Capítulo XVII

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Depois do grande jantar, a vida dos Nicholls retornou ao ritmo normal. Charles voltou ao seu isolamento e o Sr. Nicholls voltou a fazer questão de deixar o clima da casa sempre pesado com a sua presença autoritária. Katherine cuidava dos dois pequenos e aguardava ansiosamente que a semana passasse. Daniel ainda não havia retornado, mas o último baile de primavera aconteceria no sábado e ela acreditava que até lá o rapaz estaria de volta. Ela mal podia esperar para vê-lo e conversar com ele novamente. Mas claro que, como sempre ocorre quando estamos muito ansiosos para um acontecimento, o tempo simplesmente não passou e aquela semana pareceu demorar a eternidade para Katherine.

No entanto, houve um acontecimento no decorrer daqueles dias que chamou a atenção de Katie e pousou em seus pensamentos. Na terça-feira, Tine mandou-lhe um recado perguntando se a amiga poderia ajudá-la a preparar algumas tortas e biscoitos para levar para uma família que vivia em uma parte mais afastada da cidade e que estava passando por uma situação bem difícil desde que o pai da família, que era agricultor, e o único provedor do sustento de todos, tinha se machucado e não conseguia trabalhar há meses; na quinta-feira, seria aniversário de duas das cinco filhas do casal, meninas gêmeas que fariam cinco anos, e Tine queria levar algumas coisas para animar o dia da família.

Katherine, de pronto, concordou e, durante a manhã de quarta-feira, usou o tempo que tinha livre, enquanto Arthur e Heloise estavam em suas muito especificas e profissionais aulas particulares, para preparar sua contribuição para a comemoração da vida das gêmeas. Enquanto Katie terminava de decorar uma torta de maçã, Tine deu uma rápida passada por lá para combinar que, na quinta-feira, ela encontraria a amiga em Cristhall naquele mesmo horário para irem juntas, já que a casa da família ficava mais próxima da direção da residência dos Nicholls do que de Charythall. Tine insistiu para que Katie falasse com a senhora Nicholls e que levassem Heloise e Arthur também; ela garantiu que os dois iam amar passar um tempo com as crianças dos Jones! Katherine não duvidava disso, mas achava que seria muito difícil conseguir permissão para sair com as crianças, com o Sr. Nicholls estando em casa.

- Vamos, Katie. Fale com a Sra. Nicholls. A casa dos Jones fica perto de um campo de flores tão lindo e você vai amar as crianças. Heloise e Arthur vão se divertir muito. Vamos!

Katherine riu:

-Eu vou falar. Não posso garantir nada, mas vou tentar. De qualquer forma, amanhã passe aqui para levar os doces, certo?

-Nós vamos levar os doces juntas, tenho certeza!

 A certeza de Tine acabou se concretizando. De fato, Katherine conseguiu permissão para ir até a casa dos Jones, mas não para levar Heloise e Arthur. O sr. Nicholls achou que seria bom a governanta ir e levar alguma ajuda para os Jones em nome da família, mas ordenou que as crianças ficassem e tivessem maias das suas aulas com os professores particulares, enquanto Katherine estivesse fora.

 Quinta-feira chegou, às nove e meia da manhã, depois de ter checado se tudo na casa estava correndo bem, Katie foi até a cozinha e tentou equilibrar em seus dois braços duas tortas e dois potes de biscoitos para levar até a saída da casa, onde encontraria Tine. O caminho foi desafiador e ela quase derrubou tudo umas duas vezes, mas foi quando chegou na parte externa da casa e avistou alguém que de longe parecia ser Tine que o desastre quase aconteceu. Ela se distraiu por um momento e continuou caminhando, não percebendo que, sem querer, estava indo diretamente em direção a uma das árvores da residência; o estrago tinha tudo para ser total já que ela tanto derrubaria as coisas quanto acabaria se machucando com o choque, mas antes que isso acontecesse, Katie sentiu alguém segurar seus ombros, fazendo-a parar:

-A senhorita vai bater!

 A moça piscou assustada e levou mais alguns segundos para entender o que estava acontecendo. Charles Nicholls estava parado diante dela, agora já não segurava os seus ombros, mas tirava uma parte dos doces de suas mãos.

-Ah, obrigada! Eu re-realmente não vi a árvore.

Katie gaguejava e sentia o rosto esquentar. Que papel de boba estava fazendo na frente de um de seus patrões e seria pior ainda se de fato tivesse batido.

No meio tempo entre a quase batida e o pequeno diálogo embaraçoso com o herdeiro dos Nicholls, Tine se aproximou e adicionou sua dose de espontaneidade à situação:

-Katie! Você e árvore escaparam por pouco!! Você está bem?

E se virando para Charles acrescentou:

-Sua chegada foi espetacular, sr. Nicholls. Eu estava observando e realmente achei que o senhor não conseguiria chegar até ela antes do desastre. Já imaginou? Todas as tortas estariam destruídas agora e a Katie estaria machucada. Estaria sim.

Katherine estava desesperada para que a amiga parasse de falar e as duas pudessem sair dali. Charles Nicholls continuava segurando as duas tortas e parecia observar tudo com atenção.

-Eu estou bem, Tine... realmente estou- Disse Katie apressada- Mais uma vez muito obrigada senhor. Não sei como agradecer.

- Não precisa agradecer.

Por um momento, o rosto de Charles não expressava aquela distância que estava sempre presente. Ele pareceu quase simpático e gentil. Katherine fez um cumprimento o mais graciosamente que conseguiu e em seguida acrescentou apressada:

-Bem, realmente precisamos ir ou ficará muito tarde. Tine você pode ajudar com essas tortas que estão com o sr. Charles Nicholls?

Tine estendeu as mãos para pegar a primeira torta, mas Charles recuou.

- Para onde as senhoritas estão indo?

- Vamos fazer uma visita aos Jones, uma família que mora logo após o campo das margaridas- Katherine não sabia o porquê da pergunta, mas acrescentou- É aniversário das gêmeas da família e os seus pais me deram permissão para ir até lá.

Charles acenou concordando.

- O campo das margaridas é um pouco longe. Vocês vão caminhando?

-Oh, sim- Tine foi quem respondeu dessa vez- é uma caminhada agradável e não vai demorar muito.

- Mas vocês estão com muitas coisas para carregar.

-Ah não se preocupe! Vamos colocar uma parte dos doces nessas cestas e vai ficar mais fácil.

-Ainda assim é muita coisa.

Katie não sabia onde o rapaz queria chegar, então disse com cautela.

- Dará tudo certo. A caminhada não é tão longa.

-Se as senhoritas não se importarem, eu posso acompanha-las e levar as cestas. Acho que facilitará a caminhada.

Por isso Katherine, definitivamente, não esperava e pela expressão no rosto de Tine, Katie podia afirmar que a amiga estava tão surpresa quanto ela.

- Oh, nós agradecemos muito, mas realmente não é necessário que o senhor tenha esse incômodo.

Charles sem alterar muito a expressão, apenas afirmou:

-Acredito que seja necessário sim.

Não havia nenhum tom de gentileza ou amabilidade em sua voz. Ele só parecia, mais uma vez, constatar um fato. Sem deixar muito espaço para discussões, o rapaz mesmo colocou as tortas que estavam em suas mãos em uma das cestas e saiu carregando o restante dos pacotes. E assim o tempo agradável que katie esperava ter com Tine, se transformou em uma estranha e desconfortável caminhada.

As crônicas de Bethton: Katherine EllisOnde histórias criam vida. Descubra agora