26: Ars Longa, Vita Brevis

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Jogados no chão contra a parede, oscilávamos entre conversas sobre quase tudo o que existia no mundo, embalados pela voz de Liz recitando músicas bonitas e o eco ocasional dos gritos eufóricos da plateia que se estendia abaixo de nós

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Jogados no chão contra a parede, oscilávamos entre conversas sobre quase tudo o que existia no mundo, embalados pela voz de Liz recitando músicas bonitas e o eco ocasional dos gritos eufóricos da plateia que se estendia abaixo de nós.

Rimos por um tempo que pareceu infindável sob a semi-escuridão que nos banhava, o ombro de Mozart escorregando sobre o meu sempre que uma nova gargalhada irrompia da sua garganta, preenchendo cada partícula de oxigênio com as notas dissonantes daquele que se tornara um dos meus sons favoritos no mundo inteirinho.

Sempre que o ouvia, meu peito vibrava como se o miocárdio fosse composto pelas cordas meio enferrujadas de uma guitarra qualquer, cujo mero lapso do timbre de Mozart era capaz de fazê-la entrar em desarranjo. Era uma sensação inquietante, profusa e incendiária, que começava em algum lugar no centro do relógio-cuco que fora instalado no meu coração e o preenchia até as bordas, espalhando-se até os limites quase infinitos do planeta, e ardendo por toda parte. Era como se o pássaro imaginário escondido no órgão em questão saltasse para fora do relógio que o alojava, gritando sua melodia com uma avidez eufórica. Não era preciso pensar muito, porque o significado daquilo pulsava no ar.

Eu estava irremediavelmente apaixonado por Mozart. Ele, o garoto dos olhos de infinito, o poeta quebrado repleto de cacos frouxos e lacunas preenchidas por vácuo. Mas ele não era somente seus espaços vazios. Moz era uma alma tingida com todas as cores existentes no espectro visível e além dele, cheio de ultravioleta e outros tons que beiravam o fantástico. O universo se expandia dia após dia para comportar toda a grandeza que se lapidava no seu ser, em forma de poesias que se explicavam na beleza ínfima das borboletas, pinturas profusas e mente em caos.

Em dado instante, Liz findou a sua última música, e os dedos dos integrantes da banda tocaram os instrumentos pela última vez. Após um coro de aplausos, o barulho gradativamente cedeu lugar a um silêncio parcial, mas ainda turgido pela euforia de outrora, que dançava no ar feito um milhão vaga-lumes cegos inundados de luz desgovernada.

- Eu canto porque o instante existe, e a minha vida está completa... - A vocalista se pôs a recitar, sua voz se dissipando em oitavas mais altas graças ao microfone. - Desmorono, edifico, permaneço, me desfaço. Mas sei que canto. E a canção é tudo. Tem sangue eterno e asa ritmada. E um dia sei que estarei muda, mais nada.

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