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O castelo de Ulstead era de longe uma das construções humanas mais belas que Diaval já vira. Antes de conhecer Malévola, ele se acostumara a visitar as cidades para forrar seu estômago com pequenos grãos e migalhas de comida que caíam pelas ruas.

Ao menos ele não estava roubando quando fazia isso; só que nem sempre a catação de migalhinhas dava muito proveito, então Diaval acabava voltando para as plantações de milho dos fazendeiros que o odiavam, pois ao menos nelas, havia fartura que o saciava por dias.

Ulstead fora uma cidade em que o corvo humano estivera pouquíssimas vezes nessa época. As pessoas de lá não eram lá muito chegadas a corvos, pombos ou outras aves, enxotando-as sempre que possível. 

Aurora o pedira para ficar mais um pouco em Ulstead na noite do baile. Ela até reservou um quarto para ele, afirmando que talvez isso o ajudasse a colocar seus pensamentos em ordem. Se fosse como corvo, ninguém o aceitaria ali —mas como humano, pelo visto, não havia problema algum.

Aquilo era engraçado.

Diaval rejeitou a proposta da princesa de primeira, porém acabou repensando a ideia após a irritante insistência dela. Ele não teria mesmo onde ficar nos Moors, já que sua caverna havia desabado  e os outros lugares estavam cheios de fadinhas que o encaravam com indiferença e aborrecimento, deixando claro que ele não era mais bem vindo como antes na floresta encantada. Culpavam-no pela quase morte de Malévola.

Todas as criaturas lá —pelo menos na imaginação do homem ave — torciam para que a trevosa logo se recuperasse e transformasse-o em corvo outra vez, decretando sua expulsão definitiva. Ela mesma havia prometido fazer isso. 

Só que ela não conseguira ainda. 

Passaram-se sete dias após seu acidente e Malévola tentara mudar a forma de Diaval durante todos eles. Nada acontecera. Ela apenas ficava mais fraca. O boato de que sua magia estava dissipando se espalhara com velocidade. Como e quem dissera isso, ninguém sabia.

Diaval olhava para o teto, deitando em seu colchão macio, as mãos repousando em sua barriga. Ele tinha mesmo muito o que pensar, a começar por suas atitudes. Desde que Malévola o dissera que ele era livre, o homem percebera que não queria ser livre. Não dela. Ele já não acreditava que estar ao lado da trevosa fosse uma prisão.

Mas então, ela o deixou —e o deixou como humano. Ele se enganou, esperando-a voltar e dizer que ainda precisava dele ao seu lado, que ainda o queria. Ela nunca voltou. Ocupara-se com as trevosas e esquecera-se da única criatura que nunca duvidara dela. Até mesmo Aurora duvidara uma vez. Diaval não. 

E ele não entendia o porquê ela simplesmente não levara tudo isso em consideração. 

Arabela, todas as vezes que se encontrava com Diaval, fazia de tudo para vê-lo esboçar um sorriso. Ela não o conhecia a muito tempo, mas gostava dele. Gostava de verdade, desde a primeira vez que o vira, no jantar de Ingrith, em sua natural forma felina.

Ela era uma boa garota  —apesar de não ser uma boa gata. Diaval culpava-se por não ter a tratado como ela merecia. Ele nunca fora capaz de amá-la como amava Malévola. Ele nunca a vira como uma amiga e companheira. 

Malévola lhe entregara Arabela para que ela preenchesse o vazio que a própria Malévola futuramente iria deixar. O problema é que ninguém era substituível.

—Pensando na vida, rapaz? —alguém adentrou o seu quarto, fazendo-o dar um pulo da cama. Era um guarda. Na verdade, dois. 

—Fiz algo de errado? —Diaval apressou-se a perguntar. Não era normal dois guardas aparecerem no quarto de alguém com intenções boas no coração.

DesfechoOnde histórias criam vida. Descubra agora