Beauty and the Beast (Qian Kun)

Capítulo 11

Fechei aquele livro, não suportando mais ler tanta tragédia e mal podia acreditar que o patrão passou por tudo aquilo, então era entendível aquele homem parecer tão quebrado, pois havia perdido todo mundo, inclusive a própria razão de viver. A própria Sarita deixou claro que Qian Kun deixou de ser o mesmo, se escondendo dentro de uma concha e se encolhendo.

Ele não mais sorria, ou esbanjava todo carisma que um dia teve mesmo diante das adversidades...

"Perdi as contas de quantas vezes Kun tentou tirar a própria vida e de todas as formas possíveis. Meu irmão havia se perdido desde aquela noite e sua maldição tornou-se ainda mais incontrolável, pois enquanto antes ocorria apenas na lua cheia, passou a acontecer todas as noites. Tínhamos que trancá-lo com correntes mais fortes e mesmo quando o sol raiava, ele permanecia ali preso, se recusando a sair de dentro do porão e eu me pergunto se quando parti, Kun foi me visitar em meu túmulo."

Ler aquelas palavras fez com que chorasse ainda mais, aumentando o desejo de querer salvar a vida do patrão Kun — acabar com toda aquela dor de seu peito e Sarita estava falando comigo naquele momento, como se tivesse chegado a minha vez de fazer alguma coisa, pois nenhuma outra Rafaela fez qualquer coisa além de morrer e partir o coração dele. Ele amou todas elas, mas não me amava, então poderia ser um sinal que de alguma forma fui escolhida pelo universo para encontrar uma cura para sua maldição.

Guardei o livro de Sarita com todo cuidado possível — eu havia lido todos eles, mas faltava um, que na lombada percebi se tratar do livro do senhor Cornelius, mas não me lembrava de vê-lo escrevendo qualquer coisa. Olhei para a porta esperando que ninguém estivesse olhando e peguei aquele manuscrito. Era um livro de capa de couro azul, sem nada escrito na capa e quando abri, percebi que metade dele não estava escrito.

Na verdade havia mais um antes deste, porém era bastante fino e quando folheei havia poucas informações, maioria muito técnica, mesmo se tratando do livro de Francisco, filho de Sarita. Este não me interessou muito, por isso voltei minha atenção para o do senhor Cornelius, achando estranho está pela metade.

Minha curiosidade foi maior que o bom senso e foi o próprio Cornelius que deu permissão para ler os manuscritos dos legados e entender a história do patrão e logo no início as coisas se tornaram estranhas.

15 de setembro 1978

Não, eu não nasci para ser um legado, não era meu destino, mas fui escolhido no calor da guerra e para mim será uma honra.

Tinha ouvido muitas histórias sobre o irmão Kun e sua eterna vida de um amaldiçoado, minha avó contava muitas histórias sobre a importância que ele teve em nossa família, mas também se sentia culpado pela extinção desta. O homem que eu estava vendo de longe se parecia com o que vovó contava para nós, ao contrário disso, parecia um homem apático e sem esperanças, preso em seus pensamentos e com aquela barba estranha.

Irmão Kun nunca casou e nunca formou família, sua maldição não lhe permitia, então passava a maior parte do tempo trancado em um porão acorrentado como um animal. Meu pai assumiu os negócios da família, pelo menos o que restava depois de toda desgraça.

A respeito de eu não ser um legado legítimo — esse era meu irmão mais velho Carlinhos — ele havia sido escolhido pelo nascimento, mas acho que essa não era sua vontade, pois poucas vezes o via com o irmão Kun, estando mais interessado em sua namorada.

Assim como no passado, estávamos vivendo um período conturbado no país, pois os militares haviam tomado o poder e muitas pessoas eram mortas e torturadas como inimigos da pátria. Tentávamos viver da forma mais honesta possível, mas meu pai vivia reclamando de uma possível falência e cheguei a ouvi-lo dizer que era culpa do irmão Kun.