Capítulo 20

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Meus olhos se arregalaram quando a espingarda disparou. Caí sentada com a força da arma — minha cabeça girava e a visão ficou turva. Não sabia se havia acertado Kun, muito menos que em breve seria seu jantar literalmente. Os ouvidos zuniam e quando finalmente minha visão focou, senti meu peito apertar.

O enorme corpo da besta estava estirado no chão, enquanto se formava uma enorme poça de sangue.

— Não, não, não... Kun — engatinhei na direção dele, já com lágrimas nos olhos, imaginando a burrada que eu havia feito.

Seu corpo estava imóvel, apenas um gemido fraco saiu de sua bocarra, então ao virá-lo, arregalei os olhos ao ver aquele buraco de bala em seu peito, queimando intensamente. A prata fez um grande estrago em seu corpo e fiquei desesperada de tê-lo matado.

Eu chorava feito uma criança — não queria perder Kun, não depois de tudo que vivemos naqueles últimos tempos — não quando eu havia me declarado. De repente ele começou a ganhar sua forma humana, mas o ferimento ainda estava lá, enquanto Kun sangrava sem parar.

Reuní toda força que não tinha para removê-lo da grama úmida da mansão, arrastando-o para dentro de casa. Seu sangue criou uma trilha, enquanto eu chorava desesperada, pedindo aos céus que não permitisse que ele morresse. Definitivamente não poderia perder Kun e me puni mentalmente por ter tido aquela ideia idiota de ritual, ainda por cima ficar sozinha com ele.

Subir as escadas não era uma boa opção, então deitei seu corpo em um dos sofás da sala de visitas, correndo atrás do celular para ligar ao senhor Cornelius. Se eu ligasse para a emergência, iriam questionar como Kun foi baleado, além de que era perceptível que a bala estava queimando sua pele.

Quem atendeu a ligação foi a senhora Rosana e ela ficou apreensiva, pois eu só chorava, tentando dizer o que houve. E não demorou muito para que o casal chegasse na casa. Fiquei surpresa de ver a mais velha ali, mas eu sabia que não existia alguém que conhecesse tão bem Kun que ela, pois rapidamente correu até a cozinha, pegando potes de ervas e me mandando buscar toalhas limpas e panos.

— O ferimento foi muito profundo, Neco! — A senhora Rosana virou para o marido, que estava apreensivo. — Vou tentar conter o efeito da prata, mas teremos que chamar o doutor. — Ele assentiu, correndo para pegar mais ervas, enquanto ela cuidava do efeito que a prata estava fazendo no corpo de Kun. — Não morra antes de mim, seu bastardo! — murmurou com a voz embargada.

— A culpa é toda minha, senhora! — falei agarrada a toalhas, tendo a atenção da mulher.

— Você só estava tentando salvá-lo... — neguei com a cabeça.

— Só piorei a situação — tentei limpar as lágrimas com a manga da camisa. — Não sei mais o que fazer para acabar com sua maldição! — eu já soluçava, me ajoelhando de frente ao grande corpo de Kun, que estava desacordado.

Aquele homem havia passado pelo inferno durante séculos e nunca ficou em paz verdadeiramente. Kun merecia uma vida digna, onde pudesse ser um humano, envelhecer e ter frutos, mas ao contrário disso, piorei a situação, atirando nele de novo.

Tentei ajudar como podia, tentando não ser uma grande inútil, pois não conseguia controlar minhas lágrimas. Naquela situação, tudo que Kun menos precisava era de uma mulher histérica e chorona. Então corri de um lado para o outro ajudando a senhora Rosana com as ervas, ora pisando, ora no fogão fazendo chás.

Ela havia dito que os legados passados haviam desenvolvido meios de diminuir os efeitos da prata, para que Kun não morresse por ela, pois o mesmo já tentou dar cabo de si diversas vezes. No entanto, a única que fez aquilo duas vezes, havia sido eu e aceitaria se ele não quisesse mais me ver.

Beauty and the Beast (Qian Kun)Onde histórias criam vida. Descubra agora