O corredor do segundo andar do casarão continha muitas velas e artefatos valiosos, que permitiam que o local fosse deslumbrante aos olhos de qualquer um. Em frente as portas dos aposentos, havia um espelho arredondado, encostado na parede. Assim, quando alguém saísse de um dos quartos poderia verificar a própria aparência. Por outro lado, todo aquele esplendor era motivo de tristeza para os criados da casa, pois eles tinham que limpar e deixar cada pedacinho daquele lugar, brilhando.
Tábata e o noivo estavam encarregados de tal função. Enquanto ela varria o carpete vermelho, Marcos lustrava os candelabros de ouro. Os dois eram competentes nas funções que realizavam na casa, mas não estavam felizes pela vida dura que levavam. A jovem criada só queria juntar dinheiro o suficiente para casar e formar sua família, enquanto o rapaz era um ambicioso, que detestava a vidinha medíocre, segundo ele, que tinha. Marcos sonhava alto e faria qualquer coisa para se dar bem na vida.
- Gostei da senhorita Sarah, parece boa gente! - exclamou Tábata, enquanto varria a parte final do tapete.
- Não se engane não, viu?! Esses ricos só parecem mesmo - alfinetou o criado, sem parar suas funções.
Quando terminou sua função, a jovem se aproximou do noivo e como já o conhecia muito bem, sabia que ele daria um jeito de dar com a língua nos dentes para contar o ocorrido do almoço. Se algum dos patrões descobrisse, com certeza a culpa cairia sobre Marila e Gael. Por isso, ao apoiar as mãos na vassoura, disse:
- Nem se atreva a contar pra ninguém o que aconteceu, ouviu bem?
Marcos olhou para ela e levantou as mãos, de forma sarcástica, como se não soubesse de nada. Estava claro em seus olhos castanhos a sua verdadeira intenção. Iria usar aquela informação quando fosse conveniente e necessário. Mas, só a noiva não conseguia perceber tamanho descaramento, ela o amava, ou pelo menos, achava que o que tinham era amor.
Tábata, que se encontrava na mesma posição, suspirou, pensando em Sarah.
- O que que foi agora, mulher? - questionou o criado, impaciente.
- Ah, eu espero que ninguém saiba que a senhorita Sarah começou as sobras no almoço, e junto com os criados... - suspirou profundamente - Nem sei o que a dona Célia ia fazer!
- O que a dona Célia iria fazer?
Aquela pergunta tinha vindo de uma voz diferente, de alguém que não estava presente na conversa. Os criados congelaram com a presença daquela pessoa, mas Tábata foi se virando devagar até dar de cara com Danilo. Ela não tinha onde enfiar a cara e pensava que tudo estava perdido, pois o filho do patrão iria contar tudo o que ouviu.
- Responda! - exclamou o rapaz, se aproximando. - O que tem a dona Célia?
Marcos olhava para o herdeiro de forma sinuosa, temendo o que ele faria, mas ao mesmo tempo, queria era contar toda a verdade pro patrãozinho. Por outro lado, a faxineira chegou até a esconder as mãos de tanto que tremiam, não queria ter que contar o que aconteceu com a senhorita Sarah e muito menos, que a moça fosse reeprendida pela mãe.
- N-nada demais, senhor! - respondeu, nervosa. - Eu só estava dizendo que se a dona Célia visse o quão mal meu noivo está limpando os candelabros, nem sei o que faria...
Então, Tábata saiu correndo pelo corredor, passando pelo patrão, sem nem esperar uma resposta. Mas antes de descer as escadas, ela fez questão de olhar para o futuro marido e fazer um gesto que indicava que ele também saísse dali o mais rápido possível. Como já tinha se voltado para a posição original, Danilo não percebeu tal sinal, mas o criado sim.
- Você parece ser um empregado diferente dos outros... - confessou o herdeiro, sabendo que esse tipo de estratégia iria fazer Marcos contar tudo.
- Como?! - se espantou o criado, arregalando os olhos.
- Isso mesmo que você ouviu. Saiba que se você cooperar, vai ser muito bem recompensado.
Marcos riu de nervoso. Por mais esperto que fosse, ele não queria insinuar nada de errado para o patrão, até porque não sabia as verdadeiras intenções dele, e muito menos, o seu caráter.
- Eu agradeço o elogio - disse, abaixando a cabeça. - Mas eu não tô entendendo onde o senhor quer chegar.
- Quero que me fale o que você e aquela criada estavam cochichando! - exigiu o herdeiro, com a voz firme.
Naquele momento, o serviçal viu uma grande oportunidade de tirar vantagem ao compartilhar aquela informação tão sigilosa. Seria a chance dele poder ganhar alguma coisa naquela casa! Do jeito que Marcos era ambicioso, ele já sabia que se falasse a verdade, seria uma forma de se aproximar do patrão. Por isso, pouco se importava com o que a noiva ou os outros colegas de trabalho iriam pensar quando soubessem que ele contou tudo o que havia acontecido com Sarah. Então, sem nem pensar duas vezes, o criado respondeu:
- Bom, é que a senhorita Sarah passou mal depois...
- Depois do quê, homem? - Danilo já estava começando a ficar impaciente e interrompeu o serviçal.
- Depois de ter tomado sopa de rabada com os criados na cozinha.
O herdeiro encarava o criado, incrédulo. Ele só podia estar brincando dizendo aquilo, jamais uma moça de família tão nobre iria se sujeitar a ficar enfurnada em uma cozinha, comendo as sobras dos empregados. Para Danilo, isso era inadmissível! Então, ele começou a gargalhar, porque tamanha brincadeira não fazia sentido.
- Agora fala a verdade, rapaz. - pediu ele, passando a mão pelo rosto ao recuperar o fôlego - O que raios realmente aconteceu?
- É a verdade, senhor! - confirmou Marcos, encarando o patrão.
Danilo fixou os olhos espantados no rapaz, e finalmente caiu em si. O empregado poderia ter os defeitos que fossem, mas naquela hora, estava falando a verdade. O principal questionamento para o herdeiro era entender como tudo aquilo tinha acontecido e quem havia permitido, isto era o mais importante e talvez ele já tinha até uma suspeita: Gael.
Assim, o primogênito deu as costas e saiu andando. A partir daquela informação, muitas suposições poderiam ser formadas, e era isso que ele iria desvendar, mas na hora certa.
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A noiva falida
Любовные романыDepois da morte de seu pai e a ascensão da República Brasileira, Sarah e sua mãe se encontram falidas e precisam arranjar um jeito de continuarem no círculo social de São Paulo. Ao escapar de um casamento arranjado por Célia, sua mãe, Sarah terá que...