Capítulo XVIII

103 11 9
                                    

A última vez em que viu aquele rosto foi no funeral de Sirius, três meses atrás. Aqueles olhos cinzas tão rígidos agora não causavam tanta intimidação depois de testemunhar lágrimas escorrendo deles, lembrava da rapidez com que ela as tentou enxugar e quão rápido foi embora pelos fundos para desviar de repórteres durante o discurso de Remus.

O desdém de Thomas pela elite bruxa não o impedia de admitir que a família Black tinha algo muito característico e invejável, tratava-se da impecabilidade deles mesmo quando estavam vivendo um inferno pessoal. Ela usava um vestido verde escuro, clássico design vitoriano que sempre aderiu a vida toda, e todo o aspecto doente que a palidez da sua pele tinha acabava convertido em uma porcelana aveludada que a deixava irritantemente bonita. A exuberância que reluzia em seus olhos tornava o círculo escuro e fundo ao redor deles algo completamente trivial, nenhuma maquiagem ofuscaria aquele defeito tão bem assim. Seus lábios estavam pálidos, mas cada palavra que saía da sua boca era tão convicta e imponente que também ofuscava não apenas esse detalhe, como também o de que sua voz estava mais rouca, fraca. Ela tremia pela fraqueza causada pela doença, mas levava a xícara de chá à boca sem pender as bordas em momento algum. E a postura, a famigerada postura aristocrática, não se abalava nem quando tossia sobre o lenço e o manchava de sangue.

─── Não gosta de chá?

─── Minha última tentativa de refeição aqui é argumento o suficiente para dizer que estou sendo um completo imbecil por simplesmente estar pisando nessa casa sozinho, então não espere que eu coloque na boca algo vindo de você.

Walburga riu, algo que nunca imaginou que viveria para ver.

─── Eu imagino que a sua vinda até aqui seja por uma razão mais passional do que lógica. ── ela pigarreou baixo, ajeitando-se na cadeira, sua feição mostrou estar com dor ao se mover. ── Como ele está?

Tom estava de braços cruzados, seus dedos apertaram discretamente os bíceps quando ouviu a pergunta. A verdade é que ficava apavorado quando pensava nisso e percebeu que seu esforço em manter o semblante frio não foi o bastante para aqueles olhos astutos notarem isso.

─── Ele superestimava Sirius, eu temia que esse erro trouxesse uma consequência dessas, entretanto, não posso julgar. ── ela suspirou com pesar ── O superestimo, então estou crédula que Regulus vai sair dessa fase antes que isso o mate. Luto é algo destrutivo.

─── Não é como se você soubesse o que é isso. ── retrucou ríspido.

Para sua surpresa, Walburga recuou a cabeça e o encarou como se tivesse ouvido um insulto ultrajante, mas imediatamente suavizou os traços.

─── Minha situação também está ligada ao luto. Eu perdi meu filho.

─── O filho que você torturou por dezesseis anos e o desertou?

Nesse instante Walburga assumiu uma postura séria. Sem precisar de muito, deixou claro que ao abrir a boca, Thomas não teria espaço para falar enquanto ela não lhe desse a palavra. Ela entrelaçou os dedos das mãos e inclinou para frente, repousou os punhos sobre a mesa e olhou com franqueza para ele, não como um prelúdio para uma litania de ofensas, mas sim para aconselhar.

─── Eu sei quem você é e reconheci sua genialidade quando percebi que conseguiu esconder de mim esse fato por tantos anos. Vim a perceber no funeral apenas, confesso. Você pode ser um garoto com um futuro promissor, você sabe bem como usar os privilégios do seu sangue, você é dono de uma mente que eu mesma não seria capaz de superar caso fôssemos inimigos políticos, mas por trás da máscara de Voldemort, você, assim como meu filho, é só um garoto ainda e garotos, especialmente os dessa nova geração bruxa, possuem uma visão muito romântica da realidade.

The HeirsOnde histórias criam vida. Descubra agora