigado a ser pai muito cedo. Quando Tessa morreu, ele se viu com um filho recém-nascido e sem chão. Soube que ele mudou para a Espanha e depois para a Inglaterra. A Inglaterra fazia bem o estilo do atual Jordan. Sério. Maduro. Pai.
Quando descobri que ele havia largado a natação e depois a equipe de futebol americano, quis voltar e dar uma surra nele. O futebol era o sonho da vida dele e a natação era o costume da família. Mas, vi que não cabia a mim fazer isso. O filho de Jordan, Ethan, era a cara dele. Eu via foto dos dois nas redes sociais. Entrava quase todo dia para ver as atualizações. O que eu não entendia era porque ele nunca apareceu com mulher nenhuma.
Jordan é o cara mais lindo do mundo. E olha que o Carter não fica para trás. Carter tem os olhos azuis e o cabelo loiro escuro. Mas, falta nele o calor de Jordan, a emoção. Carter é sério, pontual. Não que Jordan não seja. Mas, ele tem um vigor, que o faz ser visto mesmo em uma multidão. E pelo jeito, Ethan estava indo no mesmo caminho. Sorte que ele não puxou nada a mãe. Não é só porque ela morreu que eu iria passar a gostar dela.
Odeio isso nas pessoas. Quando alguém morre, parece que tudo que a pessoa fez em vida é esquecido. Comigo não. Por isso, parabenizo Ethan por ser igual ao pai.
Estava pensando tudo isso enquanto tomava banho. Saio, me seco e vou procurar alguma roupa confortável. Visto uma calça jeans, uma blusa de seda rosa e scarpin cor de rosa. Arrumo o cabelo em um rabo de cavalo alto e passo perfume. Meu pai me contou que amanhã Jordan fará uma palestra na Universidade de Ellsworth, não perco isso por nada nesse mundo.
Eu não tinha esperanças de voltar com Jordan, até porque estou com Carter. Mas, só queria ver como ele estava. Respiro fundo e saio do quarto com minha bolsa na mão.
- Vai sair? - minha mãe pergunta saindo da cozinha.
- Sim. Vou me encontrar com Jean e Maggie. - conto me referindo as duas amigas que estão de volta a cidade. Elas atualmente moram na Austrália, mas, vieram passar um tempo na casa dos pais.
- Tudo bem. Cuidado. - ela fala me entregando as chaves do seu carro. Dou um beijo em seu rosto e saio para fora.
Depois de dez minutos, estaciono em frente ao restaurante onde vamos jantar. Entro e as encontro rindo, cada uma com uma taça de champanhe na mão.
- Oi, meninas. - as cumprimento me sentando em uma cadeira.
- Olá, doutora Saito. - Maggie me cumprimenta e ri.
- Olá, Daphne. Liga para essa boba não. Ela já bebeu champanhe demais. - Jean diz tirando a taça da mão da irmã e substituindo por um copo com água.
- Ah! Mas, a Daphne é doutora mesmo. - Maggie fala com um bico.
- Verdade. Enfim, me contem as novidades. - peço rindo delas.
Enquanto Maggie me conta que está noiva de australiano chamado Zack, Jean me contou que está focada nos estudos dela. Ela está acabando o doutorado em relações internacionais.
Estou estendendo a mão para pegar minha taça quando escuto risadas vindo da porta. Me viro em minha cadeira e vejo quatro pessoas parada na entrada. Duas crianças e dois adultos. O rapaz que estava mais perto da porta era loiro e tinha os olhos claros, a garotinha que ele segurava pela mão era igual a ele. Ou era sua filha ou irmã. Chutava que filha. A outra dupla era a que mais chamava a atenção. Pelo menos, a minha. Jordan estava parado ao lado de seu filho, Ethan. Os dois eram iguaizinhos. Ainda mais lindos pessoalmente do que por fotos. Os quatro estavam rindo de Jordan que havia batido a cabeça na porta.
- Eita porra! - Maggie exclama.
- Concordo! Quer ir embora? - Jean pergunta séria cobrindo sua mão com a minha sobre a mesa.
- Não. Tudo bem. - digo virando minha taça de champanhe e bebendo todo o líquido. Pego a garrafa e despejo mais um pouco em minha taça.
- Vai com calma. - Jean pede pegando a taça da minha mão e colocando um copo com água.
- Tá bom. Vou dirigir depois mesmo. - digo com um suspiro e bebo um gole de água.
Chamamos o garçom e pedimos nossos pratos, enquanto Jordan e outros três se sentam a três mesas de distância de nós.
Jordan se senta ao lado do filho e passam a olhar o cardápio juntos. Escuto a garotinha chamando o homem loiro de père, pai em francês. Foi então que um estalo me fez entender tudo. Jordan morava em Londres, e de Londres até a França são algumas horas de trem, apenas. O homem e sua filha deveriam ser da França e vieram para o casamento de Emma.
O garçom nos serve e vai atender a mesa de Jordan. Desvio o foco e tento prestar atenção as minhas amigas. Dou tanta risada com elas que solto um ronco pelo nariz, o que nos faz rir ainda mais. Chamando a atenção de Jordan.
Quando ele olha e percebe que sou eu, seus olhos ficam verde escuro. Ele toma um gole do suco e comenta algo com o homem loiro, que olha para mim e depois coloca a mão no ombro de Jordan, que balança a cabeça e levanta da mesa, indo em direção ao banheiro.  Peço licença às meninas, e vou ao banheiro. Entro, lavo as mãos e passo água no pescoço. Ver o olhar de Jordan sobre mim me fez ter calor e medo. Medo dele ter seguido em frente sem mim. Assim como eu fiz.
Egoísta!
Uma vozinha no fundo da minha mente falou.
Me recrimino e saio do banheiro. Trombando em Jordan que estava passando. Vou negar não. Esse foi meu plano desde o início.
- Oi. - digo olhando para os olhos dele.
- Daphne? - ele pergunta sério.
- Sim. - respondo calmamente, sem demonstrar sentimentos.
- Não havia te reconhecido. Soube que vai ser a madrinha da Emma. - ele falou frio.
- É. Vou ser. - respondo torcendo as mãos, o que faz ele olhar para mim.
- Noiva? - ele pergunta olhando para meu anel.
- Sim. Vou me casar. Ele se chama Carter. Vai chegar na semana que vem. - digo e me xingo mentalmente por ter deixado ele ver o anel.
- Parabéns. - ele fala.
- Obrigada. Hmmm. Eu vi seu filho. Ele se parece muito com você. - digo e vejo os olhos de Jordan mudar para um tom de verde mais claro, mais puro.
- Sim. Ethan é bastante parecido comigo. Principalmente quando alguém que amamos está machucado. Ele é meu tudo. Daria minha vida por ele. - Jordan fala e sinto um calor subindo por minha coluna.
- Isso é bom. - consigo dizer. Não conto a Jordan que toda vez que eu penso em ter filhos, é com ele que imagino. Seria estranho demais. Ainda mais agora que estou noiva de outro homem.
- Bom, foi bom ter ver. Até mais, Daphne. - ele se despede casualmente e volta para a mesa onde está seu filho e seus amigos. Respiro fundo e grito por dentro. Caminho de volta para a mesa e depois de um delicioso brownie, vou embora para casa. Bom, a casa dos meus pais. Paro no caminho em uma mercearia e compro algumas bebidas.
Chego em casa e subo silenciosamente para meu quarto. Tranco a porta e tiro os sapatos, deixando ao lado da porta. Abro uma garrafa de cerveja e sento na cama. Dou um gole e as lágrimas escorrem. Lágrimas de decepção, raiva, vergonha, desespero, amor, humilhação e indiferença. Jordan me fez sentir tudo isso nesses onze anos. Vê-lo hoje acionou tudo que eu tentava manter escondido até de mim. Acabo a primeira garrafa e pego outra.
Respiro fundo e caminho até a janela. Quando eu fui embora, eu amava Jordan mais do que tudo no mundo. Me xinguei diversas vezes por ter deixado ele para trás. E agora, quando ele me trata apenas como uma conhecida, me sinto a pessoa mais inútil do mundo.
Não sei se ainda o amo, só sei que sinto algo, mas, não sei também se é algo bom. Respiro fundo e sento na varanda em companhia das cervejas que comprei, e as lágrimas que deixo escorrer livremente.

Oi meus amores,
Tudo bem? Espero que gostem do capítulo.
Beijos,
Jeice Dias.

ForeverOnde histórias criam vida. Descubra agora