Capítulo 28

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Duas semanas para o Versace Fashion Show. Seu último desfile. Havia anunciado publicamente, dado entrevistas, gravado em pedra, e agora vinha a onda de pânico. Era um passo definitivo, tomado quando ela achava que tinha a sua vida toda resolvida. Agora, se sentia andando sobre um chão de espuma.

-Como se você alguma vez tivesse tomado uma resolução por causa de homem, Ella Acker – Ella disse para a sua imagem na frente do espelho do elevador.

Chegou em casa depois de um dia caótico e a primeira coisa que fez foi descer do salto e deixar as sandálias ao lado da porta. A segunda foi colocar a água do chá para ferver. Estava se sentindo melhor. Não precisava mais fazer tocaias em sobrados nem apresentações em vídeo para se livrar da sensação de órgão arrancado. Mas também não estava na sua melhor forma. Aliás, estava bem longe disso.

Todo dia lembrava do quanto a sua rotina havia sido forçadamente mudada e o tanto que custava voltar ao que era antes. Trocar o chá pelo café e de volta ao chá. Ter um maço de cigarro no balcão da cozinha. Ser obrigada a ver filmes bobos da Disney e dar risada. Às vezes se achar muito adulta, em outras acreditar que não passava de uma criança. Se sentir feliz e protegida sem que isso dependesse unicamente dela.

-É aí que está seu erro – Ella se sentou com a xícara de chá à mesa da cozinha. Quando seu gato era vivo, acostumou-se a conversar com ele. Agora, falava com as paredes e se surpreendia ao ver que elas também eram uma boa companhia. - Sua felicidade nunca deveria ter deixado de depender unicamente de você. Crie vergonha, Ella.

-Mas – Ela mesma se respondeu. - Não era uma questão de dependência, era de compartilhar. É muito bom estar feliz junto com alguém, e não por causa de alguém.

Naquele minuto o seu telefone tocou e ela levantou um dedo:

-Segure esse pensamento. Ele é muito bom. Nós o desenvolveremos a partir daí.

No início, sempre que o telefone tocava, sua frequência cardíaca aumentava, seus sentidos se aguçavam, sua respiração acelerava e ela tinha certeza absoluta de que era o Tom. Após duas semanas de decepção, ela simplesmente engolia o choro e atendia, sabendo que não era ele. Dessa vez, ela aceitou a chamada da Mia.

-Diga.

-Está ocupada?

-Não no momento, mas tenho um evento que não quero ir lá na Bianchini. Aquilo tudo é tão brega que deveria ser um insulto ser vista lá, mas sou uma prostituta da moda no ocaso da minha carreira...

-Você está bem, Ella?

-Não, mas enfim. Diga.

-Falei com a minha mãe.

Ella chegou a derrubar um pouco de chá na blusa. Pegou uma folha de papel toalha para se secar.

-Meu Deus! Conte tudo.

-Você pode tentar não ficar tão feliz?

-Desculpa – Ella procurou despregar o sorriso do rosto, mas não era fácil.

-Eu a chamei aqui, e ela veio de braço dado com a Eliza, bengala, óculos escuros, o circo todo. Então eu mostrei o vídeo para ela. E você acredita que, enquanto a Eliza ficava com a boca tão aberta que quase babava, ela fingiu que não estava vendo?

-Não! - Ella não se controlou e soltou uma gargalhada. - Desculpe, amiga, mas quando passar a raiva você também vai rir disso.

-Espero, porque eu estou tão brava, Ella! Eu falei para ela parar com a palhaçada, que eu já sabia de tudo, e as duas tentaram me colocar de vilã, como se eu as tivesse forçado a isso porque sou a louca que não deixa a pobre vovozinha ver a netinha e larga a família na rua da amargura.

Quando a Vida Acontece - Vol 2Onde histórias criam vida. Descubra agora