Será que uma pequena mudança, uma única decisão diferente, de um único personagem da narrativa da vida poderia ter feito os rumos de uma história mudar completamente?
Carmen, assim como tantos brasileiros, fugiu da vida escassa do lado Sul da Améri...
Periférica, família disfuncional, irmã mais velha de 4 irmãos. Lutando com duplas, até triplas jornadas de trabalho e estudo desde os 12 anos. Um sonho ardendo no coração desde a adolescência: ir morar com a tia nos Estados Unidos.
Carmen tinha 12 anos quando assistiu a briga que fez tia Raimunda sair da pequena casa no interior de Minas Gerais. O pai, bêbado como de costume, tinha chegado em casa e pegado a tia cozinhando algo... Não seria um motivo de discussão numa casa comum... mas tia Raimunda já era cozinheira profissional e trabalhava na casa de gente importante. Tinha trazido alguns ingredientes e fazia algum prato chique na cozinha pobre da família. O pai de Carmen, irmão de tia Raimunda, já alto da bebida, encrespou. Ele dizia que tia Raimunda "se deitava com os patrões" em troca comida, e de que eles eram pobres, mas que não precisavam de esmolas... Carmen já entendia as asneiras que o pai dizia e tentava tirar os irmãos da cozinha. O pai os impedia a passagem, gritando que eles tinham que saber de onde vinha a comida que cheirava tão bem.
A mãe de Carmen, passivamente assistia a cena, sem coragem de interferir, que era como reagia a tudo que acontecia a sua volta. Tia Raimunda tentava proteger as crianças das panelas quentes, até que, exaurida da discussão, tomou a grande panela, foi até o terreiro da casa que ficava no alto do morro, e despejou todo o guisado - que até hoje Carmen não sabia o que era - barranco abaixo, fazendo a vizinhança toda sair, atraída pelo cheiro e pelas vozes da discussão. Depois daquele dia, Carmen só viu tia Raimunda em poucas visitas, pois pouco tempo depois, a cozinheira de presidentes foi convidada para trabalhar nos EUA. Um outro mundo.
E em cada carta, Carmen prometia: "tia, eu ainda vou morar aí, com a senhora", e agora, aos 24 anos, depois de ter o visto negado 3 vezes, parecia que finalmente o sonho se tornaria real: documentos prontos, reserva financeira preparada e passagem comprada. Carmen Vila Real finalmente deixaria um passado de histórias tristes pela promessa de um futuro de conquistas e de, quem sabe, um final feliz.
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Ele.
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