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"Partes desta história são fatos, partes são memórias, e o resto?... O resto, extraí dos meus sonhos." — Astrid, A Rainha-lobo.

Meu nome é Astrid Beowulfdottir, e nasci no ano 350 desde a Conquista Rurguêsa de Mar-Krag.

O ano seguinte, de 351 d.C. foi marcado pela morte do Rei Galbatorix IV o Grande, cuja partida foi selada em decorrência de uma queda de cavalo que o deixou com uma fratura no fêmur. O grande rei do Norte, como ficou conhecido, reinou por 39 anos. Sua morte trouxe uma era de incertezas quando a coroa da Rardânia foi passada para o jovem príncipe Natan Argos, herdeiro quinze anos de idade. Dotado de um Poder além de seus anos, ele ascendeu ao trono sob o nome de Rei Galbatorix, Quinto de Seu Nome. Contudo, o reinado de Galbatorix V não começou com festividades e aplausos, mas sim com um ato implacável. Seu primeiro ato régio foi um expurgo brutal: sua jovem madrasta, uma dama da Casa Foyer de apenas vinte anos, e seu meio-irmão Olino Argos, uma criança de apenas três anos e toda a família materna. A Casa Foyer, cujo barão Gene Foyer havia supostamente conspirado para que o jovem príncipe Olino, fosse declarado herdeiro suprimindo os direitos de Natan, foram vítimas de sua fúria impiedosa.

E não satisfeito com a demonstração de sua autoridade, as terras da Casa Foyer também foram alvo de seu expurgo, seu castelo Torrente Negra, fora tomado de assalto e os arrendatários do barão Foyer foram massacradas sem piedade. Não houve espaço para contestações ou desafios ao seu Poder e seu direito ao trono, pois sua brutalidade de sua ação, silenciou qualquer voz dissidente no reino.

No entanto, não se enganem ao presumir que este relato constitua a trama das altas cortes Rurguêses e suas intrigas palacianas. Todos esses registros sobre as genealogias dos monarcas do norte repousam serenamente nas prateleiras da biblioteca da Catedral do Fogo Sagrado, em Reinsburgo. Longe disso, pois minha origem remonta a uma camponesa, nascida em uma modesta choupana com teto de palha, envelhecida pelo tempo, debilitada pelas tempestades de neve, com uma antiga cortina de couro desgastado servindo de porta. Na singela Vila Sapo, à sombra do riacho onde os resíduos do castelo Argoburgo eram lançados, nossa cabana diminuta, sempre tinha uma coluna de fumaça saindo pela abertura do teto. Nas paredes, estavam dispostas prateleiras amarradas com tiras de couro entrelaçado. Ninara, minha tia, guardava seus ingredientes e elixires, misturas alquímicas de propriedades medicinais. Ainda me lembro do calor das chamas daquela lareira no meu rosto, lembro-me das noites moendo ervas, a luz do fogo dançando nas paredes de barro, enquanto minha tia, com mãos ágeis e sábias, preparava seus remédios, para os camponeses enfermos. Era ali, naquele modesto refúgio, que eu aprendi os caminhos da alquimia.

Vila Sapo, com seu nome pobre e sua vida simples, era um mundo distante das cortes reluzentes e dos jogos de poder. Ali, as estações marcavam o ritmo da vida, e as preocupações giravam em torno das colheitas, da pesca, do retorno dos homens das guerras, das ervas medicinais, das mulheres que estavam gravidas, e das mulheres que perderam seus bebes e é claro, da Fé na Igreja da Fogo Sagrado. Eu cresci entre os campos verdejantes e os bosques densos de carvalhos do norte, onde cada árvore tinha uma história para contar e cada animal guardava seus segredos. O norte sempre foi um lugar de beleza áspera e autenticidade crua, onde a natureza reinava e a vida seguia seu curso alheio ao destino dos homens. E, no entanto, mesmo nas sombras da Vila Sapo, uma camponesa como eu, sonhava que meu destino se estendia para além das fronteiras estreitas da minha cabana. Embalada com as histórias da minha tia Ninara de feitos dos grandes reis Rurguêses de outrora, de heróis regressando de masmorras ocultas, de princesas poderosas vencendo dragões. Pois havia algo dentro de mim, uma chama ardente de curiosidade, que me impelia a buscar mais além, a desvendar os mistérios do mundo e a forjar meu próprio caminho na vastidão dos horizontes desconhecidos.

E esse destino, começou a se desenrolar já no meu primeiro suspiro, quando, minha mãe encontrou o abraço da frio da morte no momento do meu nascimento, deixando-me órfã. Nunca soube quem foi meu pai, e jamais me importei. Até os primeiros oito anos, minha criação foi confiada a minha tia Ninara, uma alquimista cujo vínculo com a natureza era tão intrínseco quanto as raízes de carvalho que se entrelaçavam no solo. Em sua arte de elixires, remédios e poções, ela traçava nosso sustento.

Canções de Ultramar, Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora