Capítulo 15

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Don't you know now

Is the perfect time

We can make it right

Hit the city lights

Then tonight ease the lovin'

Let me take you to the max


O processo do frango frito não estava tão simples quanto planejado.

- Nossa... Vou dar uma gorjeta maior toda vez que eu for ao KFC agora... que negócio difícil de fazer! - dizia Michael, passando o frango na farinha.

Carmen ajudava, sentada em uma banqueta alta, colocando o frango no óleo quente.

- Eu acho é muita graça você comer frango! Vegetariano de araque! - ria ela, fazendo Michael rir também.

- Mas amanhã, nada de proteína! Já combinamos! - decretou o rapaz.

Quando tudo ficou pronto, Michael fez questão de colocar a mesa completa e pegou a Polaroid para tirar uma foto. Primeiro registrou os pratos postos. Em seguida, pediu para Carmen se posicionar, pois programaria o temporizador para a máquina bater uma foto automaticamente. A moça hesitou:

- Quer que eu saia na sua foto?

- Claro! Acho que é a primeira vez que eu ajudo a fazer um almoço de verdade! Vem logo!

Ambos se colocaram e 10 segundos depois a máquina cuspiu o filme fotográfico, que registrou uma imagem satisfatória de um Michael sorridente e de uma Carmen insegura, apesar do sorriso.

- Podia ter sorrido mais. - pontuou Michael.

- Se minha tia vir essa foto, vai querer me despachar de volta para o Brasil. - respondeu a moça, entregando um prato para o patrão.

- Eu devia ser considerado um bom partido, ao invés disso, parece que sou a Fera da Bela e a Fera.

O comentário pegou Carmen de surpresa. O que ela responderia? O que aquilo queria dizer? Depois de servir-se e colocar o suco de laranja nos copos, achou que era preciso dizer alguma coisa.

- Engraçado você falar da Bela e a Fera... Eu me sinto meio a Gata Borralheira quando estou com você assim...

- A Gata Borralheira era a mais nobre entre as moças... foi escolhida como princesa.

- Isso só porque teve uma fada madrinha para fazer uma abóbora virar carruagem e seus trapos virarem um vestido para o baile, senão ainda estaria lavando pratos.

Depois do breve debate, ambos começaram o almoço e se cumprimentaram: a comida estava realmente muito boa.

Após ajustarem a louça, que Michael também precisou ajudar, decidiram sentar-se na beira da piscina. O dia estava quente, mas já havia sombra o suficiente para Michael caminhar pela área externa.

- Deve ser horrível não poder ficar no sol. - disse Carmen, que de repente se deu conta de que nunca tinham falado a respeito.

Michael ajustou o boné, pigarreou, dobrou as mangas da camisa, subindo-as até os cotovelos. Ali Carmen pode ver com clareza mais uma vez: as manchas. Grandes manchas brancas que cobriam os braços de Michael.

- O que é isso? - perguntou ela.

- Uma desordem de pele. É genético, não é contagioso. Destrói a pigmentação da minha pele.

- Essa é a razão das maletas de maquiagem... - concluiu Carmen.

- Sim... e de todos aqueles cremes. Além disso, tenho lúpus também, mas são todas doenças dos meus genes, você não pega por ter contato comigo...  - explicou Michael.

Carmen não sabia exatamente o que eram essas doenças, mas ficou sem graça em perguntar. Ela sabia, no entanto que, a preocupação de Michael em explicar que não eram doenças contagiosas, se dava ao fato da grande epidemia de AIDS e da quantidade de pessoas que morriam disso.

- A esta altura eu não tenho problema em ter contato com você. - brincou Carmen, fazendo Michael rir uma risada tímida que ela achava extremamente atraente, e continuou - E os remédios são o tratamento para você ficar curado?

Michael suspirou... ele não costumava a conversar com ninguém sobre suas questões de saúde e achava curioso o fato de sentir ser tão fácil falar com Carmen a respeito.

- Não tem cura. Nenhuma das duas doenças. Tem tratamento, controle... Mas o vitiligo não... ele só vai aumentar...

Alguns segundos de silêncio... Até que Carmen se deu conta da informação que recebera.

- Você vai ficar branco? Tipo, todo branco? Porque você já está mais claro... eu achava que era porque tinha parado de tomar sol...

Michael começou a rir. A simplicidade de Carmen era uma dádiva... Era como se ele conversasse com uma criança. Ela não fazia muitas voltas para perguntar e não havia maldade em seu tom.

- Acho que fui ficando mais pálido porque parei de tomar sol também, mas sim, eu vou ter que passar por isso. Já estou passando. Mas já estou habituado: os jornais sempre tem alguma coisa para falar de mim, ou que sou homossexual, ou que quero ser uma mulher, que tomo hormônios para afinar a voz, que durmo numa câmera hiperbática, que comprei esqueletos...

- Credo! Tem umas aí que eu nunca nem ouvi! - disse a moça, horrorizada. - Como você vive desse jeito?

- Faz parte do trabalho... mas... cansa. Você começa a se dar conta de que o modo como você fala, ou como se veste, ou até os lugares que você visita podem gerar interpretações e você fica refém do que os outros pensam.

- No Brasil, os homens tem muita inveja de você, por isso falam que você é gay.

Michael deu um sorriso triste, mas curioso.

- Por que inveja?

- Ah, primeiro porque você saiu com aquela moça linda do filme da Lagoa, depois porque as meninas queriam que os homens fossem mais como você é, e não há nenhum homem como você, pelo menos não lá, mas acho que nem aqui.

Michael olhava para Carmen, que observava a água da piscina. Ela estava com o cabelo solto, e seus longos cachos castanhos caíam sobre seus ombros e peito. Com um vestido de malha verde simples, na altura dos joelhos, a moça tinha os pés na água e balançava-os displicentemente, ondulando a enorme piscina.

- Não sei o que é ser um "homem como eu"... - respondeu Michael.

- Ah... isso é fácil de responder, - começou Carmen - os homens olham para as mulheres vendo como podem usá-las: como empregadas, como objetos... a gente está sempre desconfiada de quem se aproxima da gente, mas você faz a gente querer estar perto porque trata bem, fala direito, tem respeito... Bom, eu pelo menos me sinto assim.

- Isso devia ser básico...

- Mas não é. - concluiu Carmen.

Michael queria fazer a pergunta, mas ele estaria ultrapassando a linha imaginária da intimidade? Ela citou sua ex-namorada, isso concederia o direito a esta pergunta?

Decidiu arriscar.

- Você namorava antes de vir pra cá?

Carmen sorriu. Um sorriso triste.

- Tive um namorado na época da escola. A gente até pensou em se casar depois que terminasse o colégio, mas... não tínhamos os mesmos sonhos. Eu acho que só estava com ele para não estar sozinha e ia me casar só para sair da casa dos meus pais. Aí percebi que podia trabalhar e sair da casa dos meus pais sem me casar e sem precisar de ninguém. Foi o que fiz.

- Aí veio para cá? - perguntou Michael.

- Não... ainda levou 7 anos até eu conseguir o visto! Seu país quase não me quis!

- E você fez o que nestes 7 anos?

Carmen começou a se levantar e Michael percebeu que ele  ultrapassara a linha imaginária do limite de intimidade.

- Fiz tudo que podia para estar aqui hoje. Eu vou tomar um banho. Pode me ajudar a chegar ao meu quarto?

Michael Jackson - ImprovávelOnde histórias criam vida. Descubra agora