ℂ𝕒𝕡𝕚𝕥𝕦𝕝𝕠 𝟙: Chacoalhada na família

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Tudo estava confuso, embaçado e doído. Vi meu pai vagando incerto, para cada vez mais longe, indo para a direção oposta de minha mãe, que também corria sem direção. Vi um abismo entre eles, e o fio vermelho que os conectava se rasgando.

Quando me dei conta, eu estava entre eles, chorando e agarrando a barra de seus roupas. Muitos anos já haviam se passado, mas ali eu era apenas uma criança de seis anos, chorando inconsolável, implorando para não perder tudo novamente.

Surpresa, percebi que meu despertador tocava, e eu levantei de minha cama empapada de suor. Havia muitos anos onde eu não tinha um pesadelo tão terrível.

Tratei de entrar logo no banho, tentando organizar meus pensamentos e discernir a verdade da fantasia.

Eu era Anya (É bom me lembrar disso) e não era mais uma criancinha, já tinha quinze anos. Meu pai não estão se afastando, eles estão casados, tipo, real oficial.

Os Forger era uma família de verdade, nos amávamos como tal, e isso era o bastante.

É interessante o que o tempo pode fazer. Lembro como se fosse ontem, meu pai saindo de casa tenso para uma reunião, e voltando como se tivesse um peso tirado dos ombros. Ele chegou pulando de alegria, mentiu falando que tinha terminado um projeto no trabalho e que poderia se dedicar mais a nós.

Soube, lendo sua mente, que, na verdade o prazo para nossa missão havia se estendido e muito, ou seja, eu poderia relaxar mais, e ele também.

Só que eu acho que o papai relaxou um pouco demais.

Nada contra, até prefiro, mas é impossível não comentar o quanto ele mudou. Continua com importantes missões, e salvando o mundo de vez em quando, mas perto de nós agora ele era mais o Loid Forger; apenas um pai amável e preocupado, e um marido dedicado e apaixonado.

Sentimentos reais, que seriam repreendidos pela WISE, mas ele já não ligava tanto.

Sorri involuntariamente. Não me lembrava dos meus pais biológicos na mesma intensidade de antigamente, mas eu sabia que meu pai e mãe agora eram insubstituíveis.

Meu pai não era espião o tempo todo como antes, mas não havia afrouxado, e o mesmo se pode dizer da mamãe, que havia largado o emprego de assassina há muito tempo, mas que ainda tinha a impressionante força.

Balancei a cabeça tentando abandonar tais pensamentos. O prazo podia ser bem maior, mas ainda existia, e eu tinha que me apressar, não era uma aluna imperial e também não era exatamente próxima do Damian.

Ele era uma incógnita. Provavelmente a única pessoa que eu podia ler os pensamentos e não os desvendar.

Terminei de me arrumar para a aula, e fui para a mesa tomar café. Meus pais já estavam lá, meu pai terminando de preparar o café e minha mãe beliscando uma maçã.

-- Bom dia...

Puxei uma cadeira e papa chegou com a jarra do líquido fumegante.

Assim que ele se sentou, minha mãe se levantou e correu para o banheiro. Olhei confusa para meu pai. Ele olhou mais confuso ainda para mim, mas logo correu para socorrê-la e pediu que eu me adiantasse.

Meu cérebro ainda terminava de despertar, e eu tentava ler a mente de meus pais ao longe, mas não conseguia. Minha capacidade telepata havia aumentado, mas na real nada meu funcionava realmente bem com sono.

Tomei um gole do café e senti ele descer queimando minha garganta e despertando uma parte de meus neurônios. Ouvi som de passos e logo Loid apareceu no cômodo dando apoio para Yor.

Estranhei, e ao tentar ler suas mentes de perto me surpreendi ao não conseguir. Demorei a me dar conta de que era lua nova. Não importava meu esforço, não conseguiria ler nada, me restava apenas esperar pela boa vontade deles de falar a verdade.

Eles sentaram-se à mesa, e boa parte do café foi em silêncio completo.

Minha curiosidade aumentava a cada momento, não era possível que eles iam fingir que nada tivesse acontecido. Abri a boca para exigir explicações, mas mama começou antes:

-- Então... – Eu e meu pai nos endireitamos nas cadeiras, atentos para ouvir sua declaração. – Eu quero falar uma coisa muito importante, e para ser sincera, eu já suspeitava, mas só tive certeza ontem a noite, me perdoem por não ter contado antes.

Eu já estava quase roendo minhas unhas de ansiedade, e queria implorar para ela desembuchar logo. Mas meu pai foi mais rápido. Pegou a mão da mama, e a acariciou, incentivando-a.

Derreti de amores.

Ela respirou fundo e soltando o ar bem devagar disse, quase num sussurro:

-- A Anya vai ter um irmãozinho.

O mundo parou, recaiu sob absoluto silêncio. Ouvíamos o "tic tac" do relógio, e nada mais.

-- Pera, isso quer dizer...? – Começou meu pai, seus olhos correndo do rosto até a barriga imperceptível de minha mãe.

-- Quer dizer que eu estou grávida. – ela disse, dando um sorriso constrangido. Porém, ele foi morrendo ao não notar nenhuma reação vinda de Loid. – Anata, você não está feliz?

Ele balançou a cabeça, despertando, e segurou sua mão com força, a apertando contra seu peito.

-- Se estou feliz? Eu quero saber se é possível ser mais feliz que isso! Quer dizer, é sério, meu coração nunca esteve tão acelerado, isso é normal?

Minha mãe riu, aliviada, e eu sorri, finalmente terminando de raciocinar.

-- Eu vou ter um irmãozinho ou uma irmãzinha?! – Gritei, quase pulando da cadeira, empolgada e em choque. Meu coração bateu acelerado, e eu senti que ele podia rasgar o peito de tanta felicidade. Abracei a mama, e o papai nos abraçou. Não havia um melhor lugar para se estar do que aquele.

💭°°//

Cheguei na escola quase que saltitando. Minha felicidade estava incurável e impossível de ser apagada. Um meteoro poderia explodir o mundo e eu provavelmente ainda estaria com esse sorriso bobo na cara.

De longe avistei Becky, e corri em sua direção, me jogando em seus braços e quase a matando de susto.

-- Que é isso menina, quase me mata! Que bicho te mordeu?

Fui incapaz de responder, apenas me agarrei a ela e pulei, e rodopiei, dançando igual uma lacraia tendo um infarto. Meu Deus! O meu sorriso era tão largo que doía sustentá-lo.

Ela logo dispensou a curiosidade e passou a entrar na brincadeira, se balançando, alegre e graciosa, como sempre fora.

Mas se tem uma coisa que eu aprendi na vida é que a alegria de pobre dura pouco.

Logo chegaram Emile e Ewin, as cadelinhas do metido;

Vulgo Damian Desmond, minha missão e alvo número um, também dono de todas as minhas maiores confusões mentais.

Mas eu estava determinada a não me abalar, mantive o sorriso radiante, e a postura implicante dele baixou quando se aproximou. Infelizmente os amigos dele eram irremediavelmente idiotas.

-- Do que a nanica tanto sorri? Será que finalmente entendeu um assunto de primeira?

-- Vocês podem falar o que quiserem, não vou cair na irritação. Meu trunfo é bem maior.

Vi Becky sorrir e me dar um 'joinha em minha visão periférica, como se falasse "mandou bem". Continuei:

-- E pra' informação de vocês, estou feliz porque vou ter um irmãozinho, passar bem.

Sai desfilando me sentindo o último biscoito do pacote e logo fui seguida por minha amiga que me parabenizava.

Realmente, nem mesmo as aulas chatas de geometria poderiam arruinar meu humor hoje.

Talvez só um pouco.

In my Mind -- Anya X DamianOnde histórias criam vida. Descubra agora