Eu só queria melhorar!

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Midoriya bem gostaria de atestar que a cabeça latejante foi a culpada por acordá-lo, mas, lamentavelmente, isso seria uma baita mentira. Afinal, como portar ousadia a ponto de fingir surpresa? Simplesmente não dava. Não quando tudo estava contra ele nos últimos tempos.

O exílio de sua inconsciência para a realidade veio através de cutucões delicados sobre seus ombros nus. Na região, um fulgor acalorado, que partia do contorno linear de sua lombar à curvatura dos trapézios laterais. Às vezes, dispensava a posição fetal e adotava a de bruços quando desejava ser agraciado pelos primeiros raios solares vindos da janela, tal como apreciava naquele momento até dar-se conta de sua conjuntura e, instantaneamente, a calmaria em seu peito se dissipar como que sorvida por um ser cuja sede é insaciável.

Sim. Bastou um instante, e tudo que jazia enterrado nas últimas horas ressurgiu com tudo.

Mais um toque. Leve. Inferior a ínfimo e, ainda assim, dilacerante. O que era tenso se tornou estático. Uma paralisia tirânica, mas felizmente invisível aos olhos castanhos, que, distantes de um ângulo apropriado, não notaram. Aos seus, verdes e prensados, porém...

Ah, aquilo não era bom. Nada bom. Antes de perceber, suas inspirações desregularam, e foi desafiador mantê-las numa constante mais discreta. A seguir, as fibras de seus músculos, cada uma delas, em especial a de seus ombros, se contraíram. Completamente. Isso ele não foi capaz de disfarçar, e preocupou-se. Mas, por incrível que pareça, sua reação foi interpretada com doçura. O pedaço de colchão ao seu lado se moveu à medida que sentiu uma inclinação suave sobre suas costas. Sua pele, apesar de senciente, não previu a intenção dos braços finos até se ver rodeado por eles. Ali, o sufocamento dominou.

Os segundos se arrastaram feito horas perpétuas. Enquanto experimentava da maneira mais inédita e nem um pouco desejosa a petrificação hedionda que assolava a boca de seu estômago, as unhas afinadas, de maneira aprazível, o confortaram um pouco mais. Ao menos, deduziu, a intenção era essa, mas não era como se seu corpo pudesse entender. A carícia sutil ao seu dorso não traduzia sintomas amistosos, e sua respiração falhava com cada vez mais frequência. A eventual pressão dos lábios carinhosos triplicou o fenômeno. Ah, o que ela estava fazendo...?

Ah. Ah. Sim. Ok. Certo... Suas sardas. Ela estava as beijando, tal como fez durante boa parte da noite, quando confidenciou que aquele era seu desejo mais antigo e — ousado, não? — proibido. Bem, de certa forma, não mais. A felicidade de Ochaco por realizá-lo durante longos minutos foi mais que notável.

Mesmo assim... Midoriya não pôde deixar de atribuir singularidade ao fato. Era curioso como suas sardas, que no princípio sempre simbolizaram vergonha e pivô de chacotas, eram agora uma espécie de "realce" a sua aparência. Cansou de escutar, quando pequeno, pilhérias sobre sua constituição raquítica, sua inerente fama de choramingão e, em especial, os "horríveis pontinhos pretos espalhados por todo seu corpo". Em sua antiga cidade, era o único a portar aquela idiossincrasia, e não poderia dizer que se orgulhava dela até ingressar na universidade.

Certo, "se orgulhar" chegava a ser extremo diante de seus conceitos — isso se considerasse os íntegros. Apenas... já não desgostava mais delas. Não muito. Pouco. Bem pouco mesmo. Afinal, após anos abraçando a ideia de aquele ser um traço ignóbil, era esperado que fosse difícil reverter o pensamento. Se existia algo que aprendeu e vivenciou na pele era o desprezo ao "incomum". Para sua má sorte, o diferente sempre seria ridicularizado ou até alvo de malevolências externas, então nomeou as consequências que sofreu como nada mais senão o curso natural da sociedade, mesmo que o atributo sob ribalta derivasse de sua própria anatomia: algo que não escolheu, mas que o definia.

Ao menos, não era isso o que diziam?

Para todos os efeitos, houve fatores que o auxiliaram em sua busca de se harmonizar com sua própria estética — o comportamento das garotas, por exemplo. Ochaco foi uma delas, e embora ela não percebesse, o comprovava agorinha mesmo com suas carícias afetuosas e os selinhos apaixonados sobre sua derme. Depois da excelsa reviravolta que acometeu aquele panorama no tocante a suas sardas, a vergonha de se trocar nos vestiários ou até diante de Shinsou, quando iniciaram aquela vida conjunta de colegas de quarto, diminuiu consideravelmente. Durante todos aqueles anos, o único de quem Izuku não semeou desdouro em se trocar na frente foi...

Greaser | BakudekuOnde histórias criam vida. Descubra agora