ℂ𝕒𝕡𝕚𝕥𝕦𝕝𝕠 𝟝: Os humilhados serão exaltados

1.6K 175 190
                                    

Comecei a tremer antes mesmo de girar a fechadura. Imaginei o que meus pais teriam arrumado durante meu sumiço e como reagiriam diante de meu aparecimento.

Porém, diferente do que eu imaginava meu pai apenas permaneceu no sofá, lançando um sorriso para mim, enquanto voltava às notícias de seu jornal. Me aproximei dele e senti que deveria falar algo. Talvez essa fosse uma de suas técnicas para fazer um suspeito desembuchar. Comecei:

— Então... Sentiram minha falta?

Ele olhou para mim, sorriu e deixou um beijo em minha testa.

— Óbvio que senti, Anya. É que ontem passei a noite toda preso numa reunião do trabalho, minha chefe dando sermão. E como quando acordei você já tinha ido para a escola, nem deu tempo de morrer de saudades.

— Claro que deu! — Disse minha mãe chegando na sala — É que eu também fiquei presa numa reunião de trabalho. Já avisei que ia tirar licença a maternidade daqui a alguns meses, e você acredita que minha colega armou um barraco? Como se fosse um absurdo eu estar com meu segundo filho a caminho quando ela ainda não tinha um. Voltei para casa exausta, e só acordei tarde da manhã. Mas eu senti saudade sim.

Quase cai ali mesmo de tanto alívio. A sorte estava ao meu lado. Engoli em seco e virei-me para meu pai:

-- Por que sua chefe estava lhe passando sermão?

Ele coçou a nuca, e começou, constrangido:

-- Ela desejou saúde ao neném, mas avisou que eu não ia trabalhar menos, porque minha carga-horaria já tinha caído muito.

Concordei, rindo internamente. Acredito que na realidade Sylvia estivesse lhe passando uma bronca por falta de profissionalismo e foco na missão.

Estava indo para o banheiro, tomar um banho decente, quando meu perguntou:

-- De quem é esse casaco?

Eu virei meu corpo lentamente, e tentei dizer com a maior naturalidade possível.

-- É de um amigo, nem tinha percebido que esqueci de devolver.

Ele franziu o cenho e falou:

-- Entendi. E que amigo é esse?

As palavras agarraram na minha garganta, sem que eu entendesse bem a razão. Ele só me emprestou um casaco, para que esse constrangimento?

-- É o Damian.

Meu pai arqueou uma sobrancelha:

-- E vocês são amigos agora?

-- É, acho que somos... amigos...

Mesmo não parecendo muito satisfeito, ele não conseguiu continuar o interrogatório, porque entrei no banheiro rapidamente.

Tirei o casaco e o cheiro dele estava impregnado na roupa como um veneno. Toquei meu cabelo, e o seu cheiro era tentador, bom e inacreditavelmente sedutor. Tampei meu nariz quando percebi a linha de meus pensamentos. Era uma droga não escutar os pensamentos das pessoas, eu tinha tempo de ter os meus próprios, e eles costumavam ser idiotas como esses.

Entrei no box e deixei a água gelada levar tudo de mim. Pensamentos e odores. Era bom lavar meu cabelo de novo, não aguentaria muito tempo com esse perfume.

Esfreguei meu cabelo e corpo até que eu fosse completamente eu, e meus pensamentos se distanciassem dele. Era um esforço inútil. Eu fiz dele, no calor do momento, meu confidente, e lhe contei um de meus maiores segredos.

Eu havia criado um laço ali, e não o desfaria tão cedo.

Me enxuguei e joguei-me na cama ainda comtemplada na grandeza de que vim ao mundo. Deixei minha mente vagar no subjetivo e nas sensações. Aventurei-me no tato.

In my Mind -- Anya X DamianOnde histórias criam vida. Descubra agora