Encarei o homem à minha frente sem acreditar no que vi; era uma grande loucura, talvez fruto da minha imaginação fértil, porque era impossível o que me aconteceu ser real. Meus olhos se mantiveram fixos na figura do jovem patrão, deitado sobre sua cama, com um lençol que lhe cobria apenas a parte inferior de seu corpo.
Jamais imaginava que o patrão fosse tão jovem e bonito também; era um homem de ascendência asiática, pele clara, braços que pareciam duas toras, assim como o peito definido, que carregavam algumas cicatrizes. Minha mente divagou na beleza surreal do patrão e tudo parecia tão fora da minha realidade, que tentava entender exatamente o que aconteceu naquela noite.
Cornelius cuidava dos buracos de bala deixados por mim, a situação parecia grave e me senti culpada por ter feito aquilo, mas como eu ia adivinhar que o patrão era um lobisomem, sei lá? Lobisomens não deveriam existir, certo? Mas o que eu estava vendo bem diante dos meus olhos era nada mais que uma lenda viva, ou quase.
— Me desculpe por isso, Cornelius?! — indaguei sem graça, então o homem mais velho me encarou, lançando seu velho sorriso gentil.
— A senhorita deve ter ficado bem assustada, mas fico surpreso por ainda estar aqui — respondeu, voltando a limpar os ferimentos do mais novo.
— Eu queria entender tudo isso... o que ele é?
— Bem, é o que os homens chamam de lenda — respondeu. — Um lobisomem!
— Eles existem mesmo? — murmurei surpresa com a resposta, apesar de já ter visto com meus próprios olhos. — Ele foi mordido, sei lá...
— Isso é lenda moderna de filmes, apesar dele poder fazer isso, mas não, não foi mordido, entretanto, ele pode ter sido o primeiro lobisomem da história brasileira — arregalei os olhos ao ouvir aquilo, me aproximando da cama. — Quantos anos acha que ele tem, menina? — Cornelius fez aquela pergunta estranha, me deixando confusa, mas olhando atentamente para o patrão, ele parecia ter minha idade, talvez.
— Vinte e quatro? — ele me encarou.
— Mais do que sua avó! — arregalei os olhos, pois minha avó, aquela megera do mal, tinha mais de noventa anos.
Não, não era possível aquilo, mas dada aquela história dele ser um lobisomem e Cornelius disse que era o primeiro da história, podia dar uns quatrocentos anos. Toda aquela história dava voltas na minha cabeça, era muito para digerir e eu podia sair correndo com medo, mas estranhamente não consegui ir.
Cornelius parecia bem cansado e veio na mente que fizesse aquilo por tantos anos, que não se deu conta que a velhice chegou. Meu lado trouxa falou mais alto e senti que deveria ajudar Cornelius, já que foi ele que me acolheu.
— Não irei lhe impedir de ir embora...
— Eu vou ficar e lhe ajudar!! — respondi rapidamente, tendo sua atenção para mim, então lhe lancei um sorriso.
Aquele era uma péssima ideia, uma das bem grandes, porque o sujeito tentou me devorar e lá estava eu querendo ajudar no processo de esconder o segredo do patrão. Bem, eu não tinha mais ninguém e nada na vida para me apegar, talvez aquilo fosse ser bom para esquecer tudo que passei.
Quando Cornelius terminou de fazer curativos nos ferimentos, que de acordo com ele, as balas que utilizei eram de prata pura, que por acaso eram mortais para a espécie do patrão. A arma estava lá, pois dias antes o patrão havia tentado tirar a própria vida, mas de alguma forma não conseguiu.
Falei para o mais velho que podia voltar para casa, pois eu cuidaria de tudo na mansão, mesmo um pouco hesitante, concordou, dando as devidas recomendações. Entendia toda a preocupação, eu era a pessoa estranha, que estranhamente "não ficou apavorada" com toda situação, mas na verdade eu estava em pânico.
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Beauty and the Beast (Qian Kun)
WerewolfUma jovem fugindo do seu passado, se ver envolvida em uma questão difícil de remediar... a fera solitária e amaldiçoada, que habitava a casa da colina era seu mestre, amigo, amante... seria a jovem bela a salvar a besta horrenda de sua maldição? Kun...