Ainda reunidos em frente a cidadela, conversávamos.
— Vamos aguardar até anoitecer — afirmei. — Darei uma olhada mais detalhada e verificarei se há algum meio de entrar.
Disse tentando ganhar tempo. Minha esperança é que meu plano tivesse dado frutos e meus infiltrados tivessem dentro dos muros.
— Não seja tola, mulher! — desdenhou um jovem de uns vinte anos, ao lado de Earl Ingrid — Não tem como entrar nessa cidade! Perdemos nosso tempo vindo até aqui.
Aquilo me enfureceu. Nada tinha feito para ser insultada daquela forma.
— Sovngard é para os corajosos! — respondi.
Sovngard, o palácio submarino onde os corajosos entregues ao mar eram levados para festejar. Dizer aquilo era um insulto dirigido a um Ultra. Era acusá-lo de não ter coragem de morrer em batalha. Ele cerrou o punho e avançou contra mim, e num movimento de autodefesa, levei a mão ao sax e saquei a lâmina. Ele parou instintivamente e sorriu de forma maldosa.
— Tens tanto desrespeito assim por nossas leis? — censurou Bjorn. — Nossos costumes dizem que não se deve levantar uma espada contra um companheiro de parede de escudos durante a guerra. Quer mata-lo aqui? Frente ao inimigo que nos assiste de cima de seus muros?
Eu abaixei a cabeça com vergonha e guardei a lâmina.
— Peço desculpas por minhas ações! — disse, envergonhada
— Não se dê ao trabalho... Não se pode esperar muito de uma mulher Rurguêsa... Mesmo tendo sido criada em tão proeminente família — disse o jovem com um sorriso maldoso.
— Não é hora, nem lugar para isso, Gunnar! — repreendeu Ingrid. — Earl Astrid se desculpou... Peça desculpas também!
Ele se aproximou.
— Earl? Tudo bem... Me desculpe "Earl Astrid" — disse as palavras como se desdenha-se delas — Isso nunca mais se repetirá, isso eu te garanto.
Eu assenti com a cabeça. Nossos olhares se cruzaram, e tudo o que pude ver foi ódio, malícia e dissimulação. Eu sabia que tinha feito um inimigo, mas aquele jovem magrelo e miúdo, não me pareceu tão perverso, quanto se tornaria. O nome que ele viria a ser conhecido é Earl Gunnar, Garra do Inverno. E futuramente se tornou um dos homens mais temido a pisar em Mar-Krag.
— Vamos entrar nessa cidade! — disse novamente, mas fui ignorada — Com o Deus Sob As Ondas como testemunha, vamos entrar nessa cidade.
— Primeiro vamos ver de perto contra o que estamos lidando... — disse Bjorn. — Está ficando tarde, e logo vai escurecer e não vamos poder observar as defesas.
— Vamos negociar, Bjorn? — perguntou Rollo, irmão de juramento de Sigtryggr — Talvez nos paguem para nos deixarem em paz.
— Vamos ver se estão dispostos a nos pagar para irmos embora. — disse Sigtryggr. — É a melhor opção mesmo.
— Fiquem aqui, Astrid e Gunnar — ordenou Jarl Loki — Não queremos crianças mal comportadas na reunião... Rollo, você está no comando do acampamento.
Senti vergonha. Gunnar tinha causado problemas para mim, sem que eu tivesse provocado. Bjorn e os outros subiram em um drakkar e remaram até a outra margem, onde um grupo de homens saiu pelo portão e se aproximou deles. Permaneceram lá por duas horas conversando e depois retornaram à nossa margem do rio. Eu estava no acampamento da minha tripulação quando chegaram.
— Senhor Gunnar? — disse me aproximando dele — Não sei o que lhe fiz para ofende-lo, mas novamente me desculpo. Tenho algumas ideias para tomar a cidade, e simplesmente tentei compartilha-las.
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Canções de Ultramar, Livro 1
FantasiA nove anos, uma frota de navios Drakkar foi vista chegando pelo Mar Ocidental, em direção à Mar-Krag. Pouco se sabia daquele povo, mas logo soube-se que haviam chegado para ficar. Anos se passaram, e as guerras entre os Ultras e os Continentais, ch...