Capítulo 7

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Ele poderia passar facilmente entre aquelas pessoas, sua pele alva era como um tipo de escudo, mesmo sabendo que não pertencesse àquele mundo. Entretanto, precisava ver até onde ela iria, o que Rafaela estava planejando ao sair do Quilombo e se aventurar na cidade dos brancos, sendo ela uma mulher negra e fugitiva?!

Os passos da jovem donzela eram apressados, como se buscasse desesperadamente algo — sequer percebeu que Kun a seguia, apenas foi em frente. Kun por outro lado se manteve em certa distância, curioso para saber o motivo de sua amada fazer aquilo.

No tempo que estavam juntos no Quilombo, tudo parecia tão mágico, menos doloroso para o jovem amaldiçoado, assim como o desejo de vencer sua maldição para ficar com quem mais amava. Ele tinha sonhos de ter uma vida normal com Rafaela, formar família e viver no Quilombo em liberdade, mas havia algo que os mantinha longe dessa realidade e logo o jovem Kun descobriria.

Depois de dobrar algumas ruas, Rafaela parou abruptamente e encarou com os olhos melancólicos a figura de Sofia na companhia de uma outra sinhazinha comprando vestidos. O coração dela disparou, sabendo que a menina parecia bem, entretanto também sentiu grande dor por não poder ficar ao seu lado, pois o vínculo que tinham era muito forte.

Em contrapartida, Sofia estava ali, porém sua mente divagava; perdeu seus pais em um atentado e depois foi separada de sua Bá de forma bruta. Mesmo ao lado dos seus, se sentia sozinha, pois tudo que lhe importava já não existia e era uma carga emocional muito grande para uma menina tão criança.

Um arrepio percorreu sua espinha e virou a cabeça, encontrando finalmente o rosto complacente de sua amada Bá e seus olhos se encheram de lágrimas. Tentou chamar o nome de Rafaela, mas a outra balançou a cabeça, pois alguns dos feitores acompanhavam as damas, então a mais velha sinalizou para que se vissem do outro lado do mercado.

Sofia esperou que sua acompanhante se distraísse, então caminhou por entre as barracas, se esgueirando para encontrar Rafaela — o coração batia acelerado, sentia falta de sua Bá e quando a avistou próximo de uma quitanda de verduras, apenas correu, abraçando o corpo franzino da jovem.

— Onde vosmicê estava, Rafaela? — chorou ainda apertando-a, que também se debulhou em lágrimas.

— Fui resgatada pela minha gente — a menina de olhos azuis brilhantes ergueu a cabeça para encarar a outra. — Sinto em deixá-la, sinhazinha.

— Só não me abandone novamente! — os olhos da garota estavam vermelhos pelo choro. — Vamos, volte comigo para casa, falarei com o senhor da casa... — Sofia puxou Rafaela, mas por sua vez a jovem abaixou a cabeça.

Claro que ela queria ficar ao lado da pequena menina que praticamente criou, entretanto não poderia voltar para a fazenda, pois sabia que seria jogada na senzala com os escravos e possivelmente iria para o tronco até confessar onde era a localização do Quilombo. Por mais que sentisse muito amor por Sofia, como se fosse sangue do seu sangue, ela ainda era uma menina branca e Rafaela uma escrava; depois de estar livre e ainda com Kun, não podia deixar sua nova vida para trás.

— Sinto muito, sinhazinha — disse. — Meu lugar não é mais ao seu lado — Sofia a encarou incrédula.

— Claro que é ao meu lado! Prometeu ao meu pai que cuidaria de mim!!

— E eu cuidei, mas nossos caminhos se dispersaram e agora só restam boas lembranças. — Rafaela pegou nas mãos alvas da menina, o coração apertado, porém aquele era o momento certo da despedida. — Lhe levarei eternamente no coração, pequena Sofia, meu raio de sol!

— Não...

— Rafaela — ambas viraram ao ouvir aquela voz aveludada.

— Kun? O que faz aqui? — a jovem arregalou os olhos, assustada pelo namorado que surgiu daquela maneira.

Beauty and the Beast (Qian Kun)Onde histórias criam vida. Descubra agora