Capítulo X

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Seus olhos estavam fechados e todo o barulho ao seu redor mal entrava em seus ouvidos, orgulhava-se muito de ter desenvolvido a capacidade de simplesmente se fechar e parar de ouvir coisas ao seu redor que piorassem seu humor ou estragasse um milagroso bom dia que estava tendo. Aquele era, de fato, um excelente dia.

A grama estava fofa, tão verde e viva, que não parecia ter sido abafada por uma manta generosa e deprimente de neve por meses. E o sol. O ar da primavera ainda era gelado durante as primeiras horas da manhã e no meio da tarde ainda instigava a tomar uma boa xícara de chá quente, mas o sol estava ali, resplandecente, sem nenhuma nuvem impedindo que os raios mornos batessem diretamente em seu rosto enquanto estava deitado no gramado.

Sabia ter criado a ideia de ser alguém soturno, preferia sustentar isso inclusive, mas amava o sol, amava estações quentes e detestava o constante clima deprimente da Grã-Bretanha. Por isso, quando vinham essas raras ocasiões onde podia usufruir de um céu decentemente azul e uma sensação morna no rosto, sem a insuportável umidade que embolorava paredes facilmente, deitava no gramado e usufruía como se não detestasse aquele lugar pelo resto do ano.

Mesmo de olhos fechados pôde sentir uma sombra sobre seu rosto, logo em seguida algo fazia cócegas em suas bochechas. Quando ergueu as pálpebras, deu de cara com a familiar cascata dourada, caótica com o típico frizz e nós, caindo sobre seu rosto. Os olhos azuis o encaravam com um brilho de curiosidade e astúcia que quase nunca saía deles, e suas bochechas eram as únicas partes coradas naquela pele pálida e porcelanada.

─── O senhor foi cordialmente convidado a sentar comigo neste belo gramado e contar sobre tudo o que me foi prometido antes do recesso. Sem direito à recusa!

E abriu um largo sorriso cheio de expectativas e ansiedade.

─── Pensei em esperar até o final de semana, aqui não é muito discreto.

─── Nada disso, Sr. Black! ── Pandora segurou suas mãos e puxou para que erguesse o torso até ficar sentado, ignorando seus gemidos preguiçosos. Logo em seguida ela sentou de frente para si, ainda sorridente e ansiosa para ouvir tudo. ── Eu verifiquei tudo, não tem ninguém para ouvir. Conte logo, Regulus!

Existia um bom motivo para tanta euforia da parte dela. No início daquele ano letivo, durante uma madrugada, Regulus pediu sua companhia durante um episódio insistente de insônia e revelou que o que estava tirando seu sono era ter beijado Thomas, que não fazia ideia de como as coisas seriam quando voltasse para casa. Seu retorno à Grimmauld Place durante o recesso de Páscoa foi carregado de expectativas dele e de Pandora. Antigamente tinha mais tempo para compartilhar coisas com sua amiga, mas desde a partida de Sirius as coisas mudaram, agora tinha que dividir a cabine do trem com outros herdeiros para manter boas relações, era rodeado por eles quase o dia todo e não sobrava espaço para conversar com Pandora como antes. Dava graças por isso não ter enfraquecido o laço da amizade, mas ambos sofriam com a diminuição da companhia um do outro durante os úteis – considerando que antes apenas se separavam na hora de dormir em suas respectivas comunais.

─── Walburga disse que você caiu de dois lances de escada.

─── Ah, sim. ── retorceu com desgosto os lábios ao lembrar daquele episódio horrível. ── Eu precisava de uma boa desculpa para não ir ao baile, nossos pais estão empenhados demais em oficializar nosso noivado.

─── E isso garantiu uns dias de casa vazia para vocês... ── Pandora cantarolou sugestivamente, contudo, como conhecia bem os defeitos de Regulus, logo desfez o sorriso e cerrou as pálpebras. ── Vocês conversaram, certo? Não ficou de novo fazendo aquela imbecilidade de fugir pela janela para passar o dia zanzando por aí, certo? Certo?!

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