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—O que você está fazendo aqui sozinha? —Aurora prosseguiu ao passo que se aproximava mais e mais da trevosa. Com agilidade, Malévola recolocou a máscara que segurava em sua face, e ficou de pé. 

Espraguejou baixinho várias vezes por ter sido tola o bastante a ponto de não considerar a possibilidade de que Aurora poderia aparecer duma vez, e se ela a visse sem a fantasia, seria trágico.

O ferimento ainda estava lá, em seu rosto, e apenas a máscara o encobria. "Que burrice" pensou a mulher com seus botões.

—Oi. —respondeu ela, meio desinteressada, ocupada demais encaixando a fantasia em sua face. Aurora embalou as mãos, e frisou os lábios rosados, examinando sua madrinha com atenção. —Está aí a muito tempo? 

—Não. Quer dizer, eu te procurei por toda a parte no salão, mas ninguém te viu. Pensei até que...até que você não viesse. —Aurora deu de ombros, uma curta distância a separando de Malévola agora. —Só que aí me lembrei que isso é uma festa fantasia, e ninguém vê ninguém em uma festa fantasia, não é? —ela brincou, sem graça, passando os dedos pela saia de seu vestido esverdeado. —É suposto que estejamos...bem fantasiados. Pelo visto você se saiu ótima nisso.

Malévola remexeu a cabeça para o lado, um pouco arisca para dar qualquer resposta. Ver Aurora bem ali na sua frente após um ano inteiro sem receber notícias dela de início fora até bom, mas logo em seguida pareceu tão estranho. 

A fada tinha tantas perguntas para fazê-la, tanto assunto para atualizar, porém o momento para isso chegara e ela se via incapaz de ao menos saudar Aurora apropriadamente. Era como se a menina fosse uma vaga desconhecida.

Isso não tinha nada a ver com o fato de que ela crescera. Não tinha nada a ver com o afastamento dela após sua cerimônia de casamento. Não era isso. Aurora, cuja o rosto não se escondia por detrás de uma máscara como exigia a etiqueta da comemoração, tinha os mesmos olhos cor de céu meigos e gentis; a mesma áurea inocente que com ela nascera. 

Malévola ainda a enxergava como apenas uma menina. Uma menina que precisava de sua sombra e proteção; que precisava viver longe daqueles outros humanos deploráveis que poderiam corrompê-la cedo ou tarde.

Observar Aurora ali, bem de frente para ela, fez a sua alma arder em alegria, mas também receio. Ela temia que a garotinha que um dia criara já não fosse mais a mesma. Será que ela ainda a via com os olhos de sempre? Será que ela ainda era capaz de amar uma criatura tão complexa? Será que ela ainda deixaria Malévola novamente escovar seus cabelos loiros como narcisos, caso a fada pedisse?  

—Eu senti sua falta. —Aurora soltou, um pequeno rubor enfeitando as suas bochechas fartas. Ela se remexia, inquieta, como se quisesse aproximar-se mais, porém estava incerta se deveria fazê-lo ou não. Malévola constatou que talvez a garota quisesse um abraço. —Você...está bem?

Malévola odiava ter formalidades com a própria filha. Quer dizer, ela era aquela garotinha que um dia lhe chamara de fada madrinha, e anos mais tarde, a chamou de mãe. Ela era a mesma que a trevosa coroou como rainha dos Moors, confiante e certa o suficiente para entregar o maior tesouro de sua vida —o seu lar —nas mãos daquela humana. Malévola confiava nela, confiava de verdade.

Por que motivo então ela estava com medo agora?

—Estou bem sim. —a mulher respondeu,  tensa. Aurora murmurou algo em concordância.

—Hm...sabe, temos muita coisa pra conversar. —disparou ela, tocando um dos ombros de Malévola com carinho. A trevosa relaxou com o toque, que já falara tudo que ela precisava ouvir. Aurora continuava a mesma.

DesfechoOnde histórias criam vida. Descubra agora