Capítulo XXI

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Era por volta de nove horas da noite quando Katherine chegou em Christhall. Sem olhar para o jardim, foi direto à procura de Mary, a empregada que tinha ficado responsável por cuidar das crianças durante o tempo que Katie passaria fora. A moça garantiu que tudo tinha corrido muito bem, Heloíse e Arthur já estavam dormindo há algumas horas, a senhora Nicholls tinha jantado com o filho, mas os dois já tinham se recolhido também aos seus aposentos.

Tudo parecia em perfeita ordem. Nada impedia Katherine de ir até o jardim, exceto suas pernas bambas e trêmulas.

Por que todas aquelas emoções eram tão fortes? Parte dela imaginava o que ouviria de Daniel, mas, ainda assim, parecia tão surreal e fora dos planos. Se ele realmente se declarasse o que aconteceria a seguir? Ela estaria pronta para se casar com ele? Ela estava pronta para se casar com qualquer pessoa? Katherine não tinha resposta para nenhuma dessas perguntas que corriam frenéticas em sua cabeça, mas ela tinha a certeza que queria e precisava saber o que o rapaz queria dizer-lhe. Não teria problema agir apenas uma vez guiada por suas emoções e não por sua razão que sempre tentava analisar as situações, teria?

Tentando agir antes que tivesse tempo de mudar de ideia, caminhou o mais rápido que pode até o jardim indicado por Daniel. No caminho, alisou a saia do vestido pelo menos uma dezena de vezes tentando aliviar o nervosismo.

Quando estava há alguns metros do centro do jardim, avistou o rapaz. Ele só era visível pela luz da lua que banhava exatamente o ponto do jardim onde ele esperava virado para a direção oposta a que Katherine vinha. A moça precisou achar pelo menos um fio de voz para anunciar sua presença:

-Daniel?

O rapaz virou com um sorriso que não era o seu típico sorriso de senhor primavera. Era um sorriso mais discreto e que, alguma forma, transparecia alívio.

-Oh, você veio...

- Mas não posso ficar muito, o horário não permite...

-Tudo bem! Eu não preciso de muito tempo. Eu...

O rapaz parecia decidido, mas, ao mesmo tempo, desconsertado. Se aproximou mirando profundamente os olhos de Katherine, mas o vermelho em seu rosto deixava transparecer o nervosismo. Katherine não conseguia mais sequer encontrar uma emoção que a descrevesse.

-Eu só precisava que a senhorita soubesse... Eu só queria... Eu só pensei que não poderia mais dormir uma noite sem a certeza de que a senhorita conhece o meu coração e tem ciência dos meus sentimentos. Eu não sei de muita coisa Katherine, mas eu precisava dizer-lhe que desde do primeiro momento que nós nos encontramos, lá no início da primavera, o meu coração é seu e tem sido seu durante toda essa estação e eu sei... continuará sendo seu nas próximas que vierem.

Ele parou baixou os olhos por um momento e voltou a fita-la parecendo ter ganhado mais confiança.

- Você chegou e com a sua doçura e graça trouxe tanta beleza à Missford...você é amável, bondosa e divertida e quanto mais eu a conheço, mais perfeita você parece para mim... e eu não vejo outra pessoa com quem eu gostaria de passar o resto da minha vida. Eu precisava que a senhorita soubesse disso, eu precisava...

Cada palavra do rapaz vinha com uma intensidade que parecia golpear e anestesiar o coração da jovem. Katherine nunca tinha vivido nada daquilo. Tinha sonhado, por muito tempo, em viver um amor como os dos livros que lia, mas, na realidade, nunca tinha tido tanta esperança de se apaixonar verdadeiramente por alguém, no entanto ali estava ela e cada palavra que saia da boca de Daniel, parecia infinitamente melhor do que qualquer coisa que ela já tinha lido e, de repente, era como se nada no mundo pudesse dar errado. Ela amava Daniel e ele a amava. A vida podia ser simples assim?

O rapaz se aproximou um pouco mais:

- Katherine, às vezes eu olho para você e me parece que seus sentimentos são os mesmos. Eles são? Você sente o mesmo que eu?

E, enquanto falava isso, o rapaz caminhou em sua direção, até, finalmente, segurar delicadamente a suas mãos e fixar seus olhos suplicantes nos olhos dela.

Katherine sentiu o impulso de desamassar mais uma vez a saia do vestido como sempre fazia quando estava nervosa, mas, agora, suas mãos estavam ocupadas. O olhar de Daniel não vacilava um instante e mesmo que algo soasse lá no fundo da mente de Katie mandando uma alerta de que tudo estava indo realmente muito rápido, ela não pôde resistir ao que o seu coração dizia; ela precisava confirmar o que sentia para Daniel e todo o resto poderia ser pensado depois.

Balançou a cabeça sentindo um leve tremor passar por todo o seu corpo e apertou a mão do rapaz.

-Os meus sentimentos são os mesmos, Daniel. Tem sido os mesmos há algum tempo já.

Katie não conseguiu falar mais nada, mas, ao ver Daniel abrir o seu sorriso de senhor Primavera, sentiu que eles haviam se entendido; os dois pareciam não encontrar qualquer outra palavra, mas seus corações pareciam continuar conversando sem nenhuma dificuldade.

Continuaram se olhando profundamente por mais alguns segundos. Katherine piscou, tentando voltar a si e, delicadamente, afastou suas mãos. Ela precisava voltar para casa, precisava de um tempo sozinha para pensar...

- Eu preciso ir agora.

-Eu não quero que você vá.

Katherine deu um sorriso fraco, começando a sentir a realidade a encontrar e refrear só um pouco todo aquele clima de sonho.

- O que acontece agora, Daniel? O que acontece depois de eu saber dos seus sentimentos e você saber dos meus? Nós temos muito para conversar, mas agora não é o momento. Está tarde, eu preciso ir para casa e você também.

Daniel suspirou

-É verdade. Voltaremos a conversar o mais breve possível, minha Katherine. Eu prometo.

Depois de fitar os olhos do rapaz por mais um momento, ela começou a se afastar e ir em direção a entrada de Christhall, olhou para trás uma vez e viu que o rapaz ainda estava lá observando-a, lançou mais um sorriso em sua direção e continuou caminhando em direção aos seus aposentos. Que noite havia sido aquela?

O coração de Katherine dançava e ainda parecia meio envolto por uma névoa de alegria, quando ela passou pela sala e deu de cara com Charles Nicholls saindo da biblioteca.

Fez uma rápida reverência em cumprimento, mas achou que deveria perguntar mais alguma coisa.

-Senhor Nicholls, precisa de alguma coisa?

O rapaz estava com as sobrancelhas levemente franzidas como se tentasse entender algo.

-Oh, não senhorita Ellis, estou bem. Fiquei sem sono e vim até a biblioteca à procura de alguns livros, mas já estou voltando para o meu quarto. A senhorita pode descansar.

- Tudo bem então. Bom descanso, senhor Nicholls.

Katherine fez uma nova reverência e já ia seguir em direção ao seu quarto quando o rapaz pigarreou na tentativa de falar mais alguma coisa.

- A...A senhorita gostou do baile?

Katherine voltou a olhar para o rapaz tentando disfarçar a surpresa. Sempre se surpreendia quando o herdeiro dos Nicholls falava qualquer coisa além do mínimo.

-Ah, foi maravilhoso. Perfeitamente agradável!

- Que bom que gostou, senhorita. Tenha uma boa noite.

E saiu tão de repente quanto tinha aparecido.

As crônicas de Bethton: Katherine EllisOnde histórias criam vida. Descubra agora