Capítulo 5

39 13 6
                                    

Lily se referia à casa da sua mãe como sua "casa eterna". Havia saído de lá há quase oito anos. Tinha morado com o pai, dividido um apartamento com Tommy, depois com Sinead e, por último, com Mateus, mas sempre tinha uma sensação boa quando atravessava aquele portão, de que estava sendo acolhida. Provavelmente, ela e mais umas trinta pessoas se sentiam assim, pois os almoços de domingo eram concorridos.

Aquele dia ela havia chegado cedo, pois desde que ela e Mateus haviam se separado que ela só se sentia em casa ali. Havia largado seu casaco pelo caminho e estava na cozinha, temperando a carne, enquanto sua mãe, sentada em uma banqueta, virava as páginas do seu caderno de receitas.

-Tive de comprar um caderno só para receitas veganas. Não que me importe de comprar cadernos. Mas cara, sua tia Rê e a Loly, com essa mania de comerem nada animal, me tira do sério. É lindo, mas tem de ter uma criatividade! Tudo que é bom no mundo tem creme, ovo, queijo ou os três.

-Só você tem caderno de receitas, mamãe.

-E como eu vou anotar? - Sua mãe perguntou mais uma vez.

-Já te disse, no celular. É como todo mundo faz.

-Tela de celular escurece, Lily. É um saco. Mas me conte sobre a banda. Eddie, venha cá, a Lily vai contar sobre a banda!

Lily sorriu para a carne. Um de seus melhores traços era o sorriso, franco e bonito. Era um desperdício que ela o fizesse longe de quem pudesse vê-la. Tio Eddie, que estava sempre a um chamado de distância da sua mãe, entrou na cozinha e encostou na ilha onde a mulher havia largado o caderno. De qualquer maneira, o prato vegano do dia já estava mesmo planejado e adiantado.

-Nós assinamos com a gravadora do papai e do padrinho, o que é bem ridículo, porque não quero que pensem que só vou tocar com eles por ser a filha e a afilhada dos donos. Já basta ser filha da grande Malu Lewknor. Mas no fim foram eles mesmos que fizeram a melhor proposta, sabe?

-Que louco, ninguém vai pensar isso, Lily. Você é boa para caramba, e olha que a gente entende do assunto – Tio Eddie falou.

-Lily, você está aqui há vinte minutos e a gente só está falando sobre isso agora! A gente precisa brindar! Peguem a minha Coca-Cola na geladeira, por favor, e qualquer coisa que vocês bebam! - Sua mãe disse. - Isso é incrível! Minha bebezinha vai lançar um disco!

-Mamãe, não existem mais discos. Não existiam nem na época que você lançava discos.

-Credo, como essa menina me castra.

Tio Eddie pegou uma lata de Coca para a mulher e outra para ele e Lily lavou as mãos e pegou uma long neck.

-Ao seu sucesso, filha! - Malu falou, empolgada.

Depois que brindaram, Lily voltou a amassar o alho enquanto dizia:

-Não acredito que a banda está começando a virar coisa séria.

-Uma banda é sempre uma coisa séria - Sua mãe disse. - Até a minha banda que não saiu da garagem da tia Singe era super séria.

-Eu nunca conheci a Singe. Por que você se refere a ela como tia para mim?

-Não sei. Acho que hábito.

-Qualquer coisa que a gente se dedica como você se dedica à música é coisa séria, Lily – tio Eddie falou e ela deu seu sorriso bonito para ele.

Estava feliz. Estava se sentindo acalentada por estar entre as pessoas que mais amava no mundo. E estava feliz da vida porque Oyekunle ia se encontrar, depois do almoço, com Mateus.

O amigo havia falado com ela no dia anterior. Parece que Mateus, encorajado pelo telefonema de Oyekunle na noite do aniversário da Baby, ligou para ele de volta e o chamou para tomar uma cerveja e bater um papo. Lily estava com todo tipo de premonição boa sobre aquilo. Tudo bem que ele e Mateus eram amigos antes do seu término com ela, mas aquele "vamos sair e bater um papo" soou sério. Sério do tipo "preciso abrir meu coração porque não vivo, não respiro, não durmo, não tiro a Lily da cabeça e preciso voltar com ela". E, somando-se a isso o fato de que ia ser lançada, por seu pai, mas ia, fazia seus pés mal tocarem o chão.

Quando a Vida Acontece - Vol 2Onde histórias criam vida. Descubra agora