Capítulo 32

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Renata gostava de álbuns de fotografia. Ela não tinha nada contra a câmera do celular, fotos digitais nem qualquer outra modernidade. Um dos seus orgulhos era não ter ficado parada no tempo e ter acompanhado cada nova tecnologia, por mais que lhe desse certa dor de cabeça para entendê-la a princípio. Mas havia algo de mágico em abrir as páginas de um álbum e viajar no tempo. Aterrissar nos anos 80 e ver seus cabelos cortados em camadas apenas menos equivocadas que as roupas de freira da sobrinha. Passar o tempo até chegar aos seus bebês. Os três. Emily havia sido um bebê lindo. Os cabelos castanhos, os olhos verdes cheios de pontinhos de luz, as bochechas rosadas e aquele sorriso com apenas quatro dentes na frente. Ela havia passado o início da vida da Emily todo preocupada com seu desenvolvimento e só agora, vendo suas fotos, ela podia apreciar completamente o quanto ela era maravilhosa. Phoebe e Dylan eram muito morenos, cabelos castanhos, olhos castanhos. Dylan nasceu completamente careca e Phoebe tinha tanto cabelo que mal dava para ver o seu rosto. E chorava. Como aquela menina chorava. Dylan era calmo como um buda e Phoebe berrava o tempo inteiro.

Ela fechou o álbum e o apertou contra o peito, sentindo-se muito solitária e sem ter com quem conversar. Havia se casado com um certo ar de triunfo e vitória, mas agora sempre pensava nos maridos das amigas. Na paciência eterna e adoração que o Vince tinha pela Kate; no eterno ar de garoto malvado e no excelente pai que era o Tom; na dedicação e no companheirismo do Eddie; no amor que explicava todas as sandices que Mick aturava da Alex. E ela tinha o Archie. Bom cozinheiro, cara legal, bem de vida. E com quem ela não tinha a menor vontade de dividir os seus problemas.

Então ela ligou para a Kate. Era a pessoa mais próxima que tinha da Phoebe no momento e a pessoa que morava geograficamente mais perto. Disse que queria tomar um drinque se ela prometesse que não seria horrível.

-Eu nunca sou horrível - Kate respondeu no telefone.

-Você é uma cadela.

-Verdade.

As duas combinaram dali a uma hora em um bar a meio caminho entre os apartamentos delas.

Quando Renata entrou, não deixou de reparar que não havia parado conversas nem atraído olhares. O tempo era gentil com ela que se esforçava tanto para enganá-lo, mas ele passava assim mesmo. Pediu um Bloody Mary no bar, sentou-se a uma mesa e tirou seu Kindle da bolsa. Estava menos triste e bastante compenetrada quando sentiu o banco na sua frente afundar. Kate estava com os cabelos presos em um coque bagunçado, a pele branca inteiramente tatuada, um batom vermelho sangue e um vestido preto com uma renda que não o deixaria deslocado no século dezenove. Parecia uma vampira bebendo vodca.

-Me conte o motivo do surto – Ela disse, antes mesmo de um "oi, tudo bem". - Sou ótima em administrar emergências.

-Não é uma emergência. Estava vendo um álbum de fotos.

-Não me estressa, Rê - Kate respondeu, visivelmente decepcionada. - Estou esperando babado e você me vem com um álbum de fotos?

-Foi um álbum de fotos incrível.

Kate se encostou na cadeira e disse, rodando a bebida no copo:

-Me convença.

-Tinha anos oitenta.

-Ai, adoro anos oitenta! - Kate se empolgou. - Era tudo lindo nos anos oitenta. Minha pele era maravilhosa e eu tinha muito mais flexibilidade.

-Aham, isso – Renata falou, na dúvida. - Vem cá, lembra quando você e a Malu vieram morar aqui?

-Claro.

-A gente se dava bem, né?

-Era incrível! - Kate quase gritou. - Acho que nunca me diverti tanto, mesmo com a Malu drogada e prostituída. Não, essa parte foi um inferno. E acho que me diverti bastante nos vinte e tantos. E nos trinta.

Quando a Vida Acontece - Vol 2Onde histórias criam vida. Descubra agora