Boatos e Preconceitos

348 60 77
                                    

Midoriya não sabia o que era pior: boatos ou preconceitos.

Via boatos tal como um vírus que, embora mitigado, nunca desaparece por completo; já o preconceito, a abelha rainha cuja traseira é rodeada por uma legião de zangões — a opinião é a abelha; os ignorantes que a seguem, os zangões. A verdade era que, no fundo, sabia que um era consequência direta do outro.

E confessava não estar preparado para a próxima dose até ela o atingir feito um furação.

— É verdade, Midoriya? Você beijou um cara e foi espancado? Por isso deixou sua antiga cidade?

Não parecia real. Estava sonhando? Estava, não estava? Tinha que ser um sonho, não podia ser sério. Eles não estavam realmente ali, aquelas palavras não eram reais, nada era real, nada.

Ninguém viu o beliscão que deu na própria coxa. Foi forte a ponto de quase arrancar a pele. Mas nada mudou. Ainda estava ali, naquele refeitório silencioso, encarado por Iida, Tsuyu e outras dezenas de pessoas de rosto desfocado. Ochaco era a única que não o olhava. O ar começou a faltar. Foi imediato. A mente tornou-se zonza. E a adrenalina...

Ah, essa sim atingiu o pico.

Algo despertou dentro dele. Algo horrível. Algo que só aconteceu uma vez: quando sua mãe o questionou sobre a veracidade dos boatos. Algo... que o tornava outra pessoa.

Pela segunda vez na vida, o sempre calmo e gentil Midoriya Izuku perdeu o controle.

— Mas... que merda é essa? Por que estão falando sobre isso? Quem falou isso? — seu punho socou a mesa com violência. O som foi altíssimo. Alguns sucos entornaram, mesclando a tintura pastel em tons vermelho-groselha e abacaxi-queimado. Tsuyu e Uraraka saltaram no lugar com o susto. Iida sequer se moveu. Izuku transpirava. Tremia. A cabeça estava em chamas.

Sentia-se queimar. Queimar de raiva.

— Midoriya, acalme-se, só estamos comentando o que ouvimos... — Tsuyu murmurou, hesitante. — Só queremos saber se é verd—

— Não! Claro que não! — as palavras saíram tão altas e com tanta potência que desconfiava que quem estivesse nos corredores foi capaz de escutá-las. Por um segundo, desconheceu a própria voz. — Isso é mentira, pelo amor de Deus! Isso... foram boatos que espalharam, nada é verdade! Entenderam? Nada — frisou, entredentes.

Iida ergueu-se. Seu rosto estava sério. De uma maneira que lhe irritou. Muito mesmo. Ele... sim, Midoriya conhecia aquele olhar austero. Lhe era familiar. A expressão corporal endurecida. As feições controladas, mas, no fundo, possuindo o intuito de encurralá-lo. Julgá-lo. Ali, ficou claro. Aquele cara não era seu amigo. Era só mais uma pessoa que revela sua verdadeira natureza ao escutar um boato.

Ele abriu a boca. Iria falar. Iria lhe machucar. Não, não deixaria. Desta vez, não deixaria ninguém fazer o que quisesse.

— Ochaco — chamou-a. Sua namorada. Sua amiga. Ela não o olhou. Em contrapartida, Midoriya só tinha olhos para ela. Todos ao redor eram insignificantes. Não tinha que olhar para nenhum deles. Não tinha que falar com nenhum deles. Só ela importava. — Ochaco, olha pra mim.

— Midoriya...

— Ochaco, olha pra mim — ignorou Tsuyu. Inclinou-se sobre a mesa, em direção à garota de braço enfaixado. O lábio inferior dela tremia. — Olha pra mim! — mandou, rude.

Ela obedeceu, de imediato. Os olhos castanhos expressavam choque. Foi a primeira vez que falou com ela daquela forma.

— Você não tá acreditando nisso, está? Ochaco — olhava-a com intensidade suficiente para fazê-la estremecer. — Está ou não? Responde.

Greaser | BakudekuOnde histórias criam vida. Descubra agora