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Havia uma coisa boa a respeito de bailes fantasia que Malévola adorava: quando eles aconteciam, as pessoas podiam ser elas mesmas. Não havia julgamentos, pois as máscaras protegiam e escondiam as identidades. Estar mascarado era estar livre; e por isso, a trevosa aprontara-se da melhor maneira possível.

Seus belos olhos esverdeados, por mais brilhantes que fossem, ocultavam-se nas sombras de seu disfarce, e os seus chifres poderiam ser facilmente comparados a um adereço da fantasia. Malévola não tinha do que se envergonhar. Ela poderia ser quem quisesse naquela noite; e ela sabia quem queria ser.

Ela queria ser apenas a mãe e madrinha de Aurora. A Malévola que despertou a princesa adormecida com o seu amor verdadeiro e puro em seu mais profundo arrependimento. Naquela noite, Malévola queria esquecer que um dia fora má, mesmo que todos a sua volta não cogitassem que isso fosse possível. Ela abraçaria o seu melhor lado.

Seria perfeito. Tinha que ser.

Enquanto terminava de fechar o vestido, a mulher tentou encarar o seu reflexo na água, porém a escuridão dos céus não a permitiram. Seu lado vaidoso a fez invocar uma pequena centelha mágica com uma das mãos e criar uma imagem de si mesma na superfície. Faíscas douradas voaram pelo espaço, formando um círculo que em poucos segundos, transformou-se em um belo espelho.

Até que ela não havia ficado mal. Seu vestido, negro como de costume, brilhava como a luz das estrelas, as mangas longas e rendadas cobrindo toda a superfície de seus braços, mas ainda revelando a pele pálida; a máscara, também da mesma cor, encaixava-se perfeitamente contra seu rosto, dando-lhe um ar de mistério ainda maior do que o seu rotineiro, apenas sua boca avermelhada e uma pequena parte de seu nariz a mostra. Escondiam perfeitamente o que precisava ser escondido.

Malévola estava quase irreconhecível; e ela gostava do que via.

Desmanchando o espelho de chamas que criara, a trevosa apanhou o cajado que encostara em uma das árvores próximas e suspirou. Estava na hora —mais do que na hora —dela partir. As outras fadas já haviam ido na frente, e com certeza Aurora, que Malévola conhecia extremamente bem — já devia estar pensando no pior a respeito de sua madrinha.

Em uma última olhada para a floresta, Malévola não evitou tremer por dentro, e hesitar a possibilidade de comparecer ao baile. Ela pensara e repensara a respeito durante toda a semana que antecedera o evento, pois no fundo, ainda temia se unir com humanos. Ela sabia do que eles eram capazes, assim como sabia que não existia acordo nenhum nesse mundo que os fizesse olhá-la com bons olhos.

E eles armazenavam ferro. Tinham milhares de amostras dele. Ulstead era um lugar que Malévola não fazia questão de estar.

Remexendo a cabeça, a mulher afastou o pensamento. Ela precisava fazer isso, por Aurora. A garota ficaria muito chateada se sua fada madrinha não comparecesse, quer fosse para dar um olá ou quem sabe comer e bater um pequeno papo.

E era um baile fantasia. Ela estaria segura. Nada poderia dar errado no fim das contas.

Malévola então abriu seu par de asas grandiosas, preparando-se para alçar voo. Como doera a época em que ela tivera de estar longe daquelas que a levavam para as alturas, como doera o momento que a mulher as procurou e tudo que encontrou foi apenas uma aberta cicatriz. Asas fantasmagóricas batendo em suas costas a perturbaram por meses depois do acontecido, e ela passou noites sem dormir porque a dor era intensa demais para suportar.

Agora, ela tinha suas asas de volta; sua bondade de volta. E não deixaria mais que nenhuma delas se fosse outra vez.

Os ventos gélidos da noite fria batiam em seu rosto e assanhavam seus cabelos castanhos. Os céus enfeitavam-se de fadinhas coloridas voando de um lado para o outro como vagalumes, trazendo mais luz para a escuridão noturna. Aos poucos, na medida que Malévola saía dos Moors, essa visão mágica se desmanchava, dando lugar a sem graça paisagem de Ulstead e suas construções, rodeadas de tochas acesas para iluminar as estradas.

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