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Dias atuais...

Malévola desistira de tentar dormir. Ela não poderia simplesmente ficar em paz depois de tudo o que acontecera. Aurora tinha sido amaldiçoada por suas mãos novamente. Não fazia sentido, mas também, que outra explicação seria lógica?

Ela era a única que estava ao lado da princesa quando a mesma foi atingida. Ela que a segurou nos braços enquanto a garota caía e a inconsciência abatia sua face. A magia que se espalhou no ar era sua. Aquela era a dura verdade que Malévola precisava aceitar.

Os seus poderes estavam fora de controle, esvaíam-se de suas mãos. Ao passo que os dias passavam, ela se sentia mais fraca, e depois do ocorrido com Aurora, o quadro ficou ainda pior. Ao longe, ela via a sombra de Ulstead e o castelo. O número de guardas dispostos nas torres altas do palácio e também ao redor da cidade haviam aumentado tanto que Malévola podia enxergá-los de longe. 

Eles estavam prontos para capturá-la. E ela estava pronta para correr o risco cedo ou tarde, pois não aguentaria muito tempo sem notícias de Aurora. Ela não se importava se a matassem, desde que soubesse que sua filha ficara bem —desde que conseguisse quebrar o feitiço.

Malévola lembrou do jantar de Ingrith, quando sua magia explodiu por toda a sala após a sua paciência chegar ao limite. Ela sabia o que estava —e não estava —causando. Conseguia sentir o poder que liberava, e o que ele atingia. Em momento algum o rei John fora seu alvo; e por isso, doeu demais quando seus ouvidos escutaram Aurora implorando-a que o acordasse. Doeu quando chegou a hora de ir para casa e Aurora decidiu não acompanhá-la, desacreditar dela. 

Por uma coisa que ela tinha certeza não ter feito.

O problema era que agora, Malévola já não tinha certeza de nada. A sua magia parecia não ser mais sua. Naquela noite, no baile fantasia, a mulher não reconhecera o que fizera. A grande fumaça esverdeada que encobriu os céus e ao redor dela não lhe era familiar. Ela não invocara aquilo. Seria então algo feito sem o seu consentimento? Poderia seu corpo agir sem que a sua mente houvesse dado algum sinal?

Ela encarou as estrelas. O brilho delas parecia mais fraco. Se era porque os seus olhos estavam marejados de lágrimas e a impediam de enxergar direito ou porque o céu estava com mais nuvens naquela noite, ela não sabia dizer. 

A mulher se retraiu, sentada no chão do penhasco, abraçando as pernas e encolhendo as asas. Quando pequena, ela gostava daquele lugar porque podia ver toda a extensão dos Moors e admirar a beleza deles de uma vez só. Ao crescer, ela começou a apreciar estar ali porque aprendeu a ser solitária.

Estendeu as mãos na frente do corpo e as encarou. Pareciam as de sempre, magras, frias, e possuidoras de uma força que nenhuma outra trevosa sequer poderia imaginar ser capaz de ter. Malévola tinha a vida e a morte em suas mãos, o bem e o mal. Ela fora escolhida pela Fênix para carregar dentro de si todo o poder da espécie. 

"Você é a última dos seus descendentes. O poder dela é seu." dissera Connal da primeira vez que Malévola descobrira o seu povo, exilado e amedrontado pelas autoridades humanas. Malévola nunca entenderia como apenas ela sobrara nos Moors, por que as outras trevosas sumiram e ela não. Por tantos anos de sua vida, ela imaginou ser única —e excêntrica. Tudo mudara.

Só que Malévola não queria mais aquele poder. Não se isso custasse a vida ou felicidade dos que amava. Estava perdendo o controle —coisa que jamais pensou ser possível acontecer. Não fazia ideia da razão. Já não era capaz de transformar Diaval e deixá-lo ir embora em busca de sua vida, e também amaldiçoara Aurora. Poderia ficar pior?

Tanta raiva, angústia e remorso a consumia. Ela tinha vontade de bater em si mesma. Ela se odiava. Era patética.

Malévola pegou uma pedra do tamanho da sua palma e, com ira, atirou-a para o lado. 

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