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Confesso que mantinha uma visão heroica e infantil sobre a guerra, influenciada pela convivência com homens e mulheres que glorificavam o campo de batalha. Todas as noites, nas rodas de pessoas em volta da fogueira no salão do meu pai, homens contavam seus feitos e brindavam aos companheiros que haviam tombado no campo de batalha, remando agora eternamente Sovngard. Foi durante a guerra liderada por Beowulf que vivenciei meu amadurecimento.

Na primavera, Earl Fryda chegou ao castelo Terra-Queimada de Beowulf, trazendo consigo suas guerreiras. Sua frota recém chegada de Ultramar estava ancorada em um pequeno afluente do Rio Prata. Ela trazia consigo mil mulheres guerreiras e suas crianças e mães e avós, todas em busca de terras para colonizar. Não me recordo exatamente do tamanho do exército de Beowulf na época, mas certamente ultrapassava os mil guerreiros. Além disso, cerca de quinhentos soldados Rurguêses vassalos sob a bandeira Lança Sangrenta de Beowulf, uniram-se à campanha.

A longa coluna formadas por homens, cavalos, mulas de carga e carroças e rebanhos de ovelhas vivas partiram de Terra-Queimada ao meio-dia. Earl Fryda seguiu para se reencontrar com sua frota e a colocar em movimento para o sul. Nós, rumamos por terra, atravessando um riacho e depois para o leste por muitas léguas. A estrada de barro batido acompanhava campos de cevada, plantações de milho e batatas, todas propriedades de Rurguêses que juraram lealdade a Beowulf. Levamos dois dias até alcançar o sopé do monte Cimbro, onde montamos acampamento. Na manhã seguinte, viramos para o norte em busca de um ponto para atravessar o ramo nascente do rio Prata, que serpenteava as terras de meu pai, para também desviar da floresta de Anlaroth, que supostamente era amaldiçoada.

— Qualquer homem que entra nessa floresta, jamais sai dela... — disse um dos batedores Rurguêses que jurara a Beowulf — Chamamos ela de Floresta Assombrada, te aconselho, senhor... Dê a volta.

Com relutância, meu pai concordou e seguimos longas milhas para o norte, contornando a floresta. Eu passei todo o caminha olhando entre as arvores, tentando ver essas assombrações, mas nada via a não ser arvores, mas juro que pensei ter visto uma arvore se mover, mas deve ter sido o vento. Ao anoitecer, os batedores encontraram um vau raso o suficiente para atravessar as carroças e rebanhos. Então fizemos a passagem. Beowulf decidiu acampar nas margens externas do rio.

— Astrid! — chamou-me Beowulf, e esporeei meu cavalo para aproximar-me dele — A partir daqui, entramos em território hostil... Em caso de confronto, quero que permaneça na retaguarda!

— Eu quero lutar ao seu lado! — protestei.

— Terá a sua oportunidade, mas por enquanto... Só me obedeça! — disse ele.

Apesar do meu desejo de contestar, observei em seus olhos uma frieza desconhecida. Karl passou por mim, acenando negativamente com a cabeça, e seguiu Beowulf colina acima. Beowulf costumava ser gentil na maior parte do tempo, mas naquele momento, ele se transformara em um comandante em guerra, e eu não queria ser um fardo. Assim, obedeci. Na primeira semana, não houve batalhas, apenas escaramuças envolvendo os batedores que iam à frente do exército, saqueando tudo o que podiam. Vilarejos Rurguêses e fazendas próximas a fronteira foram abandonadas, enquanto outros eram tomados de assalto tão rapidamente pela linha de frente da cavalaria de duzentos homens de meu pai, que quando o exercito chegava, a escaramuça já havia terminado. Vi homens arrastando mulheres jovens e crianças com as mãos amarradas para a nossa coluna. Testemunhei homens mortos e outros agonizando na lama. Fiquei paralisada diante de um corpo infantil de bruços na lama.

— As canções mentem, Astrid! — disse Beowulf ao meu lado quando percebeu para onde estava olhando — Não há glória na guerra... Só morte, pilhagem e roubos! Os homens são animais que usam coleira a maior parte do tempo. Mas na guerra se soltam.

Canções de Ultramar, Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora